Os comparadores de tensão na forma de circuitos integrados podem ser usados numa infinidade de soluções práticas para o desenvolvedor de projetos eletrônicos. Mesmo na indústria e no trabalho de campo, saber usar um comparador de tensão pode ser de grande utilidade para se improvisar soluções simples para problemas que eventualmente podem até ser complexos quando analisados a uma primeira vista. Neste artigo não só revisamos os princípios de funcionamento dos comparadores como damos alguns circuitos práticos simulados em computador, num dos muitos programas que podem ser obtidos para esta finalidade.

Um comparador de tensão nada mais é do que um amplificador operacional de alto ganho, que opera sem realimentação. Conforme mostra a figura 1, um comparador possui uma entrada inversora (-) e uma entrada não inversora (+).

 


 

 

 Numa aplicação típica como amplificador operacional, o circuito possui uma região de operação linear, conforme mostra a figura 2.

 


 

 

 No entanto, considerando-se o seu ganho muito alto, essa região linear pode ser desprezada e o amplificador, dentro de sua gama de operação, trabalha saturado com uma transição muito rápida de sua tensão de saída, em função da amplitude do sinal de entrada, conforme mostra a figura 3.

 


 

 

 Assim, na aplicação típica, o que fazemos é colocar sua entrada inversora a um determinado potencial de referência (Vref) que normalmente é determinado por um divisor de tensão formado por dois resistores, conforme mostra a figura 4.

 


 

 

 Quando a tensão de entrada, aplicada à entrada não inversora (+), é menor do que a tensão de referência, a saída se mantém no nível baixo, ou seja, perto de 0 V. Por outro lado, quando a tensão de entrada é maior do que a tensão de referência, a tensão de saída vai ao nível alto, ou seja, próxima da tensão de alimentação. Quando as tensões se igualam temos uma condição de instabilidade, dado o alto ganho do circuito, o que quer dizer que numa faixa muito estreita de tensões de entrada em que ela se aproxima e passa de Vref, temos a transição do circuito. A figura 5 mostra então a curva característica do comparador típico.

 


 

 

 É claro que podemos também operar com este circuito, aplicando a tensão de referência à entrada não inversora (-). Neste caso, conforme mostra a figura 6, temos um comportamento “invertido” para o comparador.

 


 

 

 Quando a tensão de entrada, aplicada à entrada inversora (-) é menor do que a tensão de referência, a tensão de saída é positiva, ou estará no nível alto. Quando a tensão de entrada for maior do que a referência, a saída estará no nível baixo, ou seja, será uma tensão nula.

Para aplicações práticas, um circuito integrado extremamente versátil, e por isso muito popular, é o LM139/239/339 da National, que consiste em 4 comparadores de tensão num mesmo invólucro, cuja pinagem é mostrada na figura 7.

 


 

 

 Se bem que até mesmo amplificadores operacionais comuns como o 741 possam ser usados como comparadores (bastando deixá-los sem realimentação), os circuitos que daremos a seguir são baseados no Lm339.

Lembramos que a diferença básica entre o LM139, Lm239 e Lm339 está na faixa de temperaturas de operação. Também observamos que os comparadores de tensão, como os da série LM139/239 e 339 possuem saídas com transistores em coletor aberto, o que exige o emprego de resistores “pull-up” em suas aplicações.

Esses resistores não são necessários quando amplificadores operacionais comuns, tais como o 741 são usados na mesma função.

 

Circuitos Práticos

Damos a seguir uma série de circuitos práticos baseados em comparadores e que em alguns casos também podem ser implementados com amplificadores operacionais comuns como o 741.

 

Oscilador a Cristal

Se o leitor precisa de um sinal preciso de 100 kHz retangular, o oscilador controlado a cristal mostrado na figura 8 serve para esta finalidade.

 


 

 

 Evidentemente, o circuito pode gerar sinais de outras freqüências, exigindo-se eventualmente alterações de valor do capacitor usado na realimentação negativa.

A freqüência máxima do circuito é da ordem de 10 MHz, dependendo apenas das características do comparador usado. Observe a necessidade de se usar um resistor pull-up neste circuito.

 

Amplificador Operacional

Com o uso de uma fonte de alimentação simétrica e fixando-se o ganho de modo que não haja saturação, podemos usar um comparador de tensão como amplificador operacional. Apenas precisamos nos lembrar que deve ser usado o resistor “pull-up”, no caso de 15 k Ω.

A figura 9 mostra como implementar este amplificador com ganho 100 usando um LM339 ou outro comparador.

 


 

 

 A simulação, utilizando um equivalente, é mostrada na figura 10. O leitor pode baixar este arquivo e se tiver um programa de simulação, alterar os componentes para modificar o ganho ou operar com outras freqüências.

 


 

 

 As formas de onda obtidas são para uma freqüência de 50 Hz, já que se trata de circuito de baixa freqüência.

 

Foto-Relé Temporizado

No circuito da figura 11, quando o foto-transistor deixa de receber luz, o relé dispara por um intervalo de tempo que depende do valor do capacitor C2.

 


 

 

 A temporização obtida é de aproximadamente 1 segundo para cada microfarad de capacitância. No entanto, capacitores de mais de 1 000 µF não devem ser usados pois suas fugas podem afetar a estabilidade do circuito.

O relé usado é de 12 V com bobina, no máximo, de 50 mA e contactos de acordo com a carga controlada. Também podem ser excitadas cargas de maior potência com o uso de um Darlington PNP.

A fonte de alimentação não precisa ser simétrica e o foto-transistor usado como sensor pode ser de qualquer tipo.

 

Amplificador para Transdutor Magnético

Na figura 12 temos um circuito prático para utilização com transdutor magnético.

 


 

 

 O resistor de 20 MΩ determina o ganho do circuito, devendo ser alterado em função da sensibilidade do transdutor.

A fonte de alimentação deve ser simétrica, com tensão de acordo com a desejada para a amplitude do sinal que deve excitar a etapa seguinte.

 

Oscilador com Comparador

O primeiro circuito prático que apresentamos é de grande utilidade na geração de sinais retangulares de freqüências que podem chegar até a alguns megahertz. O capacitor C1, no circuito da figura 8, determina essa freqüência.

Para valores de R1 e R2 iguais, o sinal gerado é retangular, como a simulação mostrada na figura 14, revela. Nela, o osciloscópio mostra os sinais com um ciclo ativo de 50%.

 


 

 

 

No entanto, podemos variar o ciclo ativo deste oscilador, substituindo R2 por um potenciômetro de 1 MΩ em série com um resistor de 10 kΩ. Esse procedimento, que pode ser testado pelo próprio leitor que tenha um simulador, permite variar o ciclo ativo tipicamente entre 10% e 90 %.

O interessante desta configuração é que praticamente não temos alteração da freqüência mas tão somente do ciclo ativo, o que torna este circuito útil no teste ou excitação de controles PWM. Basta agregar uma etapa excitadora apropriada na saída, se for necessário.

 

Obs: os leitores interessados podem acessar o arquivo da simulação no EWB na seção de circuitos simulados deste site.

 

Flip-Flop RS com Comparador

Um flop-flop Reset-Set capaz de controlar diretamente um relé ou outra carga de potência pode ser implementado em comparadores de tensão como os da série 339.

Na figura 15 mostramos o circuito básico onde os botões Set e Reset podem ser interruptores de pressão comuns, chaves de fim de curso, micro-switches, reed-switches ou qualquer outro tipo de sensor liga-desliga (on-off).

 


 

 

Observe que este circuito usa duas fontes de alimentação, com um relé ou carga de 24 V, corrente máxima de 100 mA. Evidentemente, com o uso de transistores Darlington, podem ser controladas cargas de maior potência como motores, solenóides, lâmpadas indicadoras, etc.

A fonte de alimentação não precisa ser simétrica.

 

Detector de Passagem por Zero

Este é um circuito muito usado em controles de potência. Quando a tensão alternada de alimentação passa por zero é gerado um pulso de disparo para um tiristor, conforme mostra a figura 16.

 


 

 

Na figura 17 mostramos como implementar este circuito usando um comparador do tipo LM339.

 


 

 

 

O circuito apresentado utiliza uma fonte de alimentação simples. Com sinais senoidais, o circuito vai gerar um pulso positivo de curta duração na sua passagem por zero.

 

Conversor de Forma de Onda

Uma outra aplicação de grande utilidade prática para comparadores de tensão é a mostrada na figura 18.

 


 

 

 

Trata-se de um circuito que converte sinais senoidais ou triangulares em sinais retangulares. O comparador dispara com os níveis de tensão programados pelo divisor resistivo, fornecendo assim em sua saída um sinal retangular.

Veja que a programação do ponto do disparo permite alterar o ciclo ativo do sinal gerado. Assim, se um dos resistores da rede de referência for trocado por um potenciômetro, conforme mostra a figura 19, podemos usar este circuito para gerar sinais PWM a partir de um oscilador externo.

 


 

 

 Na figura 20 temos a simulação do circuito no computador. O leitor pode alterar os valores dos resistores do divisor de modo a observar como o ciclo ativo do sinal muda.

 


 

 

 Com sinais triangulares é possível obter uma variação linear do ciclo ativo o que pode ser interessante nas aplicações em que se exige mais precisão.

 

Foto Relé

Na figura 21 temos uma aplicação de um comparador de tensão num circuito que dispara com o sensor (LDR) deixa de receber luz.

 


 

 

 

P1 faz o ajuste do ponto de disparo.

O relé é do tipo sensível com uma corrente máxima de 50 mA, podendo também ser excitada diretamente outro tipo de carga, como solenóides e pequenos motores. Para cargas de maior corrente pode ser usado um Darlington de potência PNP.

Para excitar o circuito com luz, basta inverter as posições de P1/R1 e do sensor.

 

Gerador de Pulsos

Uma outra forma interessante de se gerar sinais com ciclos ativos pequenos, ou seja, pulsos de curta duração é usando circuitos diferentes para carga e descarga do capacitor de temporização.

 No circuito apresentado na figura 22, a relação de valores entre R3 e R4 determina o ciclo ativo. O circuito integrado usado na simulação é o amplificador operacional 741, como comparador de tensão. No entanto, equivalentes que alcancem freqüências mais elevadas podem ser usados.

 


 

 

 

Na figura 23 temos a simulação com as formas de onda. Observe que neste caso temos um ciclo ativo de aproximadamente 10% dado pelos resistores R3 e R4. Os diodos usados foram os 1N4148, mas equivalentes de uso geral servem.

 


 

 

 

Lembramos que para o caso de comparadores como o LM339 e outros da mesma série, é necessário o uso do resistor de pull-up de 15 kΩ dada a configuração de saída em coletor aberto que tais componentes possuem.

Na figura 24 mostramos como substituir os dois resistores que determinam o ciclo ativo do sinal por um potenciômetro de modo a se obter um ajuste do funcionamento.

 


 

 

 

Com o cursor no meio, o ciclo ativo é 50% e esse ciclo ativo pode ser modificado quando deslocamos o eixo para esquerda ou para a direita. O valor desse potenciômetro juntamente com C1 determinarão a freqüência média do sinal gerado.

 

Comparador de Limite

Uma configuração de grande utilidade nas aplicações que envolvem o monitoramento de funções é o comparador de limite. No circuito mostrado na figura 25, a lâmpada acenderá quando a tensão de entrada for maior ou menor que as duas referências aplicadas aos comparadores.

 


 

 

 

Uma aplicação importante deste circuito é como aviso de sub/sobre tensão no monitoramento de fontes. Se o sinal de entrada vier de sensores como, por exemplo, de temperatura, o circuito detectará sub/sobre temperaturas.

Evidentemente, a lâmpada pode ser substituída por um relé para desativar ou ativar um circuito externo, em caso de necessidade. Da mesma forma a lâmpada pode ser substituída por LEDs.

 

Conclusão

Se bem que possamos implementar a função de comparador de tensão com amplificadores operacionais comuns, a grande vantagem no uso de circuitos integrados específicos está tanto na maior velocidade que resulta numa velocidade de comutação maior como a saída em coletor aberto que permite que se programe externamente as suas características de carga.

Os circuitos que vimos são apenas alguns exemplos do que pode ser feito com comparadores de tensão e como esses úteis componentes podem resolver problemas básicos de projeto.