Os circuitos integrados de temporização como o 555 não atendem às aplicações mais críticas que exigem longos intervalos de tempo ou temporização precisa. Para esses casos, em que tempos de mais de uma hora são necessários, circuitos especiais devem ser projetados, quer seja com base na freqüência de referência da rede de energia como dos sinais gerados por osciladores controlados a cristal. Nesse artigo descrevemos alguns circuitos de temporização precisa que se baseiam no divisor de freqüência CMOS 4020.
Para gerar temporizações longas, circuitos integrados baseados em constante de tempo RC, como o 555 não oferecem a precisão exigida por aplicações mais críticas como as encontradas na industria.
Os circuitos desse tipo dependem de fugas dos capacitores, precisão dos componentes usados e em temporizações acima de 1 hora não oferecem segurança alguma de funcionamento.
Para temporizações longas e com precisão a melhor tecnologia é a que faz uso de bases de tempo precisa como a rede de energia e divisores de freqüência com circuitos digitais, conforme mostra a figura 1.
Por exemplo, para obter uma temporização de 1 hora (3 600 segundos) simplesmente utilizamos um oscilador preciso de 1 Hz e um divisor de freqüência por 3 600. No final do circuito obtemos um pulso a cada 3 600 de entrada, ou seja, um pulso por hora, que pode ser utilizado para disparar a aplicação desejada.
Obtendo os Circuitos
Com componentes comuns não temos grandes dificuldades em obter osciladores de 1 Hz controlados a cristal e nem de obter essa freqüência a partir dos 60 Hz da rede de energia.
Começamos por um circuito que permite obter 1 Hz a partir dos 60 Hz da rede de energia.
Na figura 2 temos então uma etapa que transforma o sinal senoidal de 60 zHz obtido no secundário de um pequeno transformador, num sinal retangular compatível com a tecnologia CMOS.
Esse sinal é aplicado num divisor por 6 e depois num divisor por 10, obtendo-se dessa forma, um sinal de 60 Hz.
O ciclo ativo do sinal obtido não é de 50%, mas isso não é tão importante na aplicação, pois ele será usado apenas para excitar os blocos seguintes de contagem que farão as temporizações mais longas.
Podemos ir além, para o caso de não precisarmos de uma definição de 1 segundo na temporização e fazer nova divisão por 10, conforme mostra a figura 3.
Nesse caso, temos um pulso a cada 10 segundos, o que nos leva à possibilidade de projetar um temporizador com passos de 10 segundos.
Veja que a contagem feita com o circuito integrado 4017 pode ser programada para qualquer valor entre 2 e 10, o que significa que podemos criar diferentes passos de temporização num circuito, conforme mostra a figura 4.
Por exemplo, se quisermos passos de 35 segundos, bastará fazer a divisão por 5 e por 7.
Num CI ligamos a quinta saída ao reset e noutro a sétima saída ao reset. Com isso, temos a produção de 1 pulso de saída a cada 35 de entrada.
É claro que esses tempos são pequenos, e se quisermos tempos muitos longos os circuitos integrados desses blocos de entrada não se aplicam.
Para temporizações longas temos a possibilidade de contar com o circuito integrado 4020.
Os circuitos integrados 4020
Os circuitos integrados CMOS 4020, 4040 e 4060 são formados por contadores binários com diversos estágios, destinados justamente a fazer a divisão de freqüência de sinais lógicos que sejam aplicados a sua entrada ou ainda a contagem de pulsos.
Analisemos cada um separadamente, antes de darmos as aplicações em temporização.
a)4020
O circuito integrado 4020 é formado por um contador de binário de 14 estágios com a pinagem mostrada na figura 5.
Com 14 etapas, cada uma fazendo a divisão do sinal por 2, chegamos a 214 = 16 384, o que quer dizer que, em princípio podemos usar esse CI para fazer a divisão de freqüência de um sinal por qualquer sinal que seja potência de 2 até 16 384, conforme a tabela I:
Saída Divisão
Q1 2
Q4 16
Q5 32
Q6 64
Q7 128
Q8 256
Q9 512
Q10 1024
Q11 2048
Q12 4096
Q13 8192
Q14 16384
Veja que não existem saídas para as divisões por 4 e 8 (Q2 e Q3).
Como qualquer componente da família CMOS o 4020 pode ser alimentado com tensões de 3 a 15 V e a freqüência máxima de operação depende da tensão de alimentação, conforme s seguinte tabela, em que também damos as correntes máximas que podem ser obtidas nas saídas:
Freqüência máxima de operação |
5 V 10 V 15 V |
4 10 12 |
MHz MHz MHz |
Corrente drenada/fornecida |
5 V 10 V 15 V |
0,88 2,25 8,8 |
mA mA mA |
Na operação normal o Reset é aterrado. Para zerar o circuito ele deve ser levado ao nível alto por um instante.
O circuito avança uma unidade na contagem na transição negativa do pulso de entrada.
Nas saídas, partindo de todas com o nível 0, os níveis vão passando a 1 conforme a contagem binária dos pulsos.
Usando o 4020
Evidentemente, a forma mais simples de se usar o 4020 numa temporização longa é ligar diretamente um circuito de excitação de relé na saída correspondente.
Assim, na figura 6, temos um temporizador que aciona um relé por um certo intervalo de tempo a cada 4096 segundos, ligando-o a base do transistor a Q12.
No entanto, 4096 não é um valor comum nas exigências dos projetos que podem precisar de tempos "inteiros" como 1 minuto, 10 minutos, meia hora, uma hora ou duas horas (e mesmo mais).
Como obter esses valores em segundos (60, 600, 1800, 3600 ou 7200) a partir das saídas do 4020?
A solução para esse problema está na utilização de uma porta adicional CMOS que pode combinar os valores das saídas binárias do 4020 de modo a obter valores diversos de tempos de acordo com a entrada.
O circuito integrado recomendado mais comum para essa aplicação é o 4012.
Conforme mostra a figura 7, este CI consiste em duas portas NAND de 4 entradas.
Combinando essas entradas com uma porta ou NAND como o 4001, podemos facilmente trabalhar com 8 saídas do 4020 de modo a obter contagens bem próximas de valores inteiros como desejamos.
Na figura 8 damos uma idéia de como obter uma função lógica de 8 entradas que poderá ser usada nas temporizações.
Para entender como esse circuito funciona, vamos partir da tabela verdade de uma das portas do 4012.
Tabela II:
A |
B |
C |
D |
S |
0 |
0 |
0 |
0 |
0 |
0 |
0 |
0 |
1 |
0 |
0 |
0 |
1 |
0 |
0 |
0 |
0 |
1 |
1 |
0 |
0 |
1 |
0 |
0 |
0 |
0 |
1 |
0 |
1 |
0 |
0 |
1 |
1 |
0 |
0 |
0 |
1 |
1 |
1 |
0 |
1 |
0 |
0 |
0 |
0 |
1 |
0 |
0 |
1 |
0 |
1 |
0 |
1 |
0 |
0 |
1 |
0 |
1 |
1 |
0 |
1 |
1 |
0 |
0 |
0 |
1 |
1 |
0 |
1 |
0 |
1 |
1 |
1 |
1 |
1 |
Conforme podemos ver pela tabela, obtemos o nível alto na saída somente quando todas as entradas estiverem no nível alto.
Levando isso ao 4020 e inicialmente trabalhando com apenas 4 saídas, vamos supor que desejamos uma temporização 336 segundos de forma precisa.
336 segundos pode ser decomposto em fatores que sejam potência de 2, a partir da tabela I da seguinte forma:
336 = 256 + 64 + 16 + 2
Ora, pela tabela:
256 = Q8
64 = Q6
16 = Q4
2 = Q1
Basta então ligar as entradas de uma das portas do 4012 às saídas Q1, Q4, Q6 e Q8 para se obter a temporização a partir de uma entrada de 1 Hz.
Evidentemente, para se garantir que a partida da temporização seja feita a partir de 000....000 é preciso agregar a rede mostrada na figura 9.
Esse circuito resseta a contagem quando a alimentação é ligada.
Observe, entretanto, que "demos sorte" de nosso exemplo, não precisarmos contar com as saídas Q2 e Q3 de divisão por 4 e 8 e que também só precisamos de 4 saídas combinadas para obter a temporização necessária.
No primeiro caso, se precisarmos contar com as saídas de peso 4 e 8 segundos, dependendo da aplicação, uma diferença desse valor na temporização pode ser tolerada e o valor final pode ser aproximado sem seu uso.
No segundo caso, podemos usar as duas portas existentes no 4012 e combiná-las na saída usando uma porta NAND.
Vamos dar um exemplo, em que as duas portas são usadas:
Precisamos de uma temporização de 1500 segundos (25 minutos) a ser obtida a partir de um sinal de 1 Hz aplicada na entrada do circuito.
Quais devem ser as saídas do 4020 usadas nesse caso e como devemos usar o 4012 na sua combinação?
Os 1500 segundos podem ser decompostos em potências de 2, conforme a seguinte tabela que já leva em conta as saídas do 4012:
Potência de 2
Saída
1024
Q10
256
Q8
128
Q7
64
Q6
16
Q4
2
Q1
Vamos usar 4 entradas de uma das portas e mais uma da outra porta. No entanto, as entradas não usadas da segunda porta não devem ficar livres. Para manter a função desejada, ligamos ao positivo da alimentação (nível alto) as portas não usadas, conforme mostra a figura 10.
O resultado final é que, levando em consideração a função NAND a saída final do circuito irá ao nível baixo, a cada 1500 pulsos de entrada do temporizador. O circuito driver para acionamento de uma carga no nível baixo é o mostrado na figura 11.
Evidentemente, se os pulsos de entrada tiverem uma freqüência mais baixa, 0,1 Hz ou um pulso a cada 10 segundos a temporização ficará multiplicada por 10, ou seja, teremos um pulso a cada 15 000 segundos, ou 250 minutos (6 horas e 10 minutos)
Os circuitos integrados 4011 e 4012 podem ser alimentados com tensões de 3 a 12 V e em sua saída obtemos as mesmas correntes do 4020 o que possibilita o acionamento direto de diversas etapas de potência como as mostradas na figura 12.
Observe entretanto que o ciclo ativo das configurações obtidas varia bastante conforme o circuito. Assim, podemos dizer que, dependendo das saídas usadas, os pulsos de disparo da carga podem variar entre alguns segundos até o máximo.
Por exemplo, se a saída menor usada for a Q6, podemos garantir que a carga será ativada por um tempo equivalente a 64 ciclos do sinal de entrada.
Isso deve ser considerado quando vamos controlar algum dispositivo externo diretamente pela saída CMOS obtida.
Se desejarmos ter independência no acionamento devemos optar por monoestáveis ou circuitos com trava que sejam acionados com o pulso obtido no final da temporização.
Um exemplo de circuito com trava é justamente o que faz uso de um SCR no controle da carga,
Conclusão
O leitor já deve ter percebido que basta combinar as saídas do 4020 com funções lógicas comuns e aplicar na sua entrada pulsos de frequências exata para se obter temporizações precisas.
Evidentemente, o único obstáculo para termos tempos absolutamente exatos em alguns aplicações é a ausência das divisões por 4 e 8 na saída do 4020, mas certamente, dependendo da aplicação, isso pode ser contornado.
Observação:
Existem dois outros circuitos integrados CMOS da mesma série do 4020 que também podem ser usados nas aplicações que descrevemos.
O primeiro deles é o 4040 que consiste num divisor contador de 12 estágios e que 0portanto possui as duas saídas que faltam no 4020, se bem que ele só alcance a divisão até 4096.
O outro é o 4060 que além dos 14 estágios divisores já possui um oscilador interno, se bem que seja do tipo RC.
Bibliografia: CMOS Sourcebook - Newton C. Braga - Prompt Publications