O tema Feiras de Ciência está em alta e uma enorme quantidade de professores do ensino fundamental e médio estão pensando em fazer uma em sua escola. No entanto, procurando por literatura, principalmente na internet, vemos que as abordagens são vagas, senão equivocas ou muito precárias, com a elaboração de simples demonstrações com projetos que nem sempre são atraentes.

Assim, baseados na nossa experiência de mais de 60 anos, desde quando jovens participamos como estudante de feiras e durante nossa carreira quando organizamos e participamos como professor e depois as organizamos, escrevemos artigos e livros e até fomos avaliadores de grandes feiras como a Febrace. Temos muito a dizer e até podemos dizer que caberia num livro específicos, já que para os projetos já temos.

Na verdade não temos um simples livro, mas diversos que reúnem uma infinidade de projetos de todos os níveis e no nosso site artigos, não apenas nossos, mas de experiências professores colaboradores como Luiz Ferraz Netto (que deu aulas comigo no Colégio Objetivo e fazia programas relacionados na TV Cultura), Luiz Henrique Correa Duarte e outros que estão presentes com artigos e nesta revista.

Nossa ideia então é passar neste artigo algumas dicas de como você pode fazer um excelente feira de ciências na sua escola ou mesmo em outros locais, por exemplo, clubes, condomínios, empresas e até mesmo em praças públicas patrocinada pelas autoridades municipais.

 

Figura 1 -Alguns de nossos livros (alguns são gratuitos)
Figura 1 -Alguns de nossos livros (alguns são gratuitos)

 

 

Link para a página de livros do Instituto: https://www.newtoncbraga.com.br/index.php/biblioteca-do-instituto/8493-projetos-educacionais-de-robotica-e-mecatronica

 

 

Feira de Ciências ou Evento Cultural

 

A possibilidade de se levar a público o que se faz numa escola, numa organização, clube ou empresa não precisa necessariamente abordar apenas trabalhos de ciências. Uma possibilidade mais ampla consiste em se organizar um evento cultural.

Nela não temos apenas os trabalhos relacionados com a ciência e eventualmente a tecnologia, mas o evento pode abranger outras áreas. Numa escola, por exemplo, podemos ter trabalhos de artes, artesanato, línguas, educação física e tudo mais que seja ensinado ou que mereça ser apresentado ao público. Até mesmo jardinagem, culinária, moda, podem ser incluídos

Trata-se, portanto, de um evento multidisciplinar em que professores e alunos, pais de alunos e até mesmo representantes da comunidade, por exemplo, podem apresentar seus trabalhos. Isso implica também que um evento desse tipo não precisa ficar restrito a participação de seus realizadores, mas pode envolver convidados e até mesmo a própria comunidade, caso em que ele será aberto ao público.

Nesse ponto, lembramos que se trata de um evento de integração com a comunidade em que a ciência e a tecnologia são levadas de modo a conscientizar todos sobre sua importância. Além disso, nada impede que os trabalhos apresentados sejam patrocinados por empresas da comunidade que o realiza.

A partir desse ponto, podemos ter uma gradual restrição do foco, por exemplo, dirigindo o evento para determinadas ciências e tecnologias, O evento, por exemplo, pode ser restringir a ciências exatas, humanas e biológicas com a física, química, matemática e biologia.

Pode ser um evento que aborde as ciências exatas. Podemos ter a matemática, física e química. Essa separação é importante para o caso de um evento cultural, pois permite a separação em setores.

 

Figura 2 – Exemplos de apresentações. Estandes no Evento Cultural do Colégio Mater Amabilis.
Figura 2 – Exemplos de apresentações. Estandes no Evento Cultural do Colégio Mater Amabilis. | Clique na imagem para ampliar |

 

 

 

O foco da feira

 

Uma boa feira de ciências não deve focar apenas em mostrar aos convidados o que os alunos fazem, mas muito mais. O foco de uma feira é levar conhecimento e informação à comunidade, conscientizando-a sobre a importância da ciência e também da tecnologia.

No passado costumava-se utilizar o termo “vulgarização” da ciência, com o qual não concordamos, por ter uma certa conotação depreciativa. Achamos muito melhor usar popularização ou divulgação da ciência, o que é muito melhor.

Assim, um dos principais focos de uma feira, além de revelar a criatividade e capacidade de seus participantes é levar a ciência e a tecnologia à comunidade, mostrando sua importância e que também ela é acessível. Um dos pontos que destacamos é a necessidade de se desvincular a imagem do cientista ao sujeito maldoso que fechado em seu laboratório só pensa em criar coisas ruins.

O aspecto humano do cientista e do pesquisador, sua importância para o mundo e sua contribuição para o nosso bem-estar e o que temos no mundo atual deve ser ressaltada.

Enfim, levar a ciência a todos, elevando sua importância para a humanidade é algo que nunca pode ser esquecido ao se realizar evento cultural ou feira de ciências.

 

 

A escolha dos temas e a abordagem

 

Uma maneira de atrair os visitantes é mostrar coisas que sejam atraentes. Não adianta nada você fazer um estande de matemática numa escola do nível médio em que você demonstra a transformada de Fourier, quando os visitantes são pessoas comuns, a maioria sem educação superior. Se pretender fazer isso deve apresentar uma aplicação prática que sensibilize as pessoas. Uma aplicação com um projeto físico palpável seria a solução.

A escolha do tema deve levar em conta não o nível de conhecimento de quem apresenta, mas sim o nível de conhecimento de quem visita a feira. É claro que os dois devem ser conciliados. Um tema avançado pode se tornar atraente com uma aplicação prática curiosa.

Assim, os organizadores da feira devem ter a sensibilidade para escolher o tema e para orientar os alunos sobre a melhor maneira de fazer sua abordagem com um projeto prático interessante.

Quando os visitantes podem participar de um experimento ou de uma demonstração, o projeto se torna ainda mais atraente. Podemos citar como exemplo projetos nossos que foram apresentados no Evento Cultural do Colégio Mater Amabilis e que sugerimos para nossos alunos participantes da Febrace. Neles, podemos mostrar como princípios simples podem ser associados a demonstrações que se tornam atraentes para o público e que até tornam mais fácil explicar os princípios segundo elas quais operam.

Um projeto muito interessante que demos para os nossos alunos foi o Choque Solar. A ideia é simples. Demonstrar o funcionamento de um painel fotovoltaico é muito simples. Basta ligar as célula em alguma coisa que funcione, um motorzinho, um rádio, um conjunto de LEDs, etc. Mas, onde está a atração disso tudo? Vamos inovar.

O que fizemos: a partir de uma pequena célula fotovoltaica carregamos um capacitor, mostrando que a energia solar (luz) estava se convertendo em eletricidade, sendo armazenada num capacitor. Aproveitamos para explicar para que serve um capacitor;

Depois, mostramos que poderíamos demonstrar que a energia tinha sido armazenada, utilizando-a para dar um choque nas pessoas. Explicamos que a energia precisava ser “aumentada” e assim aproveitamos para explicar como funciona um transformador e pronto.

Luz na célula, capacitor carregado e o visitante convidado a segurar os fios o transformador. Capacitor tocando o transformador e a surpresa de um choque inofensivo, mas a surpresa era grande.

Até convidávamos as pessoas a fazer uma rodinha e dávamos um choque múltiplo. Um sucesso.

 


 

 

 


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A associação de aplicações curiosas com efeitos importantes é o que mais atrai nas feiras. Usamos um gerador de alta tensão para demonstrar o efeito corona para explicar o fenômeno e fotografar a “aura” dos dedos do visitante usando papel de fax. Fizemos um motor iônico com a mesma finalidade. Demonstramos a eletricidade animal fazendo um peixe elétrico excitar um amplificador. Projetos unindo um princípio científico a uma aplicação curiosa.

No nosso site temos a descrição de vários projetos interessantes que podem ser usados na íntegra ou adaptados, se o orientador ou aluno tiver alguma ideia adicional interessante. Também temos livros que dão projetos prontos dentro das mais diversas áreas sendo que muitos podem ser adaptados ou melhorados, conforme o domínio que os estudantes e orientadores tenham da tecnologia que deva ser usada.

 

Motor iônico apresentado em Feira de Ciências
Motor iônico apresentado em Feira de Ciências

 

 

 

O orientador e a preparação dos trabalhos e a escolha dos alunos

 

O orientador é uma das peças mais importantes para garantir o sucesso de um evento cultural ou uma feira de ciências. Ele deve ter a sensibilidade para escolher os temas (ou ajudar), para escolher os alunos ou participantes, formando os grupos ideais, acompanhando e dirigindo seu trabalho de modo a garantir sua execução e apresentação com sucesso.

Na escolha dos temas, deve-se sempre levar em conta a temática que melhor se adapte ao evento. Um evento numa escola de região industrial ou urbana deve abordar temas diferentes de um evento numa região com perfil agro, de pecuária ou pesqueira. Isso sem se falar em outros setores específicos como para uma comunidade mineira ou de extrativismo na floresta.

O tema deve-se adequar ao trabalho e as pessoas que vão visualizá-lo ou avaliá-lo. O orientador deve ter essa sensibilidade. Se o evento for mais amplo, deve-se formar uma comissão para isso. E, evidentemente, essa comissão deve ser multidisciplinar.

A forma de abordagem também deve ser escolhida de acordo com o nível de preparo dos participantes, a disponibilidade de recursos e principalmente de acesso aos materiais utilizados.

Finalmente, temos a formação dos grupos que devem ser formados por participantes, não apenas de diversos níveis, mas também com diversas aptidões e principalmente multidisciplinar.

O orientador deve evitar formar grupos em que todos são amigos com a mesma formação e os mesmos gostos. Deve ser eclético, principalmente dando oportunidade àqueles que tenham alguma dificuldade no acompanhamento dos demais, aos quais deve ser dado o incentivo e tarefas específicas que os façam se sentir úteis.

 

 

Segurança

 

Um ponto muito importante que deve ser destacado ao se realizar um evento cultural ou uma feira de ciências é a segurança. Isso inclui tanto a segurança dos apresentadores dos projetos como dos visitantes.

No nosso caso específico temos muitos projetos que envolvem eletricidade e eletricidade pode ser perigosa se indevidamente manuseada.

Assim, quando tratarmos de projetos que devem ser demonstrados por crianças (alunos de menor idade do ensino fundamental) devemos evitar o uso de qualquer dispositivo que seja ligado diretamente à rede de energia, a não ser que um orientador esteja constantemente presente.

Para os projetos do ensino médio recomendamos que se o dispositivo for ligado a rede de energia, que ele seja vistoriado pelo orientador e dadas as normas de uso para que problemas não ocorram. Evidentemente para aparelhos comerciais esse procedimento não se aplica, dependendo da finalidade do aparelho.

Para os do ensino técnico e de engenharia, também deve ser feita uma vistoria pelo orientador, de modo a certificar-se de que as normas de segurança sejam respeitadas. O uso de radiações que possam ser perigosas, como o ultravioleta, o laser também deve ser analisado com cautela nos experimentos.

E, é claro temos o uso de substâncias químicas que possam ser perigosas, e que devem ser evitadas, principalmente as tóxicas ou aquelas que podem atingir os olhos tanto do demonstrador como os visitantes durante um experimento.

 

 

A tecnologia

 

Nosso enfoque principal é utilizar recursos eletrônicos nas demonstrações, se bem que o que abordamos nesse artigo não se limite a isso. Os conceitos e ideias se aplicam a feiras que explorem qualquer ciência e sua forma original. É claro que, no momento que a tecnologia eletrônica entra em cena podemos ter muito mais.

Nada impede que você demonstre princípios da química, da física ou da biologia em sua forma original num excelente trabalho, sem usar qualquer recurso da tecnologia moderna mostrando o experimento em sua origem.

Mas, se você puder usar um recurso de tecnologia para visualizar melhor o que se deseja demonstrar, é muito melhor. E, nesse sentido temos muito o que empregar, principalmente se tivermos um conhecimento de eletrônica e pessoas que possam manuseá-la.

Um membro no grupo que saiba fazer montagens eletrônicas é um grande trunfo e em alguns casos, o próprio professor pode fazer isso, montando o circuito básico para um experimento e deixando para os membros do grupo sua demonstração e utilização. É claro que isso se aplica nos casos em que os membros do grupo não sejam de cursos específicos que precisem saber como fazer isso.

 

 

Os recursos técnicos – como obter

 

Quando se pensa num trabalho para um evento cultural ou feira de ciências, um ponto importante a ser analisado a disponibilidade dos componentes usados. Quer sejam eles, peças eletrônicas, substâncias químicas, materiais científicos diversos, etc. precisamos pensar na sua obtenção. É claro que em muitos casos, podemos utilizar material improvisado, aproveitado de sucatas ou reciclado com materiais comuns de uso no dia a dia.

Hoje podemos contar com a internet para o fornecimento das peças que precisamos, mas devem ser levados em contas dois pontos importantes.

O primeiro é que demora um certo tempo para essas peças cheguem até nós.

O segundo é que não podemos saber em muitos casos se essas peças servem para o que desejamos. Na maioria dos casos, os componentes vendidos pela internet não são acompanhados de suas especificações. Por exemplo, um pequeno motor de corrente contínua, tem apenas indicada sua tensão de operação. Não temos a mínima ideia de quanto ele fornece de potência e sua rotação.

 

 

 

Microcontroladores

 

Hoje em dia fala-se muito em Arduino nas escolas, e até mesmo outros microcontroladores como o ES32, Frazininho, etc. Há uma grande tentação em se fazer feiras ou eventos baseados exclusivamente neles.

Sim, pode ser um recurso tecnológico central de um evento, mas não devemos nos basear exclusivamente nessa tecnologia dos microcontroladores. Eles oferecem possibilidades maravilhosas ampliando os recursos que podemos ter para os trabalhos, mas eles não são únicos.

E também importante que eles sejam usados para se demonstrar especificamente suas possibilidades e aí entra a imaginação dos orientadores e dos participantes para criar projetos.

Enfim, procure as melhores fontes de ideias e nós somos uma delas. Veja nos links nossos artigos didáticos, artigos em geral, livros e vídeos. E, evidentemente, esta revista. Não deixe de acompanhá-la.

Finalmente, se você fez organizou um evento cultural em sua escola, em sua comunidade, em sua empresa ou mesmo em seu condomínio, bata fotos, crie um texto contando sua estória e envie-nos. Publicaremos em nossa revista.