Muito se apregoa que o multímetro é o mais útil de todos os instrumentos com que o profissional da eletrônica pode contar. No entanto, a maioria dos usuários deste instrumento, baseados unicamente no que aprendem nos cursos técnicos e de engenharia, apenas sabem usá-lo nas medidas básicas: tensão, corrente e resistência. O multímetro é muito mais do que um medidor de apenas três grandezas: sabendo usá-lo podemos obter muito mais que isso, testando componentes, tendo idéia sobre formas de onda e distorção de um circuito e até detectando sinais de RF. Veja neste artigo algumas destas aplicações incomuns do multímetro.


No nosso livro Curso de Instrumentação Eletrônica – O Multímetro, insistimos no fato de que não basta saber usar o multímetro na medida de três grandezas básicas, corrente, resistência e tensão, para se poder dizer que a sua finalidade está completa.
O multímetro é muito mais, mas para que ele possa ser usado em funções que vão além de simples medidas diretas é preciso saber interpretar suas indicações.
O movimento da agulha, a oscilação de valores de uma escala digital, a escala usada e o modo como o instrumento é ligado ao circuito em teste são alguns fatores que poucos profissionais sabem interpretar e fazer corretamente.
Com um simples multímetro,mesmo de baixo custo, testes de componentes e de circuitos podem revelar coisas que os leitores não imaginam. Alguns testes incomuns que podem ser feitos com um multímetro são analisados neste artigo.

Como Testar IGBTs
Os IGBTs são amplamente utilizados em inversores de freqüência, controles de potência, fontes chaveadas e conversores DC/DC.
Estes componentes possuem características híbridas, com uma porta isolada como um MOSFET e junções entre o coletor e emissor como um transistor bipolar.
A figura 1 mostra o símbolo adotado para representar um IGBT.


Um dos testes mais comuns para a prova de um IGBT é o teste dinâmico que consiste em se colocar como carga uma lâmpada de 40 a 100 W no seu coletor e alimentar o circuito com uma tensão de  até 20 VDC.

Com a comporta ligada ao emissor do transistor, ele deve permanecer no corte e com isso a lâmpada apagada.

Ligando a comporta ao coletor (o que deve ser feito com um resistor de 10 k ohms), o transistor satura e a lâmpada acende. Este procedimento dinâmico é mostrado na figura 2.



Se a lâmpada permanecer acesa nas duas prova o IGBT está em curto e se permanecer apagada, o IGBT está aberto. O leitor deve estar atento para a máxima tensão que pode ser aplicada entre a comporta e o emissor do transistor que em geral é 20 V.

Se o teste for feito com tensões maiores, a tensão aplicada à comporta deve ser sempre inferior à 20 V.

No entanto, um teste semelhante pode ser feito com multímetro analógico e mesmo com alguns tipos de multímetros digitais que tenham tensão de prova suficiente para saturá-lo, quando colocados nas escalas de resistências ou teste de diodos. Para esta finalidade podemos inicialmente fazer um teste de curto-circuito, conforme mostra a figura 3.

 


Medimos inicialmente a resistência entre os terminais de gate e o coletor e depois entre o gate e o emissor.
Nas duas medidas devemos ter leituras de altas resistências. Por alta resistência entendemos valores acima de 10 M ohms.
Se em qualquer das medidas tivermos uma leitura de baixa resistência ou mesmo média (entre 10 k e 1M ohms),  o IGBT está inutilizado por curto ou ainda fuga excessiva. Se ele passar neste teste, medimos a resistência entre coletor e emissor.
Num sentido ela deve ser alta e no outro baixa, pois devemos considerar o diodo de proteção que estes componentes têm, conforme mostra a figura 4.

Uma leitura de baixa resistência nas duas medidas indica um IGBT em curto e uma leitura de resistência algo baixa onde deveria ser muito alta (entre 10 k e 1 M) indica um componente com fugas. Em ambos os casos, o componente não deve ser utilizado.
Dependendo da tensão da bateria do multímetro, pode ser realizado um teste de comutação relativamente simples. Para isso, utilizamos a conexão da figura 4 com o multímetro numa escala intermediária de resistências.
Tocando com uma chave de fendas ou fazendo uma ponte entre o gate (g) e o coletor (C) do transistor, ele deve comutar.
Isso fará com que a resistência caia, passando de um valor muito alto para um valor mais baixo que depende das características do IGBT em teste e do próprio multímetro.
No entanto, é preciso levar em conta que a bateria interna de alguns multímetro não tem tensão suficiente para levar o componente a condução. Para não ter dúvidas se este teste se aplica com o multímetro de que se dispõe, será interessante tentar com um IGBT que sabemos estar em bom estado.
Uma forma de se testar um IGBT com o multímetro no caso de não ser possível a prova direta descrita é a mostrada na figura 5.


Uma bateria de 9 V fornece a tensão necessária à polarização do componente e com isso uma leitura de corrente aumentando com o toque pode ser feita para o caso de um componente em bom estado.

 


Como Testar Power MOSFET
Partindo do princípio de que em muitas aplicações os MOSFETs de potência substituem os IGBTs, o procedimento de teste de um poderia ser considerado válido para  o outro.
No entanto, existem algumas diferenças a serem consideradas o que nos leva a um procedimento algo diferenciado e que passamos a descrever.
Assim, o teste dinâmico, que também pode fazer uso do multímetro, consiste em alimentar o MOSFET de potência com uma tensão contínua entre 12 e 25 V, conforme mostra a figura 6.


A carga tanto pode ser uma lâmpada de acordo com a tensão usada na alimentação como um resistor de 1 a 2,2 k ohms x 2 W ou de dissipação maior se usarmos o multímetro.
Sem polarização de comporta, o transistor permanece no corte e a lâmpada apagada. A tensão medida no caso do resistor deve ser nula ou muito baixa.
Se a lâmpada permanecer acesa ou com brilho reduzido, ou ainda se a tensão medida não for nula, isso indica um transistor em curto ou com fugas.
Numa segunda etapa, ligamos a comporta do transistor ao positivo da alimentação, conforme mostra a figura 7.


Isso deve fazer com que o transistor vá à saturação e temos duas possibilidades de indicação. No caso da lâmpada, ela deve acender com bom brilho e no caso do multímetro a tensão indicada deve subir para bem perto da tensão de alimentação.
Veja que este teste é feito desta forma no caso de transistores MOSFET de canal N.
Para MOSFETs de canal P devemos inverter as polaridades das tensões aplicadas.
O uso do multímetro sem nenhum componente adicional também pode ajudar a revelar o estado de um MOSFET de potência. Para isso devemos considerar se este componente possui ou não o diodo de proteção interna, conforme mostra a figura 8.


Colocando o multímetro numa escala intermediária de resistências (Ohms x10 ou ohms x100) medimos a resistência entre o dreno (d) e a fonte (s), nos dois sentidos, conforme mostra a figura 9.


Num sentido ( quando o diodo se encontra polarizado no sentido direto) temos uma baixa resistência. No sentido inverso (quando o diodo se encontra polarizado no sentido inverso) temos uma alta resistência.

Entendemos por alta resistência, neste caso, valores acima de 1 M ohms.
Duas resistências baixas indicam que o transistor está em curto.

Uma resistência intermediária (entre 10 k e 1 M) onde deveria ser lido um valor muito maior, praticamente infinito, indica um transistor em curto.

A resistência entre a comporta e qualquer dos outros demais eletrodos (dreno e fonte) deve ser sempre muito alta em qualquer sentido, conforme mostra a figura 10.



Esta elevada resistência, bem acima dos 10 M ohms, deve-se à presença do óxido que isola a comporta do substrato do componente.
Uma resistência anormalmente baixa nesta medida indica um transistor danificado (em curto ou com fugas).
O teste dinâmico também é possível. Para isso temos a configuração mostrada na figura 11 para o caso em que a tensão da bateria interna do multímetro é suficiente para polarizar a comporta do componente.


Com as pontas de prova na posição indicada, a leitura deve ser de uma alta resistência inicialmente.
Fazendo uma ponte com uma chave de fendas ou um fio entre o dreno e a comporta do MOSFET devemos ter sua condução com o multímetro acusando uma queda de resistência.Se a resistência não se alterar é sinal que o componente está com problemas.
Para ter certeza que seu multímetro é confiável neste teste, dadas suas características elétricas, tente antes com um MOSFET que você sabe que está em bom estado.

 


Conclusão
Com um pouco mais de paciência pode-se ir além no uso do multímetro no teste de IGBTs e Power MOSFETs.
Podemos até determinar algumas de suas características dinâmicas, utilizando para isso alguns componentes externos adicionais.
No entanto, para os leitores que trabalham com estes componentes e às vezes têm dúvidas se eles estão bons ou não, o simples teste de estado que descrevemos pode ser de muita utilidade.