Em outro artigo, neste site, mostramos como os multímetros são classificados em categorias e como essas categorias indicam tanto o tipo de trabalho a que se destinam estes instrumentos como o grau de segurança que oferecem. No entanto, na ocasião não falamos de que modo fazer a melhor escolha de um multímetro para a atividade profissional que o leitor exerce. Assim, neste artigo, abordaremos este importante tema, com especial enfoque para o item segurança.



No livro Os Segredos do Uso do Multímetro abordamos novamente este tema e o como testar componentes com este instrumento é detalhado nos livros da série Como Testar Componentes do mesmo autor.




Apesar de existirem instrumentos sofisticados, sistemas de aquisição de dados que levam as medidas sensoriadas em diversos pontos de uma planta a um controle central informatizados, o multímetro ainda é o principal instrumento de todo o profissional de instalação e manutenção.

Conforme vimos em outro artigo deste site, os multímetros digitais são classificados em 4 categorias que possuem características específicas que os tornam ideais para determinados tipos de trabalho.

Estas categorias são determinadas pelo padrão IEC 1010, adotado internacionalmente visando justamente levar em conta os perigos em potencial que podem estar presente num ambiente onde uma medida elétrica deva ser feita.

Assim, antes de escolher um multímetro para a atividade que o leitor está envolvido profissionalmente será muito importante dar uma olhada no que estes padrões dizem para ver se aquele tipo de multímetro que o profissional está analisando num catálogo está de acordo com as exigências deste padrão.

Sua segurança é muito importante neste caso, como a de qualquer pessoa que vá usar um instrumento num trabalho de medida.


As Aplicações

Para saber que tipo de multímetro devemos escolher para uma atividade será conveniente analisar as indicações de cada categoria e ver se elas se enquadram naquilo que temos em mente.


a) Categoria I

Esta categoria de instrumento se refere aos tipos que são usados na análise de equipamentos eletrônicos em geral. São os equipamentos que apresentam as seguintes características básicas:

* São equipamentos protegidos, ligados a circuitos nos quais as medidas são realizadas dentro de transientes bastante limitados, e normalmente de baixo nível.

* Se for um equipamento de alta tensão, ela é derivada de um transformador com um enrolamento de alta resistência como, por exemplo, no setor de alta tensão de um monitor de vídeo, de uma copiadora ou de um televisor.


b) Categoria II

Esta categoria de multímetro destina-se a trabalhos de medida na rede de energia monofásica como, por exemplo, em tomadas de energia de instalações elétricas comerciais, domiciliares e de escritórios. Basicamente os multímetros desta categoria são usados nas medidas de tensões em:

* Equipamentos de uso doméstico, ferramentas portáteis e outros equipamentos semelhantes

* Tomadas de energia e circuitos alimentados pela rede doméstica monofásica.

* Tomadas ou pontos de conexão que estejam a mais de 10 metros de uma fonte CAT III ou a mais de 20 metros de uma fonte CAT IV


c) Categoria III

Estes multímetros se destinam a análise de circuitos alimentados por uma rede trifásica e medidas diretamente neste tipo de rede. Também são usados na análise de sistemas de iluminação comercial. Basicamente são empregados nos trabalhos com os seguintes tipos de instalações:

* Equipamentos em instalações fixas como por exemplo motores multifásicos.

* Barramentos e sistemas de alimentação em instalações industriais.

* Circuitos de painéis de distribuição

* Sistemas de iluminação em grandes construções

* Tomadas de alimentação equipamentos que estejam perto da entrada de distribuição.


d) Categoria IV

Esta categoria de multímetro é utilizada na análise de redes trifásicas e redes aéreas externas. Basicamente empregamos os multímetros desta categoria nos seguintes casos:

* Instalações de origem, como as que alimentam o setor de baixa tensão de uma fábrica.

* Medidores de energia elétrica e protetores primários de sobrecorrente.

* Instalações fora da entrada de alimentação, do ponto de captação ao medidor.

* Instalações aéreas e subterrâneas de alimentação de energia primária.


Na figura 1 ilustramos de forma simplificada onde os multímetros de cada categoria são utilizados.



Figura 1 - Uso dos multímetros das diversas categorias
Figura 1 - Uso dos multímetros das diversas categorias



A Escolha na Prática

Não basta dizer que determinada categoria de multímetro tem características apropriadas para determinado tipo de medida. O leitor que deseja adquirir um multímetro para seu trabalho precisa saber mais.

Em função do que vimos, podemos dar algumas regras básicas para a escolha, baseadas numa interessante documentação da Fluke:

* A regra geral para escolher um multímetro para seu trabalho é de que, quanto mais próximo você estiver da fonte de energia elétrica que alimenta o local em que você está, mais alta é a categoria do multímetro que você deve usar, pois maior é o risco de que transientes causem problemas.

* Leve em conta também que, quanto maior for a intensidade de corrente de um curto-circuito no local que você trabalha, maior deve ser a categoria do multímetro usado.

* Uma outra forma de dizer a mesma coisa dos itens anteriores é a seguinte: quanto maior for a impedância da fonte de energia que alimenta seu local de trabalho mais baixa pode ser a categoria do multímetro que você usa. Uma impedância mais alta, amortece transientes.

* Os TVSS (Transiente Voltage Surge Supressor ou Supressores de Tensões Transientes e Surtos) também podem servir de referência para a escolha de um multímetro. Se numa instalação você usa TVSS de maior capacidade, o multímetro usado na sua análise também deve ser de categoria superior.


A figura 2 mostra tudo isto de forma simplificada.



Figura 2 - Classificação quanto à corrente de curto-circuito
Figura 2 - Classificação quanto à corrente de curto-circuito



Circuitos de Categorias Múltiplas

Na prática, entretanto, o profissional da eletrônica e eletricidade não vai trabalhar em medidas num circuito em que se enquadre numa única categoria. O mesmo local de trabalho pode ter pontos que exijam multímetros de diferentes categorias. O que fazer?

A recomendação é que o profissional analise o seu ambiente de trabalho, verificando os diversos setores em que multímetros de categorias diferentes são usados. Por exemplo, no seu ambiente, pode existir um setor em que um multímetro CAT II satisfaz mas existe outro ambiente, onde trabalhos eventuais, exigem um multímetro CAT IV.

A escolha do tipo a adquirir deve recair pelo de maior categoria que vai ser exigido no seu trabalho específico, no caso o CAT IV. Um multímetro CAT IV serve para realizar trabalhos onde um CAT II é exigido, mas não pode ser usado um CAT II onde um CAT IV é recomendado.

Na figura 3 mostramos um exemplo de local em que diversas categorias de multímetros seriam usadas em setores diferentes, mas com um único da categoria mais alta podemos trabalhar em todos os setores.



Figura 3 - Abrangência das categorias
Figura 3 - Abrangência das categorias



As Especificações de Tensão

Ao escolher um multímetro de uma determinada categoria é preciso ainda estar atento às especificações de tensão. Um multímetro de qualquer categoria pode ter uma especificação de tensão de 600 V ou 1 000 para a tensão de trabalho (DC ou AC RMS em relação à terra).

No entanto, nem sempre um multímetro de 1 000 V é melhor do que um de 600 V.

Assim, dentro de uma mesma categoria, um multímetro com uma tensão de trabalho (working voltage) maior está associado a uma capacidade de responder à transientes mais altos. Por exemplo, um multímetro CAT III - 600 V é testado com transientes de 6 000 V enquanto que um multímetro CAT III - 1000 V é testado com transientes de 8 000 V.

Pela tabela abaixo podemos avaliar melhor o que ocorre:


Categoria

Tensão de Trabalho (dc ou ac rms para a terra)

Pico do pulso de transiente (20 repetições)

Fonte de Teste (ohms = V/A)

CAT I

600 V

2 500 V

30 ohms

CAT I

1000 V

4 000 V

30 ohms

CAT II

600 V

4 000 V

12 ohms

CAT II

1 000 V

6 000 V

12 ohms

CAT III

600 V

6 000 V

2 ohms

CAT III

1 000 V

8 000 V

2 ohms

CAT IV

600 V

8 000 V

2 ohms


Veja que existe uma diferença entre os transientes de 6 000 V para o CAT III de 6000 V e o 6 000 V de transiente para o CAT II de 1 000 V. Essa diferença está na impedância da fonte usada no teste. Uma fonte de 2 ? drena 6 vezes mais corrente que uma fonte de 12 ?.

Isso significa que o CAT III de 600 V tem uma proteção contra transientes superior ao CAT II de 1 000 V, mesmo sendo este segundo especificado para uma tensão maior.


Creepage e Clearance

Existem ainda dois termos técnicos usados nas especificações dos multímetros e que devem ser analisados. Mantemos estes termos na forma original em inglês já que é assim que eles aparecem na maioria dos manuais de especificações.

Entende-se por "creepage" a distância média entre os componentes numa superfície enquanto que "clearance" indica a separação entre dois pontos no ar.

Quanto maior for a categoria de um multímetro maior é a separação entre os componentes exigida para se evitar arcos e problemas semelhantes. Assim, as especificações de "creepage e clearance" devem ser consideradas.


Garantindo a Qualidade

Os multímetros de boa procedência devem passar por testes que garantam que eles estejam dentro das especificações do padrão IEC 1010.

Existem diversas organizações independentes de testes que certificam os multímetros nos quais então são colocados selos de identificação como os mostrados na figura 4.


Figura 4 - Selos de identificação
Figura 4 - Selos de identificação


Um selo importante é o CE que indica que o produto está em conformidade com os padrões europeus (Conformité Européene) que, entretanto, são um pouco diferentes de outros padrões internacionais, inclusive o IEC 1010. Essa marca, portanto, não indica que o multímetro passou por um teste em um laboratório de certificação já que ela pode ser agregada pela própria iniciativa do fabricante.