Este artigo sempre será atual, pois analisa de forma didática o princípio de funcionamento de dois tipos de materiais muito usados na eletrônica. Estes materiais são a base de diversos tipos de sensores e transdutores, e por isso é muito importante para todos que praticam eletrônica conhecer o seu princípio de funcionamento.
Os materiais com propriedades piroelétricas e piezoelétricas são cada vez mais usados em aplicações eletrônicos da robótica e da mecatrônica. Essas aplicações vão desde sensores e transdutores até ressonadores que determinam a freqüência de operação de instrumentos de medida, cronômetros e relógios e, principalmente, microprocessadores. Veja neste artigo o que são os materiais piroelétricos e piezoelétricos entendendo melhor o funcionamento dos dispositivos em que eles são utilizados.
As propriedades piroelétricas e piezoelétricas dos materiais são devidas à natureza de sua estrutura cristalina.
Assim, se um cristal não possui um centro de simetria que possibilite uma inversão de posição de seus átomos, propriedades elétricas interessantes podem se manifestar.
Estes cristais manifestam um momento elétrico ou vetor de polarização, mesmo na ausência de campos elétricos externos, conforme mostra a figura 1.
Quando um material apresenta esta característica temos duas possibilidades.
MATERIAIS PIEZOELÉTRICOS
A primeira é a que está presente nos materiais que se tornam polarizados quando ocorre uma deformação homogênea. Essa é uma propriedade que caracteriza os denominados materiais PIEZOELÉTRICOS, conforme mostra a figura 2.
O que ocorre então é que o material manifestará um campo elétrico interno sob a ação de forças que o deformam.
Da mesma forma, o efeito inverso, denominado eletrostrição, ocorre com este material: quando o submetemos a um campo elétrico ele se deforma.
As variações das dimensões do material com a ação do campo elétrico mudam muito, e também depende da orientação do eixo de simetria do material.
Isso significa que aplicando um campo elétrico através de placas fixadas na superfície de um cristal piezoelétrico pode-se obter diversos tipos de deformações.
Dentre os materiais que apresentam essas propriedades podemos citar o cristal de quartzo, o sal de Rochelle, o titanato de bário, além de outros.
No caso específico do cristal de quartzo, se o excitarmos com placas de metal formando assim um capacitor e usarmos uma corrente de alta freqüência, formam-se ondas estacionárias na freqüência de ressonância, conforme mostra a figura 3.
Esta freqüência de ressonância, na qual o cristal tenderá a oscilar depende das dimensões do cristal e da sua orientação.
Isso significa que podemos usar este dispositivo como um preciso controle de freqüência, cujo valor depende de diversos fatores, como as dimensões do cristal, sua orientação e sua forma de vibração, já que as ondas estacionárias podem ocorrer também em freqüências harmônicas.
Dizemos neste caso que o cristal opera em sobretons ou harmônicas.
O cristal de quartzo é formado por átomos de silício e oxigênio numa estrutura do tipo mostrado na figura 4.
O aparecimento de um campo elétrico nesse material ocorre quando ele é comprimido ou distendido no sentido longitudinal, deslocando as cargas positivas em relação as cargas negativas.
O deslocamento das cargas numa célula do cristal é extremamente pequeno, da ordem de 10 elevado ao expoente negativo -24 centímetros, o que torna extremamente difícil a realização de medidas.
MATERIAIS PIROELÉTRICOS
Os materiais piroelétricos constituem-se num grupo especial de materiais piezoelétricos que são polarizados naturalmente nas condições naturais de temperatura e pressão.
No entanto, o grau de polarização do material muda sensivelmente com a temperatura, daí sua denominação ("piros" significa fogo em grego).
Um material comum que apresenta propriedades piroelétricas é a turmalina.
Veja que, enquanto nos materiais piezoelétricos o campo elétrico se manifesta somente quando ocorre a deformação, nos materiais piroelétricos o campo está sempre presente.
Nos materiais piroelétricos, o campo elétrico interno presente é muito intenso, de modo que sua polarização não pode ser alterada facilmente por meios externos.
De acordo com o as teorias do eletromagnetismo, uma região em que os átomos estejam com momentos magnéticos orientados igualmente ou paralelos, é denominada domínio.
Este mesmo termo pode ser aplicado à eletrostática no caso da região em que os momentos elétricos dos dipolos elementares sejam paralelos.
Existem diversas substâncias que, da mesma forma que são os imãs para o magnetismo, apresentam multidomínios elétricos, sendo por isso denominadas (como analogia) de "ferroelétricas" (em contrapartida as substâncias ferromagnéticas, que apresentam as mesmas propriedades mas em relação aos campos magnéticos), conforme mostra a figura 5.
O interessante é que a analogia entre as substâncias ferroelétricas e ferromagnéticas vai mais longe: ambas possuem uma histerese elevada, constante dielétrica muito alta e, além disso, possuem um ponto Curie, ou seja, existe uma temperatura limite que ultrapassada, faz com que elas percam suas propriedades.
Dentre as substâncias que apresentam as propriedades piroelétricas podemos citar o Titanato de Bário (BaTi3), que aos 120 graus centígrados perde estas propriedades (ponto Curie), tornando-se um dielétrico comum.
Acima dos 120 graus o cristal tem um domínio único com o átomo de Titânio no centro do cubo conforme mostra a figura 6.
Quando a temperatura cai para menos de 120 graus, ocorre uma transição de fase que muda esta disposição. Uma das dimensões do cubo se torna 1% mais curta que a outra e com isso a figura se transforma num tetraedro.
Com isso, o átomo de titânio é deslocado levemente no interior passando a ocupar uma posição fora de seu centro.
Diversas regiões do material se tornam então domínios com diferentes orientações. Isso é suficiente para criar um vetor de polarização que se manifesta na forma de um campo elétrico natural no interior do material.
Se o cristal for resfriado abaixo dos 10 graus centígrados, novamente temos outra transformação de fase e o material deixa de ser piroelétrico.
USOS
Tanto os materiais piezoelétricos como piroelétricos encontram diversas aplicações práticas na eletrônica.
Já falamos dos cristais de quartzo, mas podemos citar outros exemplos de aplicações para os piezoelétricos.
Uma delas é em transdutores que convertem sinais elétricos em sons e vice-versa.
Na figura 7 temos um transdutor piezoelétrico de titanato de bário muito usado em sistemas de aviso, brinquedos, cartões musicais, chamadas de celulares, etc.
Uma cerâmica piezoelétrica de titanato de bário é excitada por dois eletrodos metálicos, colocados um em cada uma de suas faces.
Quando um sinal é aplicado a este transdutor, o campo criado provoca deformações correspondentes na cerâmica, fazendo-a vibrar fortemente e assim gerar som na freqüência correspondente.
Veja que o dispositivo funciona como um capacitor, apresentando assim uma elevada impedância, e que a deformação e portanto a intensidade do som, dependem da intensidade do campo aplicado e ainda da tensão entre os eletrodos que funcionam como armaduras de um capacitor.
Nos tweeters piezoelétricos um pequeno transformador eleva a tensão aplicada aos eletrodos, de modo que ela atinja valores muito altos resultando numa intensidade sonora elevada.
Como o efeito inverso, ou seja, com a deformação é gerada uma tensão, ocorre que estes materiais podem ser usados também como microfones ou sensores de batidas.
Para os materiais piroelétricos a principal aplicação é como sensor de calor.
Pequenas variações de temperatura, que ocorrem com a incidência de radiação infravermelha, alteram sensivelmente a polarização do material.
Assim, os sensores de incêndio, passagem de pessoas, abertura automática de portas, ou mesmo alarmes do tipo mostrado na figura 8, usam esse tipo de sensor.
Na figura 9 temos o sensor piroelétrico típico encontrado nesses dispositivos e que funciona da seguinte maneira:
Todo corpo acima do zero absoluto emite radiação infravermelha. Isso significa que animais de sangue quente, como nós, são emissores naturais de radiação infravermelha com uma intensidade um pouco maior do que os corpos que nos rodeiam, e que normalmente são mais frios.
Assim, basta ajustar a sensibilidade dos sensores para disparar com uma intensidade de infravermelho um pouco maior do que a existente no ambiente, para que a simples passagem de uma pessoa diante dele provoque seu disparo.
Nos dispositivos práticos de modo a selecionar os comprimentos de onda apropriados evitando assim um excesso de sensibilidade, aumentando o ângulo de percepção são usadas lentes especiais denominadas "lentes de Fresnel".
A figura 10 mostra um circuito típico de um sensor piroelétrico.
É importante observar que tais sensores são extremamente delicados exigindo-se um cuidado especial no seu manuseio.
Como as variações de tensões, que ocorrem na presença do calor que deve ser detectado, são muito pequenas circuitos amplificadores de alto ganho são necessários para sua utilização.