A palavra rádio encerra uma certa magia. Quem não gostaria de aprender a montar seu próprio radinho, com poucos componentes e que funcionasse com pilhas sem a necessidade de equipamentos de ajustes complexos ou outros recursos técnicos avançados? Se você está começando agora a se interessar por eletrônica, neste artigo encontrará elementos que não só lhe ajudarão a entender como funciona um rádio, mas também a montar seu próprio receptor de ondas médias.

Nota: Artigo publicado na revista Eletrônica Total 16 de 1989.

Sempre que o assunto é a prática da eletrônica, uma das perguntas que surge é se é possível com poucos conhecimentos, com a simples leitura de revistas e a utilização de materiais comuns montar um radinho. Na verdade, o termo "rádio" pode significar muitas coisas em eletrônica, referindo-se tanto aos rádios transistorizados de bolso que usamos para ouvir nossos programas favoritos, como aos rádios usados em estações de comunicações, em aviões e na captação de satélites.

No entanto, a palavra "rádio" possui uma certa ilusão, pois nos leva a um mundo maravilhosos em que a voz, a música e os sons mais diversos podem viajar pelo espaço e ser captados em nossas casas por um simples conjunto de peças elaborados com nossas próprias mãos. E estas mãos não precisam ser muito habilidosas. Para conseguir isso. Neste artigo ensinaremos como construir um simples rádio, que captará as estações locais de ondas médias com bom sinal.

 

 

O RECEPTOR

 

Os receptores de rádio ou simplesmente rádios são aparelhos que se destinam a receber ondas eletromagnéticas de determinadas características emitidas pela& estações. Estas ondas têm como principal característica a frequência e a modulação.

As estações que captamos em radinhos de pilha são as de AM ou amplitude modulada e suas frequências estão compreendidas na faixa de ondas médias, que vai de 550 a 1600k Hz (1kHz equivale a 1000 vibrações ou oscilações por segundo), como vemos na figura 1.

 


 

 

 

As ondas destas estações podem atingir distâncias de algumas dezenas de quilômetros durante o dia e, durante a noite, podem chegar a milhares de quilômetros. O que faremos será um receptor simples que, por este motivo, conseguirá captar apenas os sinais das estações próximas de sua localidade, ou seja, num raio de algumas dezenas de quilômetros, mas terá excelente qualidade de som.

Existem muitas técnicas que são utilizadas nos receptores no sentido de dotá-los de características importantes para a qualidade da recepção. Estas características são a seletividade e a sensibilidade. A seletividade é a capacidade que um rádio tem de separar as estações, ou seja, de não "misturar" os sons quando duas estações transmitem em frequências muito próximas. Já a sensibilidade consiste na capacidade de se captar sinais muito fracos, ou seja, de estações que realmente sejam pouco potentes ou que estejam muito distantes.

Os rádios comerciais dão do tipo "super-heteródino", pois apresentam as melhores características de seletividade e sensibilidade, mas usam muitos componentes e precisam de ajustes. Se sacrificarmos estes ajustes 'e componentes podemos ter receptores com menos sensibilidades e seletividades, porém em bom funcionamento.

Temos receptores do tipo regenerativo, superregenerativo, reflex, neutrodinos, sincrodinos, de amplificação direta etc. O nosso receptor é do tipo "de amplificação direta", que é de razoável seletividade e sensibilidade, mas usa pouquíssimos componentes e é fácil de montar.

 

 

COMO FUNCIONA

 

Na figura 2 temos o diagrama de funções ou blocos correspondentes ao receptor.

A capacidade de separar de todos os sinais que são captados pela antena aquele que desejamos, quer dizer, a estação que queremos ouvir, depende do circuito de sintonia. Este circuito é formado por uma bobina e um capacitor.

 


 

 

 

Temos um circuito ressonante em que podemos ajustar a frequência através do capacitor. A faixa coberta, ou seja, as estações que vamos captar, depende do número de voltas que damos na bobina. Esta bobina é enrolada num bastão de ferrite, conforme mostra a figura 3.

 


 

 

 

Ferrite é um material magnético escuro, um aglomerado de óxido de ferro, que permite que as bobinas enroladas tenham grande indutância e funcionem como verdadeiras antenas. Para os circuitos sensíveis de radinhos comerciais com muitos transistores, somente a antena de ferrite é suficiente para captar as estações, mas, no nosso caso, precisaremos da ajuda de uma antena externa e de uma ligação à terra.

Esta antena pode ser desde um simples pedaço de fio esticado de 2 a 3 metros, mesmo encapado, que "interceptará" as ondas de rádio que chegam até sua casa, ou então um fio preso entre dois isolantes com comprimento de 5 a 40 metros, conforme mostra a figura 4.

 


 

 

 

A bobina pode ser enrolada com 80 a 100 voltas de fio -e a tomada entre a vigésima e a quadragésima volta determinará a seletividade do circuito. Se tivermos a tomada mais perto da ligação à terra, teremos maior seletividade e menor sensibilidade. Você escolhe o ponto em que fará a tomada.

Para enrolar este tipo de bobina podemos usar tanto fio comum fino de capa plástica como fio esmaltado, o que é mais indicado. A espessura do tipo esmaltado é dada por um número. Quanto maior o número, mais fino o fio. O fio 28 é o melhor para a bobina. Ele tem uma espessura de 0,32mm, o que quer dizer que 100 voltas juntas ocuparão um comprimento de aproximadamente 3,2cm.

O bastão de ferrite poderá ser aproveitado de algum radinho fora de uso ou comprado em casas de material eletrônico. Um bastão de 0,8 a 1 cm dê diâmetro e de 10 a 30cm de comprimento serve para nosso projeto. A ligação à terra é opcional. Podemos fazer esta ligação a qualquer objeto de metal em contato com o solo (chão), como por exemplo uma esquadria de janela, uma torneira ou mesmo um objeto de metal enterrado (figura 5).

 


 

 

 

Em alguns casos, simplesmente segurado este fio (o que não construí perigo) já faz com que nosso corpo sirva de terra e o rádio tenha seu rendimento aumentado.

O sinal selecionado pelo circuito de sintonia é de alta frequência, precisando ser detectado, ou seja, ter a informação correspondente ao som extraída. Para esta finalidade usamos um componente chamado diodo, que no nosso caso deve ser de germânio.

Este diodo pode ser do tipo 1N34 ou equivalente. Na loja basta pedir.um diodo de germânio, que consiste num pequeno componente com um cristal semicondutor no seu interior, capaz de retificar correntes de alta frequência.

Após o diodo já temos áudio, ou seja, uma corrente de baixa frequência que corresponde a sons. No entanto, esta corrente tem uma intensidade muito pequena, correspondendo praticamente à energia que foi interceptada pela antena, o que é insuficiente para alimentar um alto-falante e resultar em som audível.

O sinal de áudio precisa ser amplificado e para isso são usados três transistores formando um amplificador. Os transistores usados são de baixo custo e podem ser encontrados facilmente nas casas de componentes. No entanto podemos usar equivalentes como os BC237, BC238, BC239, BC547, BC549 etc. Observe na figura 6 que estes componentes possuem três terminais (emissor, base e coletor) cuja posição na ligação deve ser observada.

 


 

 

 

Outros transistores de uso geral NPN podem ser experimentados, mas será preciso verificar se a disposição dos terminais é a mesma no momento de fazer sua soldagem. Os resistores e capacitores que são ligados aos transistores têm funções importantes.

Os resistores polarizam o circuito, ou seja, aplicam aos transistores as correntes que eles precisam para funcionar. Os valores dos resistores são dados pelas faixas coloridas, segundo a ordem indicada na lista de material. Podemos inverter a ligação destes componentes (o que não acontece com transistores e diodos); podemos usar tipos de tamanhos diferentes, ou seja, de potências (watts) diferentes, mas as cores das faixas devem estar nas ordens pedidas na lista de material (figura 7).

 


 

 

 

Os capacitores são componentes que dão percurso ao sinal de áudio (som) de uma etapa e outra e seus valores não são críticos, mas os sugeridos na lista de material oferecem garantia de um bom funcionamento.

Um problema que os montadores menos experientes podem encontrar com os capacitores é a maneira como os valores são marcados. Assim, os capacitores de poliéster, cerâmica, styroflex, policarbonato e outros podem ter códigos "estranhos", mas que no fundo significam a mesma coisa.

Para um capacitor de 100nF, como o pedido, podemos encontrar marcações como 104 (10 seguido de 4 zeros, que resultam em 100 000 que, em nanofarads, é 100nF); 0,1 (que é 0,1 µF uma outra unidade) e até mesmo 100kpF. Como o circuito não é crítico, em caso de dúvida é só experimentar.

Finalmente temos o alto-falante, que pode ser de qualquer tamanho ou tipo. Instalado numa pequena caixinha acústica ele proporcionará melhor rendimento e maior volume. A fonte de alimentação é formada por quatro pilhas pequenas que terão boa durabilidade, mas será preciso instalá-las num suporte (que você pode adquirir nas casas especializadas) e que •possui polaridade dada pelas cores dos fios.

 

 

MONTAGEM

 

Sempre que damos qualquer projeto, a parte principal consiste no diagrama esquemático (esquema), onde as ligações e os componentes são representados pelos seus símbolos. Ao lado de cada símbolo temos o valor ou identificação dos componentes. É muito importante que você se acostume a montar, conferir e testar suas montagens a partir do diagrama. Na figura 8 temos o diagrama de nosso rádio.

 


 

 

 

Existem diversas técnicas para unirmos os componentes e fazermos as suas ligações de modo a obtermos o rádio propriamente dito. Uma delas é a "ponte de terminais". Estas pontes podem ser adquiridas em pedaços e cortadas de modo a ficarem com o número de terminais exigidos pelo projeto.

Os componentes são, então, soldados como mostra a figura 9.

 


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É claro que os componentes que não ficam firmes com a simples soldagem numa ponte devem ser fixados. As ligações entre os componentes são feitas com pedaços de fio rígido. Observe também que os terminais desencapados dos componentes que se cruzam não devem encostar uns nos outros. Numa montagem "limpa" os fios devem ser curtos e diretos.

Para a ligação da antena e terra usamos uma tomada ou um terminal plástico com parafuso, que ajuda a prender os fios. Outra possibilidade de montagem que permite ao conjunto ocupar menor espaço, e que em muitos casos é a única admitida, pois ligações curtas são importantes para os projetos de altas frequências, é a que faz uso de placa de circuito impresso.

Na figura 10 temos a versão em placa universal com padrão de matriz de contatos. Este tipo de placa pode ser comprado e eventualmente cortado no tamanho desejado. Ela vem com as trilhas já prontas e dotadas de acessos na forma de furos, onde são enfiados e depois soldados os terminais dos componentes, conforme mostra a mesma figura.

 


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As diversas ligações que formam o circuito são feitas com pedaços de fios comuns em comprimentos apropriados. Uma solda bem-feita é fundamental para o bom funcionamento do circuito.

 

 

INSTALAÇÃO E USO

 

Se na sua localidade existirem estações fortes, a antena pode ser um pedaço de fio jogado (encapado) de 2 a 5 metros. A ligação à terra pode ser feita em qualquer objeto de metal ou polo neutro da tomada de energia.

A alimentação da rede tem um dos fios ligado à terra, que justamente é chamado de "terra" ou "neutro". Este polo, por estar ligado à terra, não causa choques em quem o toca. Para identificá-lo podemos usar uma lâmpada neon, conforme mostra a figura 11.

 


 

 

 

Uma vez verificado qual e' o neutro, podemos ligar o "terra" de nosso rádio através de um capacitor de poliéster de 10nF. Se quisermos uma recepção melhor, podemos usar uma antena externa.

Feita a ligação da antena e terra, basta ligar o aparelho e ajustar a variável para melhor recepção. Não colocamos controle de volume, mas ele poderá ser acrescentado, conforme mostra a figura 12. Ele consiste num potenciômetro de 10k, comprado ou aproveitado de outros aparelhos fora de uso.

 


 

 

 

Caso seu rádio não funcione verifique:

a) se os fios esmaltados da bobina estão bem raspados nos pontos em que devem ser soldados.

b) se o diodo está ligado certo.

c) se os transistores estão ligados corretamente.

d) se não existem "soldas frias", malfeitas ou então espalhamento de solda.

e) se os componentes usados estão com os valores corretos.

Um teste simples de funcionamento da etapa amplificadora consiste em se retirar o diodo do circuito e tocar com o dedo na base de Q1. Se os transistores estiverem todos bons, assim como suas polarizações, deve haver um ronco no alto-falante. Se isso ocorrer então o problema está antes do diodo.