Durante muito tempo a única eletrônica predominante nos automóveis era a encontrada nos aparelhos de som: rádios, toca-fitas e, eventualmente, amplificadores. No entanto, como era de se esperar, a eletrônica aos poucos passou a ocupar posição de importância também para o próprio funcionamento e segurança de um carro. Hoje em dia, até os modelos populares de automóveis contam com sistemas de injeção eletrônica de combustível. Como funciona a injeção eletrônica e para onde caminha a eletrônica que vai equipar o carro do futuro é o assunto deste artigo.
Obs.: Este artigo foi escrito no ano 2000. Seu valor é histórico, pois hoje temos nos carros atuais muito mais do que foi previsto na época.
A parte elétrica de um carro sempre foi muito simples, tendo por finalidade principal fornecer energia para o sistema de ignição, e acessórios comuns como o rádio, faróis, buzina, etc.
Durante muito tempo os fabricantes se contentaram com configurações elétricas tradicionais que envolviam apenas componentes eletromecânicos.
No entanto, a exigência de maior segurança. confiabilidade e sobretudo desempenho tornou inevitável a presença da eletrônica no carro.
Diversos foram os setores "invadidos" pela eletrônica no carro, mas os mais importantes foram os diretamente ligados ao desempenho do veículo. Na figura 1 temos uma idéia de tudo o que de eletrônico pode estar presente no circuito de um carro atualmente.
A ignição eletrônica já é uma velha conhecida dos leitores, pois nossos carros já contam com este recurso há muitos anos. No entanto, só agora os carros passam a utilizar com maior intensidade a injeção eletrônica. Isso significa que uma boa parte de nossos leitores não sabe como funciona esta parte importante que equipa a maioria dos carros modernos e que certamente vai equipar todos os carros do ano 2000.
Assim, deixando de lado um pouco os acessórios dos carros do futuro, de que trataremos em outra ocasião, vamos abordar neste artigo o que certamente mais profundamente está alterando o conceito de eletrônica no automóvel em nossos dias: a injeção eletrônica.
INJEÇÃO ELETRÔNICA
O melhor desempenho de um motor depende de diversos fatores interdependentes como por exemplo a velocidade do veículo, a temperatura do motor e do ar que ele aspira, a inclinação do terreno e seu tipo que determinam a força que deve ser feita, além de muitos outros.
Estes fatores determinam então que quantidade de ar e combustível deve ser injetada em cada cilindro em cada tempo do funcionamento.
Nos veículos tradicionais esta injeção é feita pelo sistema mecânico do carburador que, por suas características, não tem flexibilidade suficiente para adaptar as necessidades do motor a todas condições possíveis de funcionamento. O máximo que temos é uma pequena variação da proporção da mistura e da sua quantidade em função de variações de velocidade e temperatura.
O resultado final disso é que não temos um aproveitamento ideal do combustível e da própria força do motor, o que não é interessante tanto pelo custo desse combustível como pelo próprio desempenho que se reflete no prazer de dirigir.
A meta dos fabricantes, entretanto, é obter cada vez mais do motor a explosão, enquanto ele ainda equipar os carros. Dizem que o veículo do futuro, além de potente, capaz de acelerar rapidamente quando solicitado, vai fazer mais de 30 km por litro de combustível.
O melhor aproveitamento da energia do combustível já estamos vendo em veículos modernos, mesmo os populares, como o Uno Mille, o Corsa, o Scort Hobby e o Gol 1000 (1995) que conseguem facilmente passar dos 14 quilômetros por litro de combustível, usando a injeção eletrônica.
Mas, de que modo pode a injeção eletrônica contribuir para maior rendimento do motor e maior economia?
Conforme já falamos, o sistema convencional de se injetar combustível e ar num motor comum é muito pouco flexível, ficando seu desempenho longe do ideal.
Nas condições extremas como, por exemplo, máxima rotação ou operação a frio, não se chega a mistura ideal pelo tempo ideal em cada tempo da operação. O resultado disso é a redução de potência, falha e gasto anormal de combustível.
A eventual compensação leva a sofisticados sistemas mecânicos mas quem pode realmente fazer isso de uma maneira mais eficiente é a eletrônica.
Levando então em conta que o desempenho de um motor depende de diversos fatores que variam ao mesmo tempo numa faixa muito ampla de valores o que representa uma quantidade de variáveis que somente um computador pode processar com a devida velocidade e precisão, não foi surpresa que a industria automobilística apelou para a solução eletrônica no desenvolvimento da injeção eletrônica e tendo por coração um microprocessador.
Na figura 3 temos um diagrama de blocos de um sistema de injeção eletrônica típico.
Este diagrama corresponde a injeção eletrônica L-Jetronic da Bosch, um dos primeiros sistemas, e mais simples, utilizados em veículos automotores.
Os dois principais parâmetros utilizados para a determinação dos tempos em que os injetores de combustível devem permanecer ativados ou abertos são o número de rotações do motor e a quantidade de ar que está entrando no coletor. Como informações adicionais, temos ainda a temperatura do motor, a temperatura do ar e a tensão do sistema elétrico.
Este ultimo fator pode não parecer importante, mas uma bateria ligeiramente enfraquecida, por exemplo na hora da partida depois de um período longo de imobilidade do veículo, influi no rendimento do motor, pois as faíscas das velas terão menos energia o que exige uma compensação.
Estas medições são feitas por meio de transdutores de diversos tipos, sendo os mais comuns os resistivos. Temos então um circuito de leitura e processamento apropriado que interpreta essas grandezas e fornece informações para o circuito interno. Os blocos do sistema mostram como tudo é feito.
O número de rotações do motor é obtido na forma de impulsos que são conformados de modo a se obter um sinal retangular de duração constante, o que pode ser melhor tratado pelo circuito. Este sinal atua sobre o tempo de operação de um multivibrador.
Neste mesmo multivibrador entra a informação do fluxo de ar que entra no motor, o que permite então a determinação do tempo Tb que é o tempo básico de injeção.
Este tempo passa então por uma etapa de processamento adicional que inclui novas informações que são a temperatura do motor, temperatura do ar e a tensão da bateria. Em função dessas novas informações uma correção do tempo de injeção básico (tc) é feita obtendo-se então o tempo final de injeção, indicado por tf no diagrama de blocos.
Este tempo é que serve para controlar a etapa de potência que atua sobre os injetores.
A flexibilidade para o funcionamento do sistema injetor é muito grande, pois pode-se obter tempos de injeção com o motor frio e temperatura muito baixa do ar de modo a se conseguir uma marchas de aquecimento que são três vezes maiores que os obtidos para uma marcha normal com o motor quente.
Na figura 4 damos uma idéia de como estes tempos todos são processados, obtendo-se o tempo final de injeção com o sistema indicado.
Um sistema mais avançado e que é encontrado nos carros modernos com injeção eletrônica é o que se baseia em microprocessadores.
Na figura 5 temos um sistema desse tipo da Bosch que é basicamente uma central inteligente para o carro, capaz de fornecer informações para o funcionamento não só do sistema injetor como também para o sistema de ignição e até para o bombeamento do combustível.
O diagrama de blocos do sistema Motronic da Bosch serve de base para analisarmos o funcionamento de uma unidade eletrônica de controle e é mostrado na figura 5.
O sistema tem as seguintes entradas de informações que são obtidas por meio de transdutores apropriados:
a) Rotação do motor que é obtida por transdutores que fornecem pulsos de tensão.
b) Fluxo de ar que é obtido por meio de um potenciômetro que tem seu eixo controlado pela borboleta do sistema de entrada de ar.
c) Posição do avanço do motor, que é dada por um sensor que fornece impulsos.
d) Temperatura do ar que é fornecida por um NTC ou outro tipo de sensor.
e) Temperatura do motor que é fornecida por um NTC ou outro sensor equivalente.
f) Condição de carga do veículo que é fornecida por sensores resistivos.
g) Tensão da bateria ou da rede elétrica do veículo que é fornecida diretamente ao circuito.
h) Oxigênio residual da mistura que é fornecido por uma sonda lâmbda na forma de variações de tensão.
Se a informação for obtida na forma de pulsos (informação digital) temos um simples processamento desses pulsos de modo a adequá-los a operação do sistema. No entanto, se for na forma de tensões, estas tensões devem passar por um bloco conversor analógico/digital (A/D).
As informações, todas digitalizadas, são então distribuídas por meio de um barramento, aos diversos circuitos do controle.
Paralelamente, um clock fornece o ritmo de funcionamento a um microprocessador. No bloco deste microprocessador temos a CPU, ALU, o acumulador e a unidade de controle que gerenciam o funcionamento do sistema a partir de informações armazenadas em duas memórias, uma RAM e uma ROM.
Na RAM (Ramdom Acess Memory) temos as informações colhidas pelos sensores e devidamente digitalizadas e na ROM (Read Only Memory) temos as informações fixas, gravadas pelo fabricante conforme o tipo de carro e que correspondem as suas características ideais de funcionamento.
Assim, o microprocessador verifica quais são as condições de momento de funcionamento do carro, a partir dos dados colhidos pelos sensores, e consulta na ROM qual deve ser o procedimento para se ter o desempenho ideal do motor.
São então obtidas as informações para os tempos e quantidades de injeção de combustível, energia da faísca da vela, e demais variáveis que podem ser ajustadas para o melhor rendimento possível.
Na configuração mais simples, como a vista, o sistema pode atuar sobre funções básicas como a ignição e a injeção de combustível, mas a versatilidade dos microprocessadores, que em alguns casos são especificamente projetados para uso automotivo, pode ir além.
Assim, conforme sugere a figura 6, o carro do ano 2 000 será totalmente controlado por um microprocessador.
Neste caso, os sinais de captadores que levam informações sobre a aceleração, freada, tipo de chão são agregados e o microprocessador passa também a atuar sobre a caixa de mudança de velocidade, o sistema anti-bloqueio dos freios (ABS), a suspensão e até mesmo o sistema de direção.
O próprio conforto interno do motorista e passageiros pode ser determinado pelas informações dos sensores, como por exemplo atuando sobre o sistema de ar condicionado e até mesmo a suspensão dos bancos.
Nos Estados Unidos foi recentemente anunciado um "óleo" cuja viscosidade depende de um campo eletromagnético a ele aplicado. Com este tipo de óleo foi desenvolvido um amortecedor que pode ter sua ação controlada eletrônicamente, conforme mostra a figura 7.
Assim, colocando estes amortecedores nos bancos de um veículo e fazendo seu controle pelo microprocessador de bordo, com sinais a partir de sensores apropriados, é possível controlar a suspensão dos bancos conforme a passagem do veículos por irregularidades do solo, obtendo-se um conforto muito maior.
CONCLUSÃO
A injeção eletrônica, o amortecedor eletrônico, são apenas alguns dos recursos eletrônicos que o carro do ano 2000 deve incorporar. A análise do princípio de funcionamento desses dispositivos e dos circuitos envolvidos não é simples e, evidentemente, não pode ser abordada num artigo das dimensões deste. No entanto, o assunto é importante já que o técnico do futuro também deve trabalhar no carro, e o eletricista de automóveis está fadado a se tornar o eletrônico do automóvel. A produção de artigos q1ue informe sobre a eletrônica do automóvel é pois um compromisso que temos com nossos leitores e que não pode falar. Na próxima edição teremos um artigo mais técnico sobre o funcionamento da parte eletrônica dos alternadores dos automóveis.
Nos nossos dias tudo aquilo que este artigo descreve como do "carro do futuro" já é realidade e temos uma amostra disso no crescimento da eletrônica embarcada, a eletrônica que equipa os veículos de nossos dias (2011).