As fontes chaveadas são usadas na grande maioria dos aparelhos eletrônicos modernos devido à sua maior eficiência, baixo custo, tamanho reduzido, peso reduzido, proteção contra curto-circuito, entre outras vantagens. Até aí tudo bem, nenhuma novidade. A surpresa aqui é apenas o fato de que propomos a construção de uma fonte dessas usando um Cl que aparentemente não serviria para esta finalidade, o velho e conhecido 555.

 

Nota: Artigo publicado na revista Eletrônica Total 140 de 2010.

Isso mesmo, que tal parar de aplicar o 555 apenas em osciladores e partir para a construção de projetos mais sérios, dando a ele mais responsabilidade? É o que propomos. Antes de ir diretamente ao projeto vamos fazer um pequeno resumo sobre o funcionamento das fontes chaveadas em geral, para facilitar o entendimento.

Observe na figura 1 o esquema simplificado de uma típica fonte chaveada. Sem entrarmos em detalhes sobre a topologia, rendimento, nem definições demasiadamente técnicas, passemos à análise do seu funcionamento básico.

 


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A tensão alterada da rede de energia é retificada pelo diodo D1 e filtrada pelo capacitor C1, produzindo neste ponto uma tensão contínua de aproximadamente 160 V1 considerando uma tensão de entrada de aproximadamente 127 Vca. O controlador PWM gera pulsos para fazer a comutação do transistor Q1, que por sua vez alimenta o enrolamento primário do transformador T1.

Uma vez que o transformador é alimentado com uma tensão contínua pulsada, é induzida em seu secundário uma tensão que é retificada pelo diodo D2 e filtrada pelo capacitor C2. Esta já é a tensão de saída da fonte, a qual ainda não está regulada. O circuito PWM possui um oscilador com frequência fixa, mas com ciclo de trabalho variável, podendo fazer o transistor conduzir mais ou menos potência, entretanto, inicia com um ciclo de trabalho baixo e aos poucos vai aumentando, enquanto recebe uma amostra da tensão de saída através de um acoplador ótico. A partir da amostra da tensão de saída que recebe, aumenta ou diminui o ciclo ativo de chaveamento, fazendo o transistor conduzir mais ou menos. Se a tensão de saída estiver baixa, aumenta o ciclo de trabalho, se estiver alta diminui, fazendo assim a regulagem.

O transformador T1 faz o rebaixamento de tensão e também o isolamento galvânico entre a rede de energia e a tensão de saída da fonte, e a amostra da tensão de saída é passada ao controlador PWM através de um acoplador ótico para que não haja contato físico entre estas partes, garantindo o isolamento.

O controlador PWM é um circuito integrado dedicado para uso em fontes chaveadas, dentre os quais podemos citar como os mais populares os Cls TL494, UC3842, SG3525, KA7500, entre outros. No nosso caso, preferimos adaptar um CI 555 para esta finalidade. Obtemos um circuito simples e de fácil montagem, tornando as fontes chaveadas acessíveis a qualquer estudante ou hobista com mínimos conhecimentos de eletrônica, desmistificando um circuito que para muitos técnicos em reparação é visto como um "Bicho Papão".

 


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O Circuito

 

Agora passemos à análise do nosso circuito, que é mostrado na figura 2. Trata-se de uma fonte com entrada de 127 Vca e saída de 12 V x 500 mA.

Nosso esquema está dividido em dois blocos. O primeiro, à esquerda do desenho, faz a retificação e filtragem da tensão alternada da rede de energia e fornece 160 Vcc para alimentar o chaveamento de potência, e fornece também uma tensão rebaixada de 18 V para alimentar o nosso controlador PWM.

Para quem já usou o CI 555 como oscilador, de início reconhece que ele justamente está ligado na configuração de oscilador astável. Para quem ainda não o conhece, informamos que esta é a forma mais usual de funcionamento deste Cl. A novidade aqui é que usamos o pino 5 (Controle) para controlar o ciclo de trabalho deste oscilador.

Este controle não é perfeito como em um típico CI PWM, mas serve perfeita- mente para a aplicação proposta. Digo que não é perfeito porque além de alterar o ciclo ativo, altera também a frequência do oscilador, mas que no nosso caso, acaba ajudando no trabalho de controlar a condução do transistor e por conseguinte, atingindo o objetivo final.

 


 

 

 

Explicando melhor: quando a alimentação é ligada, o 555 recebe a alimentação de 18 V entre os pinos 1 e 8, iniciando a oscilação numa frequência aproximada de 40 kHz e com ciclo ativo de aproximadamente 45%, fazendo então o transistor conduzir. A tensão no pino 5 neste momento é de 2/3 da tensão de alimentação (aproximadamente 10 V). Com isso já aparece uma tensão no secundário do transformador, que faz com que o acoplador ótico passe a conduzir, aterrando assim o pino 5 do Cl, fazendo a tensão neste ponto cair.

A queda da tensão que ali estava faz com que o ciclo de trabalho diminua e a frequência aumente, provocando desta forma duas consequências: uma sobre o transistor, que com menor ciclo de trabalho conduz menos potência para o transformador e outra sobre o próprio transformador, que é forçado a trabalhar numa frequência mais alta do que a que foi projetado para trabalhar, perdendo rendimento. Desta forma a tensão no secundário é equilibrada.

Afora isso, temos apenas os trimpots P1, que ajusta a frequência do oscilador e P2 que ajusta o nível de realimentação, que servirão para pequenos ajustes, e que não são críticos.

 

 

Os Ferrites ao alcance de todos

 

Quando se fala em fonte chaveada, a primeira coisa que vem à mente é o transformador de ferrite usado na sua construção, que sempre é um componente exótico, de difícil obtenção. Logo, se precisarmos reparar uma fonte destas e por uma infelicidade o transformador estiver danificado, o que, aliás é uma raridade, imediatamente pensamos em condenar o aparelho, pois não se encontrará o mesmo para reposição. E não é somente isso, se encontramos por aí um projeto de fonte chaveada para montagem, frequentemente esbarramos no problema da construção do dito trans- formador. Por falta de projetos simples de fontes chaveadas e de literatura básica a respeito, formou-se uma caixa preta em volta deste tipo de projeto, pois envolve cálculos complexos e cuidados especiais para a montagem da fonte e em especial do transformador.

O que procuramos fazer aqui é um circuito bastante didático e flexível para que qualquer leitor consiga montar. Para isso a primeira preocupação foi a de que o transformador não fosse crítico, aceitando uma certa variação na sua construção, podendo o circuito se adaptar a alguma imperfeição no seu enrolamento. Deixamos os dois trimpots, P1 e P2, para pequenos ajustes. P1 ajusta a frequência de modo a conseguir o melhor rendimento do transformador e P, ajusta o nível de realimentação, e ambos alteram ligeiramente a tensão de saída.

 

 

O Transformador

 

O transformador de ferrite escolhido para o nosso protótipo foi um pequeno transformador que se pode encontrar em qualquer fonte de PC da sucata. Observe que uma fonte de PC possui normalmente três transformadores de ferrite: um grande e dois pequenos. Usamos qualquer um dos dois pequenos, que são mais ou menos do mesmo tamanho (aproximadamente 19 mm x 16 mm x 16 mm).

Precisamos desmontá-lo e refazer o enrolamento. Para desmontá-lo, proceda da seguinte forma:

1) Retire a fita adesiva que envolve o ferrite;

2) Ponha-o em uma pequena panela de alumínio com um pouco de água, apenas o suficiente para cobri-lo e leve ao fogo por 5 minutos; 3) Tire-o da panela com a ajuda de dois alicates de bico e desencaixe as duas peças de ferrite em for- ma de E, enquanto ainda estiver quente;

4) Espere esfriar e faça a retirada do enrolamento e proceda ao novo enrolamento.

 

 

O Enrolamento do Transformador

 

O enrolamento é simples, conforme mostra a figura 3. Usaremos apenas dois enrolamentos feitos com fio esmaltado na bitola 30AWG, 140 espiras no primário e 12 espiras no secundário. Pois queremos uma tensão um pouco maior que 12 V no secundário, com uma tensão de entrada de 127 V. Observe os detalhes da construção:

1) O secundário é feito com 4 pernas do mesmo fio;

2) Deve-se enrolar primeiramente 70 espiras do primário e cobrir com um pedaço de fita durex para isolar;

3) Em seguida enrolar as 12 espiras do secundário, fazendo também isolamento com fita;

4) Por último enrolar mais 70 espiras do secundário.

É claro que, se você preferir simples- mente enrolar 140 espiras do fio 30AWG ou uma bitola próxima, e em seguida enrolar as 12 espiras de um fio mais grosso para fazer o secundário, também irá funcionar. A diferença é apenas que o enrolamento feito da forma descrita anteriormente terá melhor rendimento. Você pode até enrolar com o mesmo fio original do transformador desmontado, desde que tenha a bitola aproximada.

 

 

A Montagem

 

Damos a sugestão da placa de circuito impresso na figura 4. Todos os resistores são de 1/4 W ou 1/8 W, exceto o resistor de 12 kΩ, que deve ser de 3 W a 5 W. Não se esqueça que existe um jumper para ser ligado embaixo do CI, entre o pino 4 e o pino 8, antes de soldá-lo na placa.

Como se trata de circuito de alta frequência, o capacitor eletrolítico da saída de 470 µF deve ser de baixas perdas, apropriado para altas frequências, e pode ser reutilizado de uma fonte de PC. Um capacitor impróprio deve funcionar, mas apresentará aquecimento e poderá se danificar. O resistor de 2,2 ohms na entrada de 127 V não pode ser dispensado, pois funciona como fusível para o caso de algum curto-circuito.

O transistor de potência é um MOSFET, não podendo ser usado transistor bipolar. Usamos o 2SK2043 devido ao baixo custo e facilidade de aquisição, mas qualquer MOSFET com tensão de trabalho a partir de 200 V e corrente de 2 A ou mais pode ser usado, como IRF640, IRF740, entre outros.

Após a soldagem de todos os componentes faça uma última conferência de tudo, e só ligue na tomada usando uma lâmpada de série. Esta lâmpada pode ser qualquer lâmpada incandescente de 40 W a 60 W, simplesmente ligada entre um dos fios de entrada da fonte e a tomada de energia.

 


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Antes de ligar proceda da seguinte forma:

1) Gire o trimpot P2 todo para o lado do terra e P1 todo para o lado do positivo da saída;

2) Ligue uma carga na saída, de preferência uma lâmpada de 12 V X 5 W, do tipo que se usa em pisca-pisca de moto ou um resistor de 33 Ω x 10 W;

3) Faça a medida de tensão entre os pinos 1 e 8 do 555, que deve estar entre 12 V e 18 V;

4) Ligue um multímetro na saída ajustado para a escala de até 200 Vcc.

Ajuste os trimpots de modo a obter uma tensão próxima a 12 V, observando apenas que P1 deve estar entre o meio e o lado do positivo da saída de 12 V, para melhor funcionamento.

 

 

Conclusão

Esta fonte pode ser usada para diversas finalidades onde se exija uma fonte regulada, tais como carregadores de baterias e alimentação de aparelhos com consumo até 500 mA, e se você se aprofundar um pouco mais no assunto poderá até fazer alterações para aumentar a potência. O limite é determinado pelo seu esforço, nosso trabalho aqui é apenas abrir a sua mente para ideias simples. Até breve!

 

 

 

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