Uma confusão muito comum entre os makers, estudantes, professores e desenvolvedores de projetos que envolvam movimento é a que ocorre com os conceitos de aceleração, velocidade e inércia. Essa confusão afeta o entendimento de parâmetros importantes para o desenvolvimento de projetos, sua aplicação final e evidentemente os testes de funcionamento. Neste artigo tratamos desses conceitos, possibilitando uma visão melhor do funcionamento de todos os projetos que envolvam estas grandezas físicas.

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Velocidade e aceleração foram confundidas por muito tempo, quando a física não era ainda dominada pela maioria das pessoas, principalmente pelos que trabalhavam em sistemas de transportes a automatismos de todos os tipos.

Assim, havia o conceito errado de que era a velocidade que causava o desconforto nas pessoas e não sua variação, no caso a aceleração. Houve tempos em que era proibido pensar em qualquer meio de transporte que se deslocasse a mais de 60 km/h, pois segundo os conceitos da época, as pessoas ficariam sujeitas a forças que as mataria esmagadas.

A confusão entre velocidade e aceleração é evidente. Ficamos submetidos a uma força quando a nossa velocidade varia, ou seja, quando estamos sujeitos a uma aceleração, isso devido a inércia dada pela massa de nosso corpo. Uma força é necessária para retirar nosso corpo do repouso ou para mudar esta velocidade. Esse fato é explicado pela segunda lei de Newton, que trata da inércia, conforme mostra a figura 1.

 

Figura 1 – Uma força deve ser aplicada a um objeto para se obter uma variação de sua velocidade ou colocá-lo em movimento.
Figura 1 – Uma força deve ser aplicada a um objeto para se obter uma variação de sua velocidade ou colocá-lo em movimento.

 

 

A variação da velocidade que é responsável pelo aparecimento de uma força de reação sobre um corpo não ocorre somente quando temos uma mudança de seu valor, mas também de sua direção. Assim, essa força aparece também quando um carro faz uma curva.

 

É por esse motivo, que mesmo estando num avião a 900k/h não sentimos absolutamente nada. A velocidade é constante e por isso, nosso corpo não fica submetido a esforços de nenhuma natureza. Nosso copo de refresco fica imóvel na mesinha do avião, desde que ele mantenha constante sua velocidade.

 

No entanto quando o avião acelera para adquirir a velocidade necessária à decolagem, ou no pouso, quando freia até reduzir sua velocidade a um valor seguro, ficamos sujeitos a uma força que nos prende ao assento ou tende a nos jogar fora dele.

Essa força, por exemplo nos elevadores ocorre quando ele acelera ou freia, pode ser facilmente calculada e tem uma grande importância no projeto dos sistemas que controlam os seus movimentos.

 

Calculando as Forças

Nosso peso se deve a atração da gravidade. Na verdade, em física dizemos que estamos submetidos à aceleração da gravidade que é de 9,8 m/s2. O que significa esse valor?

Significa que se soltarmos um corpo livremente e ele cair, na sua queda livre sua velocidade aumenta em 9,8 m/s a cada segundo de seu movimento. No primeiro segundo sua velocidade será 9,8 m/s, no segundo segundo será 19,6 m/s e assim por diante. Veja então que se formos submetidos a uma aceleração adicional de 9,8 m/s2 nosso peso se altera proporcionalmente a esse valor.

Por exemplo, se estivermos num elevador em queda livre, a aceleração será de 9,8 m/s2, mas o nosso peso é dado pelo mesmo valor da aceleração da gravidade que então se cancela. Flutuaremos, pois as forças exercidas no nosso corpo se cancelam.

Por outro lado, se um elevador subir partindo com uma aceleração de 9,8 m/s2, a força sobre o nosso corpo corresponderá a duas vezes a da gravidade, o que será dado por 2g. O resultado é que ficaremos momentaneamente submetidos a uma força equivalente a duas vezes nosso peso, algo muito desconfortável, conforme sugere a figura 2.

 

Figura 2 – Sentimos uma variação do peso quando o elevador acelera (muda de velocidade)
Figura 2 – Sentimos uma variação do peso quando o elevador acelera (muda de velocidade)

 

Existe um limite para a força máxima a que podemos estar submetidos. Nos aviões de caça, por exemplo, quando mergulham e retomam a altura, no ponto mais baixo da trajetória o piloto pode ser submetido a uma aceleração de muitas vezes a da gravidade, o que faz com que seu sangue deixe de ser bombeado para o cérebro e ele “apague” por uns momentos... A figura 3 mostra o que ocorre.

 

Figura 3 – Um piloto pode ficar submetido a uma força maior do que 5 vezes seu próprio peso no mergulho da aeronave.
Figura 3 – Um piloto pode ficar submetido a uma força maior do que 5 vezes seu próprio peso no mergulho da aeronave.

 

Num elevador não seria admissível que os passageiros “apagassem” devido a aceleração no momento que sobem, até atingir a velocidade constante quando tudo seria normalizado. As empresas que projetam os sistemas de controle do movimento dos elevadores são muito cuidadosas com o modo como seus elevadores sobem e descem.

 

Normas e Estudos

As empresas fabricantes de elevadores não só estudam cuidadosamente os valores das acelerações e frenagens de seus elevadores em termos gerais, como também em função do tipo de pessoas que devem transportar, fazendo testes de conforto antes de lançar um produto. Na figura 4 temos um exemplo de software para simulação de tráfego de elevadores.

 

Figura 4 – Exemplo de software para se determinar velocidades e acelerações de um elevador
Figura 4 – Exemplo de software para se determinar velocidades e acelerações de um elevador

 

Idosos, mulheres grávidas, pessoas com peso acima do normal são os principais alvos desta pesquisa, pois são justamente os mais sensíveis a eventuais esforços que podem ocorrer nos momentos em que o elevador acelera e freia.

Programas permitem aos projetistas simular os comportamentos dos elevadores de modo que eles tenham um funcionamento confortável e também evitar o que se denomina “jerk” que seria a parada brusca ou rebate no final do movimento.

Na figura 5 temos um exemplo de curvas de comportamento dos elevadores, mostrando que a velocidade máxima está diretamente associada à aceleração e o espaço percorrido.

 

Figura 5 – Exemplos de curvas de velocidade de elevadores em diversos intervalos de tempo
Figura 5 – Exemplos de curvas de velocidade de elevadores em diversos intervalos de tempo

 

Assim, para um deslocamento de apenas 1 andar uma aceleração confortável não permite alcançar a velocidade máxima e, neste caso, essa velocidade tem uma variação menor. Neste caso a velocidade máxima, pelo gráfico, é de pouco mais do que 1,5 m/s.

Num percurso maior, de vários andares, a velocidade pode chegar ao seu máximo e com isso otimizar o tempo necessário para se atingir o andar desejado. No gráfico, vemos que a velocidade alcança 2,5 m/s e se mantém constante para depois cair no final do percurso. A tabela abaixo mostra alguns valores típicos que incluem o “jerk” que é medido na variação da aceleração por segundo, ou seja m/s2 por segundo ou m/s3.

 

Velocidade
(m/s)

Aceleração
(m/s2)

Jerk
(m/s3)

0.30

0.4

0.8

0.63

0.4

0.8

1.00

0.4

0.8

1.60

0.7

1.4

2.50

0.8

1.6

3.15

1.0

1.6

5.00

1.2

1.6

6.00

1.5

1.6

7.00

1.5

1.6

8.00

1.5

1.6    

 

Observamos que a velocidade máxima prevista de 8 m/s corresponde a 28,8 km/h. Para converter, basta multiplicar o valor em m/s por 3 600 (número de segundos em uma hora).

Ainda como curiosidade, uma aceleração de 1,6 m/s2 corresponde a 15% do valor da aceleração da gravidade. Assim, num elevador submetido a esta aceleração na subida (ou desaceleração descida) há um acréscimo de 15% em seu peso.

Veja que todos estes parâmetros ainda devem ser associados ao consumo de energia e também ao uso racional do elevador, atendendo todos os chamados de acordo com uma programação inteligente e se existirem outros elevadores no mesmo prédio, compartilhando seu funcionamento.

Também deve ser considerado que as força que aparecem sobre o passageiro, influindo no seu conforto na viagem, também aparecem nos demais elementos do sistema, com especial atenção aos cabos. Um elevador que acelere na subida ou que freie na descida com uma aceleração de 1,5 m/s2, que corresponde a 15% da aceleração da gravidade, tem um esforço momentâneo nos cabos que aumenta seu peso na mesma proporção. Um elevador de 600 kg (elevador mais carga) fará um esforço no cabo de 690 kg (*).

Os microcontroladores e microprocessadores utilizados nos sistemas de controle devem ter em sua programação os algoritmos que levam ao melhor desempenho e a criação desses algoritmos é algo que envolve um bom conhecimento de disciplinas como a física, a ergonometria, segurança e até mesmo a psicologia para se garantir que os usuários tenham o máximo de seu elevador.

Para os técnicos de elevadores e os projetistas de qualquer automatismo que envolva a movimentação de massas fica a necessidade de saber que os fatores que determinam o funcionamento da forma confortável e segura devem ser observados com o máximo de rigor.

Numa época em que além de elevadores temos os veículos autônomos elétricos chegando, drones e muito mais o conhecimento desses fatores é absolutamente necessário.

(*) Na verdade, quando falamos em “peso” de um objeto, nos referimos à força peso, ou seja, à força que a sua massa fica submetida sob a ação da gravidade. Da mesma forma, também consideramos as forças que atuam sobre o objeto quando ele acelera ou freia.