Estamos na era dos circuitos integrados que reúnem numa pequena pastilha de silício milhões de transistores. No entanto, muitos adeptos da eletrônica estão redescobrindo o componente que deu origem a tudo isso e que se julgava "enterrado" há muitos anos: a válvula. Equipamentos a válvula, principalmente de som, estão sendo fabricados e vendidos a custos elevados, colecionadores estão pagando fortunas por amplificadores e outros equipamentos valvulados dos anos 30 aos 50, ou mesmo reprojetados e muitos leitores procuram avidamente válvulas de reposição para equipamentos antigos. O que está acontecendo é o que veremos neste artigo.

A velha válvula termiônica ou simplesmente válvula está sendo redescoberta por muitos adeptos da eletrônica. Este componente, volumoso, consumidor de muita energia, frágil e até mesmo caro tem, no entanto, atrativos que agora estão sendo observados com muito mais respeito por muitos especialistas em eletrônica. Se você tem um velho rádio valvulado, relíquia de muito tempo, e que anda sendo chutado num canto úmido da oficina e até mesmo com a caixa quebrada, é hora de olhá-lo com mais respeito: ele pode ter muito mais valor do que você pensa! Mas, não é só recuperar aparelhos valvulados que pode ser um bom negócio para o leitor dos velhos tempos o que tenha habilidade para tanto. Equipamentos valvulados voltam a ser procurados em algumas partes do mundo pelas características que apresentam.

 

Os amplificadores valvulados

Nos anos 50 apareciam os amplificadores ultra-lineares valvulados. Eles consistiam no que de mais avançado havia em matéria de som de alta fidelidade. Com um circuito de saída com válvulas em push-pull e pesados transformadores com núcleos de materiais especiais eles forneciam o som mais puro que era possível obter naquela época.

Na figura 1 mostramos o aspecto de um desses amplificadores com destaque para os pesados transformadores drive e saída que, conforme a potência chegavam a pesar mais de 5 kg cada um!

 

Figura 1 -Amplificador valvulado de alta qualidade (e altíssimo preço também).
Figura 1 -Amplificador valvulado de alta qualidade (e altíssimo preço também).

 

A configuração básica era a mostrada na figura 2 em que se utilizavam duas válvulas pentodo em contrafase de modo que cada uma amplificava metade do ciclo do sinal de áudio.

 

Figura 2 - Circuito típico de saída em push-pull de um amplificador valvulado.
Figura 2 - Circuito típico de saída em push-pull de um amplificador valvulado.

 

O que chama a atenção nestes circuitos é que as válvulas possuem uma característica linear de amplificação diferentemente dos transistores comuns que possuem um trecho não linear no ponto em que começam a conduzir.

O resultado dessa linearidade maior da válvula é a reprodução de um som mais puro, livre praticamente da chamada distorção harmônica que ocorre nos circuitos transistorizados. Por mais elaborados que sejam os circuitos transistorizados, nunca se conseguiu eliminar completamente o problema da distorção causada por esta não linearidade dos transistores, e é em vista disso que surgiram os descontentes. De fato, até hoje existem pessoas que "não aceitam" o som transistorizado afirmando que o som mais puro é o produzido por amplificadores valvulados. Para atender estes adeptos do som ultra-linear valvulado, que já desapareceu na maioria dos países, ficaram alguns fabricantes hiper-sofisticados que investiram em melhorar a velha válvula para aplicá-la em amplificadores que, segundo os próprios fabricantes e usuários, são infinitamente melhores que os modernos transistorizados. Na figura 3 temos um estes amplificadores lineares cujo custo deixa qualquer um abismado!

 

Figura 3 - O amplificador da figura, da LAMM Industries custa a bagatela de 30 000 dólares!
Figura 3 - O amplificador da figura, da LAMM Industries custa a bagatela de 30 000 dólares!

 

Além de usarem pesadíssimos transformadores ultra-lineares que, sem dúvida alguma, impedem o uso portátil deste equipamento, as próprias v lvulas usam uma tecnologia fantástica que nada lembra aos velhos rádios e amplificadores (vitrolas) dos anos 50 e 60. As válvulas para redução do nível de ruído e melhora de suas características elétricas possuem eletrodos internos folheados a ouro! Não é preciso dizer que se trata da velha tecnologia trazida para nossos tempos. Os adeptos deste som valvulado dizem que sua pureza nunca poder ser conseguida por qualquer equipamento transistorizado por mais caro ou sofisticado que seja. Os circuitos em muitos casos chegam a ser híbridos com etapas de excitação, onde a influência da não linearidade do transistor pode ser evitada, transistorizados ou mesmo integrados e apenas as etapas de saída valvuladas. Na figura 5 temos um desses circuitos.

 

Figura 4 - Diagrama completo de um amplificador valvulado.
Figura 4 - Diagrama completo de um amplificador valvulado.

 

É claro que a montagem hoje de um circuito deste tipo esbarra em alguns problemas como: onde conseguir os transformadores (deve haver alguém que saiba enrolá-los), ou ainda como fazer o chassi de metal para a montagem. Para as válvulas não existe muito problema pois muitas delas ainda existem para reposição em televisores que ainda as utilizam e mesmo alguns fornecedores.

 

Recuperação de rádios

Outro campo interessante de atividades que começa a ser descoberto por técnicos e amadores da eletrônica é a recuperação de equipamentos antigos, principalmente rádios. Casas de fazenda, de campo e mesmo residências em estilo antigo mantém mobiliário da mesma época recuperado com cuidado e não raro adquirido a preço elevado. Da mesma forma que o mobiliário a presença de um rádio antigo, quer seja do tipo "capelinha" ou mais moderno é fundamental para acompanhar a decoração. Rádios dos anos 30, 40 ou mesmo 50 usando válvulas podem ser encontrados abandonados em muitos locais e a colocação de um equipamento destes em funcionamento pode significar muito dinheiro para quem conseguir. Na figura 5 mostramos um destes rádios.

 

Figura 5 -Tradicional rádio tipo
Figura 5 -Tradicional rádio tipo "capelinha" dos anos 1930.

 

Um rádio antigo funcionando, vendido como objeto de decoração, antiguidade ou mesmo pintado com cores exóticas para uma decoração diferente pode render muito dinheiro ao técnico caprichoso. De fato, o preço do rádio não será o preço de sucata, mas sim o preço da raridade, e isso pode significar muito mais do que o de um rádio equivalente moderno. A sensibilidade do técnico ou do amador em descobrir um rádio destes fora de uso e saber a quem oferecer é importante para se ter êxito no negócio. Nos grandes centros, como São Paulo e Rio existem casas de antiguidades que certamente se interessariam por equipamentos deste tipo funcionando. O interessante desses rádios é que a recuperação às vezes pode ser simples, como a simples troca de uma válvula. Os circuitos são simples, e os componentes diferentes das válvulas, especificamente os resistores e capacitores admitem equivalentes modernos. Por exemplo, qualquer capacitor de óleo ou papel de um rádio antigo pode ser substituído por um de poliéster metalizado de mesma tensão de trabalho. Na figura 6 mostramos o aspecto destes capacitores.

 

Figura 6 -  Capacitor a óleo de um amplificador antigo.
Figura 6 - Capacitor a óleo de um amplificador antigo.

 

Na recuperação o técnico deve apenas prestar atenção para a possibilidade de existirem peças danificadas mais difíceis de obter ou reparar como, por exemplo, as placas amassadas de um capacitor variável de sintonia. Capacitores duplos e até triplos, como o mostrado na figura 7 podem ser encontrados nestes rádios.

 

Figura 7 - Capacitor variável de três seções de rádio antigo
Figura 7 - Capacitor variável de três seções de rádio antigo

 

Batidas fortes ou mesmo quedas podem entortar as placas de metal forma que as placas do conjunto móvel passam a encostar nas placas do conjunto fixo quando o eixo de sintonia é girado. Isso não pode ocorrer. Em alguns casos um simples ajuste do parafuso do eixo pode levar o conjunto a um funcionamento perfeito girando sem encostar, mas se as placas estiverem tortas o problema é mais grave.

Com sorte o técnico muito habilidoso pode desentortar uma ou outra dessas placas, mas para o conjunto todo é mais fácil tentar encontrar um variável em bom estado num outro rádio antigo abandonado. Para a ferrugem do chassi uma boa lixada e depois envernizamento pode ajudar a dar uma aparência nova e para a caixa de madeira, o tratamento com verniz pode dar um aspecto de novo a um aparelho abandonado há muito tempo.

A calibração do circuito é feita da mesma forma que os receptores transistorizados convencionais já que o circuito é equivalente. A única diferença na maioria dos tipos está no fato de que em cada etapa temos uma válvula em lugar do transistor e que o transformador de FI e bobinas são de maior porte.

Também pode ocorrer de encontrarmos freqüências de FI diferentes de 455 kHz, como é comum nos rádios AM modernos. Valores como 815 kHz, 560 kHz não são raros. Voltaremos oportunamente a dar dicas de recuperação de aparelhos valvulados nas páginas desta revista, inclusive como fazer a calibração que exige mais cuidado.

 

Como obter peças

Muitas casas de material de eletrônico e mesmo oficinas possuem em seus estoques de peças de reposição componentes de rádios antios incluindo as válvulas. Destacamos neste caso a Eletrônica Rei do Som de São Paulo que inclusive vende pelo correio (www.reidosom.com.br). Assim, a obtenção de componentes nem sempre é tão difícil e até tem uma vantagem em relação aos equipamentos modernos. Se hoje quebrar um rádio de determinada marca que o leitor tenha e a causa seja um circuito integrado, o leitor certamente terá dificuldades, pois o circuito integrado usado pode ser de um tipo especifico que só serve para aquele modelo de rádio daquela marca.

A probabilidade de encontrar tal componente em qualquer loja é muito pequena. Por outro lado, se queimar num rádio antigo uma válvula, por exemplo, 6AQ5 ou 6C4, a possibilidade de encontrá-la, mesmo hoje, é grande, pois esta válvula além de ser usada em uma grande quantidade de tipos e marcas de rádios antigos, também é encontrada em televisores e amplificadores de toca-discos dos anos 50, 60 e até alguns modelos dos anos 70.

Enfim, nos tempos antigos poucos tipos de válvulas eram usadas para muitos tipos de equipamentos. Hoje temos tantos componentes diferentes quantos são os equipamentos.