O sucesso da montagem da parte eletrônica de um projeto de mecatrônica não depende somente de se usar os componentes corretos, fazer uma placa de circuito impresso sem defeitos e de se obedecer a todas as recomendações de ajustes e procedimentos dados pelo projetista. Tão importante quanto tudo o que dissémos é a soldagem bem feita. Quantos projetos não são comprometidos por uma soldagem mal feita ou indevida? Se o leitor ainda não faz uma soldagem boa, ou está pretendendo começar agora a fazer suas montagens, as orientações que daremos neste artigo são de vital importância.
Este artigo foi preparado especialmente para estudantes e iniciantes que desejam fazer montagens simples mecatrônicas. Um segundo artigo mais avançado (ART179) é indicado para os que desejam ir além.
Todos sabem que as montagens eletrônicas exigem o emprego da solda e que esta solda é feita com um ferro aquecido especial.
No entanto, nem todos avaliam a importância que tem a soldagem bem feita no bom funcionamento de qualquer aparelho.
A observação de montagens com soldas em excesso, soldas "frias", soldas irregulares e outras, conforme mostra a figura 1, nos leva a afirmar que 50% das causas de insucesso no funcionamento são devidas justamente a incapacidade do montador em fazer esta simples operação de soldagem.
Como obter uma solda bem feita? Não ‚ muito difícil, conforme veremos a seguir.
A FINALIDADE DA SOLDA
A solda tem duas funções num aparelho eletrônico: ao mesmo tempo ela segura firmemente em posição de funcionamento, pelos terminais, principalmente os componentes pequenos e proporciona a conexão elétrica deste componente com o restante do circuito.
Isso significa que a função da solda é tanto elétrica como mecânica.
Os componentes pequenos como resistores, capacitores e diodos aproveitam as duas funções da solda, já que ela deve ao mesmo tempo sustentar o peso da peça e proporcionar caminho para a corrente que deve circular por ela.
No caso de transformadores e outros componentes pesados, a solda tem maior função elétrica, pois ela apenas proporciona caminho para a corrente desses componentes através de seus terminais. A função mecânica, neste caso é apenas de prender o terminal e não o componente.
Outras Funções da Solda
Existe uma terceira função importante da solda que é observada em alguns casos. Existem componentes que se aquecem e que o calor que desenvolvem precisa ser dissipado rapidamente para que eles não se queimem. Pois bem, estes componentes podem usar a solda para transferir o calor gerado no seu interior e que passa pelos seus terminais para uma região cobreada da placa que funciona como radiador. Uma solda mal feita, neste caso pode prejudicar não só funcionamento elétrico do componente como sua própria refrigeração.
A SOLDA
Como a finalidade da solda é dupla (e em alguns casos tripla), ela deve ser feita de um material que tenha propriedades condizentes com o que se deseja dela.
Assim, como os componentes eletrônicos que devem ser sustentados são leves, ela não precisa ser extremamente resistente a esforços mecânicos. Por outro lado, ela deve apresentar uma resistência elétrica suficientemente baixa para proporcionar um percurso à corrente elétrica sem problemas.
O material deve ainda se fundir a uma temperatura suficientemente baixa para permitir sua utilização fácil com um soldador pequeno.
Nos trabalhos de eletrônica, utiliza-se uma liga de chumbo com estanho que tem as características mostradas na figura 3.
Conforme podemos ver pelo gráfico, a temperatura em que essa mistura ou "liga" se funde depende da proporção em que os dois metais são misturados.
A proporção próxima de 60 partes de estanho para 40 de chumbo é a mais usada, porque ela permite obter uma mistura "eutética".
Isso significa que com esta proporção, a liga passa praticamente do estado sólido para o líquido sem encontrar o estado intermediário pastoso que não é muito conveniente. Além disso, é neste ponto da sua característica de temperatura que ela tem o menor ponto de fusão.
A solda usada nos trabalhos de eletrônica consiste portanto numa liga de estanho com chumbo que, dependendo do tipo de trabalho a ser realizado, está na proporção de 60/40 ou próximo disso.
Para facilitar os trabalhos de soldagem, esta solda é fornecida basicamente em fios que contém em seu interior uma resina limpadora que ajuda na aderência da solda. Rolos, cartelinhas e mesmo tubinhos podem ser adquiridos contendo esta solda, conforme mostra a figura 4.
Em alguns casos, este tipo de solda pode ser adquirido em barras, como por exemplo para serem usados em banhos de solda, quando maior quantidade é derretida num cadinho. Esta solda em barra, entretanto, é mais usada em processos industriais de soldagem em massa.
Para nós que vamos fazer pequenas montagens, serviços de reparos, a melhor solda ‚ a que vem em fios de 0,8 a 1,2 mm de espessura e com propoção de estanho e chumbo de 60/40. Esta solda é popularmente chamada de 60 por 40 ou simplesmente "solda para rádio" ou "solda para transistores".
O SOLDADOR
Para derreter a solda no local em que deve ser feita a junção do terminal de um componente com outro componente ou com uma placa de circuito impresso é preciso aplicar calor. Isso é conseguido por meio de uma ferramenta elétrica chamada ferro de soldar ou soldador.
O tipo mais comum de soldador tem um dos aspectos mostrados na figura 5.
Esses soldador podem aplicar mais ou menos calor num determinado local dependendo de sua potência que é medida em watts (W).
No entanto, o melhor soldador não é o mais potente, pois se for aplicado muito calor no local de uma soldagem esse calor pode se propagar até o componente e danificá-lo. A maioria dos componentes resiste a um processo de aquecimento numa soldagem rápida, mas se muito calor for aplicado durante muito tempo ao componente ele pode ser danificado.
Na figura 6 mostramos como podemos segurar com um alicate um componente sensível ao fazer a soldagem de modo a evitar que o calor se propague.
O melhor mesmo, entretanto, é ter um ferro apropriado com potência de acordo com o trabalho que fazemos e ter a capacidade de soldar rápido para não aplicar calor em excesso ao local.
Para os trabalhos de montagens com transistores e circuitos integrados um soldador de 20 a 30 watts é o mais recomendado. Se vamos soldar fios mais grossos ou terminais maiores ser interessante ter um segundo soldador para isso de 40 a 60 watts.
Os soldadores comuns demoram algum tempo para atingir a temperatura normal de funcionamento, o que pode ser incômodo para determinados tipos de trabalho.
Um tipo de soldador de aquecimento instantâneo é a pistola de soldar que é mostrada na figura 7.
Não confundir com os tipos com resistência comum e ponta como a de ferro, que somente tem o formato de pistola - veja a como é a ponta deste tipo de soldador.
Quando apertamos o gatilho uma forte corrente é induzida no elemento da ponta da pistola, aquecendo instantaneamente.
Apesar de ser eficiente, a pistola tem alguns inconvenientes: o primeiro refere-se ao fato da ponta ser percorrida por uma corrente que pode ser perigosa para determinados tipos de componentes. Assim, somente os profissionais com bom conhecimento do seu trabalho é que devem usar esta ferramenta para poder saber que componentes podem ser soldados com ela.
Os formatos das pontas dos ferros também variam, mas para os casos mais comuns as pontas retas e as curvas são as mais usadas.
Dessoldagem:
Tão importantes como as ferramentas de soldagem são as de dessoldagem. Pode ser necessário num mom ento que uma solda precise ser desfeita. Para isso existem sugadores que sugam a solda derretida do terminal de um componente e ainda fitas de materiais que "absorvem" a solda dos terminais de um componente quando ela é derretida, para que ele possa ser retirado com facilidade.
COMO SOLDAR
De posse de um soldador e tendo solda disponível será interessante que o leitor saiba como soldar, pratique um pouco antes de conseguir a soldagem perfeita e somente depois parta para as montagens de aparelhos.
Uma forma interessante de praticar é retirando componentes de algum aparelho velho e depois soldando-os numa ponte de terminais ou numa placa qualquer de circuito impresso, conforme mostra a figura 8.
Os procedimentos para se fazer uma solda perfeita são os seguintes:
PREPARAÇÃO DO SOLDADOR
a) Aqueça bem o soldador deixando-o ligado por pelo menos 10 minutos.
b) Se o soldador for novo, sua ponta deve ser bem limpa de modo que o metal brilhante apareça. Uma lima ou lixa, servem para esta finalidade.
c) Estanhe a ponta do soldador. Se ela não estiver "molhada" com solda, o que ocorre num soldador que já foi usado, quando o soldador estiver quente encoste um pouco de solda de modo que ela se funda. Essa solda vai "molhar" ou "estanhar" a ponta do ferro no local de uso, formando uma região brilhante de metal fundido, conforme mostra a figura 9.
A SOLDA
a) Se os terminais de componentes, fios ou locais de soldagem estiverem sujos ou oxidados ‚ preciso limpá-los para que a solda possa aderir.
Para isso use uma lâmina afiada (canivete, por exemplo), uma lixa fina ou mesmo uma lima. Remova toda a sujeira deixando aparecer o metal brilhante no local em que deve ser feita a soldagem.
b) Aqueça o local em que deve ser feita a soldagem, encostando a ponta do soldador no local e imediatamente encoste a solda nos terminais ou nos locais de solda (não encoste na ponta do ferro). Se o local estiver aquecido a solda derrete e envolve os componente que devem ser soldados, conforme mostra a figura 10.
Evite usar fluidos ou cidos, pois os vapores gerados por essas substâncias podem atacar o próprio terminal do componente e outros componentes do aparelho causando corrosão. A solda será melhor, mas a vida útil da conexão ficará comprometida pela corrosão que pode ter início no momento da soldagem.
c) Derretendo quantidade suficiente de solda para envolver os elementos que devem ser soldados, afaste o soldador, mantendo as peças firmes em sua posição até que a solda esfrie. Para endurecer completamente, o tempo necessário deve ser da ordem de 5 a 10 segundos dependendo do tamanho da junção.
A junção perfeita deve ficar lisa, brilhante e envolver todo o local de junção dos componentes,
d) Se o local não for aquecido suficientemente, a solda pode "empedrar" dando origem a maus contactos, ou seja, o componente não tem a aderência da solda e acaba por ficar solto.
Uma solda deste tipo é denominada popularmente de "solda fria" e deve ser evitada de qualquer maneira.
Também devem ser evitados espalhamentos de solda que possam provocar curto-circuitos entre os terminais de componentes ou trilhas de uma placa de circuito impresso,
e) Feita a soldagem de todos os componentes de uma montagem, pode-se proteger a placa de circuito impresso com uma camada de verniz incolor.
Para outros tipos de montagens eou reparação é conveniente verificar se os componentes soldados estão ralmente firmes, se não houve "pingamento" de solda capaz de provocar curtos em outros componentes do aparelho.
Se tudo estiver bem feito, o leitor terá garantido um bom funcionamento de seu aparelho, no que depender de soldagem.
Pratex
Uma outra forma de se dar um bom acabamento a uma placa protegendo-a contra a corrosão é aplicando Pratex. Trata-se de uma solução de iodeto de prata que pincelada na parte cobreada reage liberando uma finíssima camada de prata que se deposita. A prata sofre menor ação do ar (oxigênio) e por isso protege a placa contra a corrosão dando-lhe um aspecto prateado.
RECOMENDAÇÕES FINAIS
Uma boa soldagem não se consegue na primeira tentativa. Se o leitor é iniciante e nunca usou um soldador, antes de fazer suas montagens ou trabalhos de reparos deve praticar. Tente obter soldagens perfeitas com componentes aproveitados de velhos aparelhos.
Somente depois que conseguir uma boa soldagem, passe para a montagens de aparelhos.
O que Soldar
A solda não "pega" em qualquer metal. Assim a solda de estanho/chumbo usada em trabalhos eletrônicos é utilizada para fazer conexões principalmente em peças de cobre ou cobre que tenha sido previamente estanhado. Metais como ferro, alumínio e outros não "aceitam" essa solda e nenhum componente pode ser soldado neles.