PLL ou Phase Locked Loop é o nome de um dos mais importantes de todos os circuitos que atualmente encontramos em aplicações eletrônicas de todos os tipos. O PLL está para a freqüência assim como o amplificador operacional está para a tensão. Qualquer profissional da eletrônica que trabalhe com circuitos de comunicações, instrumentação digital, DSPs, microcontroladores e microprocessadores ou mesmo circuitos de sinais analógicos precisa conhecer o princípio de funcionamento dos PLLs. Neste artigo, de forma simples vamos analisar o funcionamento de mais este importante circuito eletrônico básico.
PLLs ou Phase Locked Loop (que alguns traduzem por Elo Travado em Fase) são encontrados em receptores de AM, FM, modems, sintetizadores de frequências, telefones sem fio, telefones celulares, instrumentos digitais e analógicos e numa infinidade de outras aplicações onde frequências estejam presentes.
O PLL trabalha com frequências do mesmo modo que um amplificador operacional trabalha com tensões daí sua importância na eletrônica moderna.
PLL Básico
Para entender como funciona um PLL vamos analisar seu funcionamento por partes, começando com uma configuração bastante simples que é mostrada na figura 1.
Neste circuito temos um bloco (que analisaremos melhor depois) cuja tensão de saída depende da diferença de fase entre dois sinais de mesma frequencia aplicados à sua entrada.
Esta tensão é filtrada por um filtro passa-baixas que, nas configuração mais simples nada mais é do que um resistor e um capacitor.
O sinal deste filtro serve para controlar a frequência do bloco final que consiste num oscilador controlado por tensão ou VCO (Voltage Controlled Oscillator).
Este circuito gera um sinal cuja frequência pode ser deslocada dentro de uma faixa de valores a partir da tensão aplicada na sua entrada.
O sinal deste oscilador, conforme mostra o diagrama básico é aplicado à entrada através de um elo (loop) de realimentação.
Partindo da situação em que não existe sinal de entrada, a frequência do sinal na saída é determinada apenas pelas características do VCO e ficará num valor central.
Se aplicarmos na entrada deste circuito um sinal de frequência f, o detector de fase entrará em ação e comparará a frequência deste sinal com a frequência do VCO que é aplicada à entrada.
Supondo que os sinais tenham frequências diferentes, o detector de fase vai gerar um sinal que é a diferença das frequências (f - fo) o qual será aplicado ao filtro.
O resultado, é que como esta frequência é relativamente baixa, ao ser aplicada ao filtro é criada uma tensão que oscila sensivelmente atuando sobre o VCO.
A reação do VCO a este ripple ou ondulação aplicada a partir do VCO é uma mudança de frequência que justamente tende a fazer com que sua saída se aproxime da frequência do sinal de entrada.
No momento em que as frequências se igualam o ripple desaparece e a tensão na saída do filtro passa-baixas se estabiliza "travando" o VCO justamente na freqüência e entrada.
Dizemos que o VCO capturou o sinal ou "travou" o sinal reconhecendo sua freqüência.
Na figura 2 mostramos num gráfico o que ocorre.
Qualquer alteração na frequência do sinal de entrada que ocorra vai gerar um novo sinal diferença na saída do detector de fase e uma mudança de tensão na saída do filtro que levará o VCO a "procurar" a nova frequência.
Na teoria, um circuito como este seria bastante simples de implementar, mas provavelmente não teria um desempenho conforme o esperado por diversos fatores que devem ser levados em consideração.
Assim, para implementação de um PLL real, precisamos ir além analisando alguns pontos importantes de seu funcionamento.
Faixa de Captura
Ao tomarmos como exemplo os blocos da figura 1, consideramos que a diferença de frequências entre o sinal de entrada e o gerado pelo VCO era suficientemente baixa para que a sua diferença pudesse passar pelo segundo bloco que é o filtro passa-baixas.
Se trabalharmos com sinais muito diferentes, a diferença pode ser uma frequência alta demais para passar pelo filtro e o sistema não funciona.
Não teremos uma tensão de saída para atuar sobre o VCO.
Isso significa que existe uma faixa bem determinada de frequências, em torno da qual o VCO opera em o circuito pode atuar, travando. Esta faixa de frequências é chamada de "faixa de captura" ou em inglês "lock range".
Obs: é interessante que o leitor se familiarize com todos os termos em inglês usados na descrição do funcionamento dos PLLs pois eles não só são usados nas documentações originais que estão neste idioma como em muitos documentos em português que não traduzem muitos termos técnicos.
A faixa de captura de um PLL é dada pela diferença entre a frequência mais alta e a frequência mais baixa, em torno de fo (frequência central do VCO) que pode ser capturada, conforme mostra a figura 3.
Nos PLLs comuns que podemos obter na forma de circuitos integrados a frequência central fo pode ser ser selecionada através de resistores e capacitores externos enquanto que a faixa de captura depende do tipo.
Assim, por exemplo, um CI como NE567 pode operar com um fo de até 500 kHz, capturando sinais cuja faixa de frequências em torno de fo chega a ser de até 10 para 1, ou seja, o f1 e 10 vezes menor que o f2 no gráfico da figura 3.
Detectores de Fase
Encontramos dois tipos diferentes de detectores de fase nos PLLs comuns. Estes detectores são chamados de tipo I e tipo II.
a) Detector de fase tipo I
O detector de fase do tipo I consiste num multiplicador de quatro quadrantes. Para entender melhor como funciona este tipo de circuito, vamos imaginar que a na sua entrada sejam aplicados dois sinais digitais de mesma frequência mas com uma certa diferença de fase, conforme vamos explicar a partir da figura 4.
Vamos imaginar que estes sinais sejam aplicados a uma porta Ou-Exclusivo, o que nos leva a obter uma saída que seja formada por pulsos cuja largura corresponde justamente à diferença de fase entre os dois sinais.
Estes pulsos, conforme sua largura representam uma tensão média que justamente será proporcional a esta diferença de fase conforme mostra a curva em (b) da figura 4.
Um ponto muito interessante que podemos observar analisando esta figura é que a frequência do sinal de saída é o dobro da frequência dos sinais de entrada (conforme veremos oportunamente, esta característica permite que os PLLs sejam usados para multiplicar frequências).
O grande problema deste tipo de circuito é que ele tende a travar quando sinais de frequências múltiplas são aplicados à entrada, conforme mostra a figura 5.
Em outras palavras, este tipo de detector de fase não é capaz de diferenciar um sinal da frequência fundamental de uma harmônica, podendo travar em qualquer dos dois.
Um outro problema que também deve ser considerado é que se os sinais aplicados na entrada não tiverem um ciclo ativo próximo de 50% o detector do tipo I também não funcionará direito.
O grande positivo na operação deste tipo de circuito é a sua imunidade a ruídos na entrada.
b) Detector de fase tipo II
Este tipo de circuito trabalha com as frontes dos sinais aplicados na entrada. Em outras palavras, ele leva em conta o instante em que os sinais mudam de nível o que significa que eles devem trabalhar com sinais retangulares.
Podemos comparar este detector a uma chave de 1 pólo x 3 posições, conforme mostra a figura 6.
Quando o sinal de entrada tem uma transição negativa faz com que a chave seja levada para a posição de nível lógico 1 (para cima) a não ser que ela já esteja nesta posição. Da mesma forma, uma transição negativa do sinal do VCO faz com que a chave passe para a posição de nivel lógico 0 (para baixo).
Isso significa que os dois sinais têm diferença de fase, a chave atua para cima e para baixo gerando assim um sinal de controle.
Se os sinais tiverem mesma frequência e fase a chave não consegue mudar de posição em velocidade suficiente e com isso assume uma posição média em que o nível nem é alto e nem baixo (circuito aberto).
Veja que, neste tipo de detector se os sinais estiverem em fase não há sinal de saída, e assim não há há sinal residual quando ele trava.
Também é preciso observar que, para o filtro passa-baixas a chave atua como um circuito de carga e descarga do capacitor. O filtro, neste tipo de detector atua de maneira semelhante a um circuito de amostrageme retenção (sample and hold)
Outro ponto importante deste circuito é que a faixa de captura não depende do filtro passa baixas.
O ponto negativo deste tipo de detector de fase está na possibilidade dele ser enganado por ruídos no sinal. Um sinal que tenha oscilações, como o mostrado na figura 7 pode levar o circuito a gerar várias transições indevidas. Sinais livre de ruídos devem ser usados com PLLs que possuam este tipo de detector de fase.
Na tabela dada a seguir temos uma comparação de desempenho dos dois tipos de detector:
Tipo I |
Tipo II |
|
Ciclo ativo do sinal de entrada |
deve ser próximo de 50% |
Irrelevante |
Sensível a harmônicas |
sim |
não |
Sensível a ruídos |
não |
sim |
ondulação (ripple) |
alto |
baixo |
Faixa de captura |
estreita |
larga |
Diferença de fase quando o sinal é capturado |
90 graus |
0 grau |
Freqüência quando fora da captura |
Freqüência central do V CO |
Freqüência mínima do VCO |
Filtro Passa-Baixas
O Filtro passa baixas tem duas funções neste tipo de circuito. Ele ao mesmo tempo proporciona um sinal que é uma tensão cujo valor médio corresponde à diferença de fase dos sinais e determina a velocidade segundo a qual a frequência do VCO muda.
Como a velocidade segundo o qual ele atua sobre o VCO é um fator importante para determinar a imunidade ao ruído presente no sinal de entrada, nos projetos de PLLs os componentes associados ao filtro devem ser escolhidos com o máximo de cuidado.
O tipo mais simples de filtro é o formado por um circuito RC, conforme mostra a figura 8 em (a). No entanto, como esta configuração mais simples não garante o melhor desempenho, costuma-se usar uma configuração um pouco mais complexa que é mostrada na mesma figura em (b).
Para maior estabilidade o valor de R2 deve ser da ordem de 1/5 do valor de R1 neste tipo de filtro. Esta regrinha é apenas uma aproximação pois existem métodos de cálculos que podem ser aplicados em casos em que se deseja uma performance muito mais próxima da ideal.
Usando PLLs
As propriedades do circuito que analisando servem para uma infinidade de aplicações práticas que envolvem a necessidade de se reconhecer um sinal de determinada frequência como ponto de partida para a aplicação.
Vamos analisar algumas dessas aplicações:
a) Regeneração de sinais
Existem aplicações em que se necessita que o sinal aplicado a entrada do circuito seja exatamente o mesmo que se tenha na saída.
Este tipo de comportamento é, em especial, altamente desejável num modem, onde, que precisa recuperar sinais que percorrem longas distâncias através de linhas telefônicas que os deformam.
Os projetistas de circuitos digitais sabem que, quando aumentamos a relação sinal/ruído, ao mesmo tempo temos uma diminuição da faixa passante.
No caso específico dos PLLs a faixa passante está determinada basicamente pelas características do filtro.
Na figura 9 mostramos como é possível implementar demodulador para sinais FSK usando um PLL.
Evidentemente, as transmissões de dados usando FSK não mais são usadas, mas o circuito serve como um exemplo de aplicação.
b) Demodulação de FM
Eis uma função bastante interessante que pode ser implementada utilizando-se um PLL. Este tipo de aplicação para os PLLs, em especial é usada em circuitos de comunicações porque eles são muito mais lineares do que os detectores de relação ou de quadratura.
No entanto, o circuito também é um pouco mais caro pela necessidade de se ter um VCO linear e de ser capaz de operar em frequências muito mais altas.
Neste tipo de aplicação, o VCO é ligado de tal forma que sua frequência central seja a mesma que a frequência intermediária usada no receptor com o qual ele opera.
A faixa de captura deve ser pelo menos duas vezes mais larga que a faixa de frequências em que se desloca o sinal quando modulado em frequência, conforme mostra a figura 10.
Por exemplo, para um receptor de FM comum que tem uma FI de 10,7 MHz e uma largura de faixa de modulação de 75 kHz estes são os valores a serem considerados no projeto, conforme mostrado na figura 10.
Uma outra aplicação semelhante é a mostrada em blocos na figura 11.
O sinal de um amplificador de áudio modula em frequência um oscilador de alta frequência. Este sinal modulado em frequência é aplicado à rede de energia sendo separado por um filtro passa altas na entrada do receptor remoto. Este sinal é aplicado ao PLL que então o demodula para amplificação por um amplificador de áudio. Este é princípio de funcionamento de muitos intercomunicadores de escritório e babás eletrônicas.
c) Multiplicação de frequência
Um amplificador operacional pode ser usado como multiplicador de tensão na configuração mostrada na figura 12.
A relação entre os resistores da rede divisora determina o ganho e portanto quantas vezes a tensão de saída é maior (ou menor) que a tensão de entrada (dependendo do fator de multiplicação escolhido).
Como informamos na introdução, os PLLs fazem com a frequência o mesmo os amplificadores operacionais fazem com as tensões. Assim, usamos o bloco da figura 13 para multiplicar frequências.
Uma aplicação possível para este circuito é gerando a subportadora de 38 KHz nos receptores de FM estéreo a partir do tom piloto de 19 kHz.
Vamos tomar este circuito básico e analisar seu princípio de funcionamento.
Conforme podemos ver, na saída do VCO ligamos um divisor de frequência, por exemplo, por 2 para jogá-lo a entrada do comparador.
Isso significa que, para que tenhamos a captura do sinal de entrada é preciso que o sinal gerado pelo VCO e portanto aplicado ao divisor de tensão tenha exatamente o dobro desta frequência.
Se usarmos um divisor por 3, a captura só ocorre se o sinal gerar um sinal com o triplo da frequência e assim por diante. Fica claro então que o divisor de frequência vai determinar por quanto podemos multiplicar a frequência de um sinal e obtê-la na saída do VCO.
d) Translação de Frequência
Diversos circuitos integrados são disponíveis coma capacidade de gerar uma série de frequências a partir de uma frequência de referência. O circuito integrado MC14151 da Motorola é um exemplo.
Uma das principais aplicações para estes circuitos é gerar diversas frequências a partir de um único oscilador, que use um cristal por exemplo. Assim, pode-se operar um transmissor ou receptor em diversos canais utilizando-se apenas um cristal de controle.
Na figura 14 mostramos a estrutura em blocos de um desses circuitos.
Na figura em que questão temos um circuito que produz sinais de frequências que obedecem as seguintes relações:
(f1 +f2) - f1 = f2
e
(f1 + f2) + f1 = 2f1 + f2
Se o filtro passa baixas deixar passa apenas a frequência diferença então as entradas do comparador de fase estarão na mesma frequência ocorrendo o travamento do circuito, numa operação estável.
e) Demodulação AM
Sinais modulados em amplitude também podem ser detectados com o uso de PLLs num circuito denominado "sincrodino" e que tem o diagrama de blocos mostrado na figura 15.
As características de linearidade deste circuito apresentam muitas vantagens em relação à técnica tradicional de detecção que faz uso de diodos.
O PLL gera um sinal retangular que está travado em fase com a frequência da portadora. O circuito adicional é um inversor opcional com o ganho -1 ou +1, e que funciona como um retificador sincronizado.
Conclusão
PLLs são usados em uma infinidade de aplicações e o que demos foi uma simples descrição do seu princípio de funcionamento e algumas aplicações em circuitos práticos.
Existem muitos circuitos integrados de PLLs como o 4046, NE567 e outros que podem ser usados em projetos cujas frequências cheguem até alguns megahertz. Tipos especiais podem ser encontrados para aplicações em frequências mais altas, mas seu funcionamento e modo de uso não se altera.
Analisando os data-sheets de tais componentes os leitores podem agora ter muito mais facilidade para entender suas características e como usá-los num novo projeto.