Nesta aventura escrita em 1965, Beto e Cleto tem uma ideia brilhante de usar um gato para demonstrar na escola os efeitos da eletrostática. Mas como sempre imprevistos acontecem.

Na realidade, esta é uma estória que envolvem dois outros personagens, que não são Beto e Cleto e que criei em 1965. Sempre gostei de escrever, e as estórias de ficção me despertavam especial interesse. Na revista americana Popular Electronics havia dois personagens que protagonizavam aventuras no mundo da eletrônica desde 1948 e eu os acompanhava desde o início de minha carreira. Suas estórias é que me deram inspiração para criar depois de muitos anos o Prof. Ventura, Beto e Cleto. Escrevi diversas estórias com Juca e Chico que eram dos nomes da versão brasileira já que John T. Frye, o criador americano tinha como personagem Carl e Jerry, dois técnicos de TV. A que apresento é de 1966, mas tenho algumas de até antes e que agora recupero. A estória aqui reproduzo, inspirada na série original e usando os nomes dos personagens traduzidos na época pela versão brasileira, Juca e Chico, foram transferidos para os nossos bem conhecidos Beto e Cleto. Ela é uma verdadeira aula de eletrônica e eletricidade mostrando que eu já sabia como fazer muitas coisas que só depois com a série McGyver se tornaram populares. O prof. Ventura não aparece nesta estória que lembra a tecnologia da época. A data é 23 de dezembro de 1965.

 

Quando tudo começou …

 

De volta das aulas, Beto e Cleto esquecendo o cansaço, conversavam animadamente, e é claro, se havia um motivo para os dois se entusiasmarem, deveria ser a eletrônica.

De fato, naquele dia, os dois amigos conhecidos na escola por “gênios da eletrônica”, haviam sido escolhidos para fazer uma demonstração de eletricidade estática, e isso para as alunas do período da manhã, numa exposição que estava sendo montada no laboratório do colégio.

- Teremos de dar um efeito espetacular para as nossas experiências. – Dizia Cleto entusiasmado – Algo como a produção de alguns raios em miniatura.

- Sim, faremos algo interessante, mas sem exageros. – Concluiu Beto, mais cauteloso – Poderemos fazer algumas experiências de atração e repulsão com bolas de isopor ou papel, mostrar a detecção da eletricidade com eletroscópios, como o eletrônico que temos e até produzir algumas faíscas com nosso centelhador de Tesla. Tem alguma sugestão adicional?

Nem chegou a terminar de falar, Cleto estalou os dedos. O gordinho havia lembrado de algo.

- E se fizéssemos uma demonstração de como é possível acumular eletricidade numa pele, por exemplo, de um gato! ... É um negócio muito interessante, e além disso, as meninas ficariam de queixo caído com a nossa “mágica” de tirar faíscas de um felino!.

- Parece muito interessante – Observou Beto – Mas, precisamos arranjar um gato de alguém que concorde em cedê-lo para a experiência.

- Ora, isso é simples. Tenho um primo que tem um belo gato e que não me negaria ceder o bichinho por um dia.

Tudo ficou combinado. Cleto arranjaria o gato, ao mesmo tempo em que Beto prepararia algumas experiências e alguns aparelhos para a demonstração do dia seguinte.

Reunidos à noite, os dois ainda deram uma lida nos roteiros que haviam preparados para uma série de experiências, entre elas uma que consistia em se esfregar rapidamente um gato seco, os seus pelos se eletrizariam, crepitando e soltando faíscas que seriam facilmente visíveis num ambiente escurecido.

No dia seguinte bem cedo, os dois partiram rumam ao colégio, parecendo que estavam de mudança, como disse a mãe de Beto quando saíram, pela grande quantidade de coisas que carregavam.

Beto, com uma série de aparelhos numa bolsa e na mochila, alguns ainda com os fios dependurados, e Cleto com o bonito gato branco do primo sob os braços, carregando na outra mão uma delicada garrafa de Leyden.

Quando os dois chegaram ao colégio, o que mais chamou a atenção das alunas, foi justamente o que os seus espíritos científicos não poderiam imaginar: o gato.

Seguraram o gato, acariciaram, mas para desagrado de Beto e Cleto, não deram nenhuma atenção aos equipamentos que traziam, que achavam que iriam ser o máximo para impressionar as meninas...

Beto, subindo as escadas para o laboratório, comentou para Cleto:

- Acho que nunca vou entender as mulheres. Viu?

- Notaram somente o gato. Nem sequer viram nossa verdadeira obra de arte! Nosso eletroscópio eletrônico. Acho que da próxima vez que quiser chamar a atenção de uma garota, vou miar.

Pouco depois dos dois arrumarem as coisas na bancada do laboratório, o sinal para a subida dos alunos foi dado. Em pequenos grupos, as meninas foram entrando na sala, acomodando-se normalmente em suas carteiras. O gato continuava a chamar a atenção.

Em seguida, entrou o Professor de ciências, um baixote de enormes óculos redondos e bigodes finos que levaram ao apelido secreto de “Coruja”.

Depois de cumprimentar a classe, o professor Samuel apresentou os dois rapazes, explicando rapidamente o que era a eletricidade, deixando-os, em seguida, livres para a demonstração.

Beto e Cleto perceberam desde o início um ar de interrogação nas fisionomias das alunas. O que iriam fazer os dois com o “pobre” gato?

Entendedores de psicologia, como eram, deixaram o gato para o final, para que as alunas prestassem atenção até o final, aumentando assim a curiosidade.

E, assim passou o tempo da aula. Cleto fez alguns arranjos simples de seus equipamentos, ao mesmo tempo em que Beto explicava, sem deixar de citar alguns termos técnicos, que logo o professor se apressava em explicar, pois sabia que não haviam sido entendidos pela classe.

Finalmente, chegou a hora do gato. Beto explicou:

- Vimos que o atrito libera elétrons dos átomos dos corpos, carregando-os de eletricidade, e um exemplo bom disso é o acúmulo de eletricidade que ocorre nos pelos de um gato seco atritado. Apagaremos as luzes e fecharemos as janelas de maneira que, no escuro poderemos ver faíscas produzidas pela eletricidade acumulada nos pelos do gato.

O professor fechou as janelas, deixando a sala no escuro. Beto segurou o gato e esfregou fortemente. Foi possível então ver claramente o pelo do gato pequenas faíscas acompanhando de um ruído de crepitação. O gato arrepiou-se em consequência disso.

O espanto da classe foi geral. Muitos pediram que a experiência fosse repetida, havendo os que perguntaram se o gato não estava levando algum tipo de choque. A resposta foi negativa.

Beto, novamente atritou o gato, quando então o que se viu foi uma enorme faísca, bem maior do que as obtidas na demonstração anterior, e um ruído não elétrico.

- Miauuuuuuuu....

O espanto foi geral. Acendeu-se a luz. O gato não estava mais na mesa. Num canto, todo encolhido, esteva o bichinho apavorado.

Numa exclamação geral, a classe se manifestou:

-Coitadinho do gato!....

Beto, ao olhar novamente para a mesa, percebeu logo o que havia acontecido. O gato havia encostado acidentalmente o rabo numa garrafa de Leyden ainda carregada do experimento anterior.

A reprovação foi geral. Se os dois não terminassem logo as experiências, certamente apanhariam das garotas que imediatamente os incluíram na lista dos “homens maus”. A vizinhança logo soube do ocorrido, proibindo os dois rapazes de se aproximarem de seus bichinhos de estimação.