Não se trata somente do menor rádio do mundo, mas também do rádio mais simples, pois usa apenas 5 componentes mais o fone e o que é mais importante: não usa pilhas ou qualquer outro tipo de fonte de energia! Os leitores que ainda não têm ideia do que possa ser um receptor de cristal devem estar curiosos em saber como a ciência moderna conseguiu este milagre.

Nota: O artigo é da Revista Saber Eletrônica 82 de junho de 1979.

 

Na realidade, os rádios de cristal tão pequenos como uma caixa de fósforos não são "milagres" da era do transistor e do circuito integrado, mas sim brinquedos da época de nossos avós quando a ciência eletrônica ainda estava engatinhando e que, portanto, os aparelhos eram muito mais simples que agora.

O que descrevemos neste artigo é um rádio de cristal, uma versão moderna de um rádio de galena que por ser extremamente simples pode ser alojada numa caixa de fósforos.

O leitor que montar seu rádio numa caixa de fósforos poderá sem dúvida alguma impressionar seus amigos que não estejam familiarizados com este tipo de aparelho.

Para colocar o aparelho em funcionamento é tudo igualmente simples: basta fazer a ligação a uma boa antena e à terra e as estações locais poderão ser ouvidas. Mas, não se assuste com a antena e a terra que falamos: se as estações de sua localidade forem fortes a terra poderá ser o encanamento de água ou mesmo o polo neutro da tomada, e a antena poderá ser qualquer estrutura metálica próxima como um arame de pendurar roupas, um fio esticado e até mesmo a armação de uma janela.

Para os principiantes, a montagem deste simples radinho além de econômica pode ser considerada bastante interessante pelo que fornece em matéria de resultados práticos.

 

COMO FUNCIONA

As estações de rádio são responsáveis pela emissão de ondas eletromagnéticas de determinada frequência as quais são "moduladas" pelo sinal de áudio, ou seja, pelo som que devem transportar. A modulação pode ser feita pelo sinal de um microfone ou de um toca-discos que é então amplificado e levado ao transmissor (figura 1).

 

Figura 1
Figura 1

 

 

Para que possamos ouvir novamente esses sinais correspondentes ao som precisamos de um receptor que é um aparelho que pode captar os sinais das estações desejadas, separando-os dos sinais das, outras estações e depois separar o sinal modulador do sinal captado para que possamos ouvir o som que "transporta", num fone ou alto-falante.

Assim, basicamente os receptores são constituídos na sua forma mais simples dos seguintes circuitos:

a) antena que é responsável pela intercepção das ondas eletromagnéticas das estações que podem ser ouvidas.

b) circuito de sintonia que permite que separemos de todos os sinais interceptados o sinal da estação que desejamos ouvir.

c) detector é o circuito que separa o sinal modulador, ou seja, o "som", do sinal de alta frequência que o transporta.

d) transdutor que é o elemento que transforma este sinal modulador que é de baixa frequência em som para que possamos ouvi-1o. Na figura 2 temos a representação da estrutura de um receptor simples.

No nosso caso, cada uma destas etapas do rádio é simplificada ao máximo de modo que obtemos um conjunto tão pequeno que cabe numa caixa de fósforos.

Analisemos então como podemos fazer tudo isto para receber as estações da maneira mais simples possível, ou seja, como podemos fazer o mais simples de todos os receptores de rádio.

 

Figura 2
Figura 2

 

 

Começamos pela antena:

A antena deve interceptar a maior quantidade possível de "ondas" da estação pelo que o rendimento do rádio está condicionado não somente à potência e a proximidade da estação como também ao tamanho da mesma.

No nosso caso a antena será um fio estendido e quanto maior ele for maior será a quantidade de energia que pode ser obtida das ondas eletromagnéticas que o interceptam e, portanto, maior o volume para o som ouvido.

O circuito seguinte é o circuito de sintonia que tem por função separar de todos os sinais que chegam à antena o que corresponde à estação que desejamos ouvir.

Este circuito de sintonia é formado por um capacitor e uma bobina que são ligados em paralelo formando o que chamamos de "circuito ressonante". Em função da indutância da bobina, ou seja, do número de voltas e das suas dimensões, e da capacitância do capacitor o circuito assim formado tem a propriedade de "responder" somente a uma única frequência que é a chamada frequência de ressonância (figura 3).

 

Figura 3
Figura 3

 

 

O sinal correspondente à frequência de ressonância é então levado às etapas seguintes do circuito, enquanto os demais são desviados para à terra onde se perdem.

Como queremos controlar o nosso rádio de modo a escolher a estação a ser ouvida, fazemos um circuito ressonante ajustável. Isso é conseguido por meio de um núcleo móvel para a bobina que altera a sua indutância. Movendo então um bastão de ferrite no interior da bobina modificamos a ação do circuito de sintonia no sentido de selecionarmos as estações que queremos ouvir.

Tanto a bobina como o capacitor usados no nosso projeto são componentes de dimensões reduzidas.

A etapa seguinte a ser analisada é a etapa detetora cuja função é separar o sinal de áudio do sinal de RF da estação sintonizada. A etapa detetora usa um único componente como elemento básico: um diodo de germânio de baixo custo. Este componente tem a propriedade de conduzir a corrente elétrica num único sentido o que quer dizer que se fizermos passar por ele o sinal de alta frequência da estação sintonizada este sinal será "retificado" podendo então ser feita facilmente a extração de sua "envolvente" que corresponde à modulação, conforme mostra a figura 4. Um capacitor ligado logo após o diodo permite que os sinais de RF agora indesejáveis, ou seja, os sinais de alta frequência da estação, sejam desviados para a terra aparecendo na saída do circuito somente o sinal de áudio, ou seja, o som.

 

Figura 4
Figura 4

 

 

O dispositivo final de nossa cadeia é o transdutor que transforma os sinais de baixa frequência correspondente à modulação em som. Trata-se de um fone de cristal, um fone de alta impedância que por sua sensibilidade serve perfeitamente para o nível de sinal que é obtido num rádio em que a única energia disponível é a interceptada pela antena.

Um resistor é ligado em paralelo com o fone de cristal para oferecer ao circuito a carga que ele precisa para funcionar normalmente.

 

MONTAGEM

A caixa para a instalação do circuito é o que oferece menos dificuldade de obtenção: se houver problema para isso basta chegar ao bar mais próximo e adquirir uma caixa de fósforos.

Como se trata de uma montagem de reduzidas dimensões e em que todos os componentes são delicados recomendamos o máximo de cuidado nas operações de soldagem e fixação dos mesmos.

Na figura 5 temos o circuito completo do rádio. Na figura 6 é mostrada a montagem do rádio completo na caixa de fósforos.

 

Figura 5
Figura 5

 

 

A soldagem dos componentes é feita numa pequena ponte de terminais devendo ser observados alguns pontos importantes tanto em relação aos tipos usados e ao seu manuseio.

Comece pela bobina que é componente mais importante do rádio: se a bobina for utilizada de modo errado ou então feita sem cuidado a sensibilidade do receptor ficará enormemente afetada e nada poderá ser ouvido.

O leitor tem duas possibilidades para a bobina: a primeira é usar uma bobina comercial para a faixa de ondas médias com núcleo de ferrite chato, conforme mostra a figura 7. A bobina do rádio Sharp serve perfeitamente. No caso só serão utilizados os fios extremos do enrolamento, permanecendo a tomada central desligada.

 

Figura 6
Figura 6

 

 

 

Figura 7
Figura 7

 

 

Esta bobina será colada na caixa de fósforos de modo que o núcleo possa ser movido no seu interior por meio de uma janela existente numa das laterais da caixa.

Se o leitor quiser enrolar a bobina segundo as dimensões do núcleo usado, fazendo para esta finalidade uma forma de papelão conforme mostra a figura 8.

Esta bobina terá de 80 à 100 espiras de fio esmaltado fino (AWG 28 ou 30).

 

Figura 8
Figura 8

 

 

Os capacitores usados de preferência devem ser todos do tipo disco de cerâmica pelas suas reduzidas dimensões facilitando assim sua instalação no interior da caixa. Veja na figura a localização de cada um e sobretudo os valores. Se houver troca de valor, certamente o desempenho do radinho será prejudicado.

O diodo pode ser de qualquer tipo de germânio sendo os mais comuns no mercado o 1 N34 e o 1 N60. Observe a polaridade deste componente dada pelo anel pintado em seu corpo. A posição do componente na ponte de terminais é mostrada claramente na figura.

A ligação do fone é feita por meio de um jaque fixado na lateral da caixa. Adquira antes o fone e depois o jaque para haver certeza da sua concordância. Em alguns casos será necessário ligar em paralelo com o fone um resistor de 47k, mas isto será raro.

A ligação da antena e a terra é feita por meio de dois pedaços de fio de 1,5 metros cada um tendo em suas pontas garras do tipo "jacaré".

O fone usado neste radinho deve ser obrigatoriamente do tipo de cristal já que os fones magnéticos de baixa impedância que normalmente são encontrados em rádios portáteis não têm sensibilidade suficiente para funcionar neste aparelho.

Terminada a montagem é muito fácil verificar o funcionamento de seu radinho:

 

PROVA E USO

Para provar o aparelho em primeiro lugar você precisará de uma antena: quanto maior, melhor. Um tipo de antena improvisada pode ser conseguido estendendo-se cerca de 10 metros ou mais de fio de capa plástica um pouco acima do nível do solo, mesmo apoiado em cadeiras ou móveis.

Ligue numa das pontas deste fio a garra correspondente à antena (vermelha).

A outra garra você ligará num dos poios da tomada de corrente alternada de sua casa. (Cuidado para não tomar choque). Mesmo que não seja o polo neutro ainda assim você obterá bom funcionamento para o circuito e não haverá perigo de choques no fone porque o capacitor C3 o isolará.

Mexendo então no núcleo da bobina você deve encontrar uma posição em que as estações mais fortes poderão ser ouvidas.

Se nada for ouvido, desfaça as ligações e revise principalmente a ligação da bobina na ponte de terminais.

Veja que o fio esmaltado usado no seu enrolamento precisa ser raspado em sua ponta para ser soldado, pois pelo contrário não haverá contato elétrico e o rádio não funcionará.

Se a sintonia de uma estação só for conseguida com o núcleo da bobina todo para fora, você deve retirar algumas espiras dessa mesma bobina.

Se a sintonia das estações locais só for conseguida com o núcleo da bobina todo para dentro você deve desmontar a bobina reenrolando-a com um pouco mais de voltas.

Veja o leitor que o receptor tem um rendimento que depende muito do tamanho e eficiência da antena, da boa ligação à terra e principalmente da intensidade dos sinais da estação local. Se você morar em localidade de estação fraca e ainda longe dela, será muito problemática a sua escuta com este receptor.