Muito sensacionalismo tem sido feito em torno dos perigos de um conflito nuclear total entre as grandes potências, e até mesmo com potências de segunda ordem como a Índia e o Paquistão. Documentários, livros e artigos em jornais e revistas, além de filmes, mostram a destruição, a contaminação por radiação e as alterações genéticas que uma explosão atômica causa. No entanto, juntamente com esses perigos existem outros, muitos dos quais tão grandes que merecem uma análise bem mais cuidadosa por parte dos

especialistas. Dentre esses perigos adicionais pouco explorados, destacamos o EMP ou Pulso Eletromagnético (do inglês Electromagnetic Pulse), capaz de destruir todo o sistema de comunicações e transmissão de energia num raio de muitos quilômetros a partir do local de uma explosão nuclear. Este fenômeno será abordado a seguir.

Obs. Apesar de ter sido escrito em 2001, este artigo ainda é atual, pelo que ele representa em termos de perigo nuclear para toda a humanidade.

 

Não precisamos discorrer sobre os muitos efeitos destrutivos diretos de um explosão nuclear.

Temperaturas de milhões de graus são produzidas no local do evento causando a vaporização imediata de qualquer substância conhecida, além da emissão de uma enorme quantidade de energia na forma de luz e calor, como também de radiação atômica.

A onda de choque que se segue arrasa com tudo que ainda estiver inteiro, matando, derrubando e lançando na atmosfera uma grande quantidade de detritos.

Mesmo depois de algum tempo de decorrida a explosão, os efeitos ainda persistem com a queda de poeira radioativa que causa um nível de radioatividade enorme no local de precipitação comprometendo toda a espécie de vida nas imediações e até mesmo em locais mais distantes.

Todos esses efeitos têm consequências terríveis, trazendo preocupações a muitos governos e entidades que se preocupam com a sobrevivência da espécie humana.

Sistemas de salvamento, deslocamento de populações e a posterior sobrevivência à radiação remanescente têm sido discutidos em diversas escalas.

Entretanto, além desses perigos, uma explosão nuclear também pode comprometer diversos serviços essenciais à humanidade e isso num momento crítico como, por exemplo, as telecomunicações e a transmissão de energia elétrica, mesmo sem atingi-Ias diretamente.

Isso ocorre porque existem efeitos elétricos poderosos que acompanham uma explosão nuclear e que atuam a distâncias consideráveis, sendo capazes de destruir ou danificar equipamentos.

Sistemas de telecomunicações ou de transmissão de energia podem entrar em pane total a dezenas ou mesmo centenas de quilômetros do local de uma explosão nuclear.

Que tipos de efeitos são esses?

 

EMP ou Pulso Eletromagnético

O ar, em condições normais, é um bom isolante, não conduzindo a eletricidade, mas deixando passar diversas formas de radiação como, por exemplo, as ondas de rádio e mesmo a luz comum.

No entanto, elevadas temperaturas podem ionizar o ar, ou seja, arrancar elétrons de seus átomos, tornando-o assim condutor de eletricidade.

Quando isso acontece, as propriedades condutoras influem diretamente na capacidade do ar de deixar passar radiações eletromagnéticas e, muito mais que isso, pode provocar a própria produção dessas radiações.

Temos um exemplo disso nas descargas naturais que ocorrem durante uma tempestade, conhecidas como raios.

Além da forte onda de choque e da boa quantidade de luz e calor gerado, existe também uma movimentação considerável de cargas elétricas, responsável pela produção de radiação eletromagnética numa faixa de frequências mais baixa do espectro de rádio, conforme mostra a figura 1.

 

Figura 1 – Emissões naturais
Figura 1 – Emissões naturais

 

 

Sintonizando um rádio AM fora de estação, no extremo inferior da faixa, por exemplo, num dia de tempestade podemos ouvir as fortes interferências produzidas pelas descargas na forma de estalidos e chiados.

Entretanto, as descargas produzidas por um simples raio não significam muito quando comparadas ao que pode ocorrer com a fortíssima ionização produzida por um artefato nuclear, mesmo que de pequena potência.

As elevadíssimas temperaturas geradas no local de uma explosão, não só ionizam o ar como também podem acelerar elétrons a velocidades relativísticas com a produção de fenômenos elétricos de enorme intensidade e até de comportamento pouco conhecido.

A própria radiação nuclear ajuda a excitar o ar ionizado provocando a geração de impulsos elétricos de curtíssima duração, mas de enorme intensidade.

Esses impulsos podem propagar-se pelo espaço do mesmo modo que qualquer outro sinal, e, ao atingir equipamentos sensíveis, podem causar destruição.

A sensibilidade dos equipamentos eletrônicos a impulsos elétricos, que se propagam tanto pelo espaço como por meio condutores de energia tais como fios, é bem conhecida.

Os equipamentos de telecomunicações, por exemplo, que trabalham com sinais captados por uma antena, não podem admitir em seus circuitos tensões acima de certos valores.

Se um sinal acima de certa intensidade vier a atingi-los, a tensão em seus circuitos ultrapassará os limites admitidos e danos irreversíveis podem ocorrer.

Os equipamentos de computação também são bastante sensíveis a esses sinais de grande intensidade.

Atingindo as linhas de alimentação ou mesmo suas estruturas metálicas, os pulsos podem induzir tensões suficientemente elevadas para causar danos.

Na figura 2 mostramos as características comparadas de um pulso eletromagnético gerado por uma explosão atômica com outro pulso gerado numa tempestade por um raio comum.

 

   Figura 2 – Característica do EMP
Figura 2 – Característica do EMP

 

O pulso eletromagnético tem uma duração muito mais curta que o produzido pelo raio, concentrando assim mais energia num intervalo menor de tempo, o que significa um efeito destrutivo muito maior.

O espectro de frequências que esse pulso cobre é também significativo, pois se estende por centenas de MHz afetando inclusive equipamentos que operam na faixa de VHF, de tão grande importância nas tele-comunicações modernas.

Propagando-se com a velocidade da luz, esse pulso corresponde a uma perturbação eletromagnética capaz de destruir muitos tipos de equipamentos eletrônicos.

 

Como o Pulso Eletrogamético é Produzido

Os efeitos de um pulso eletro-magnético gerado por uma explosão nuclear já haviam sido relatados desde 1958 quando um teste no Pacífico foi monitorado.

Esse teste mostrou que o distúrbio foi capaz de paralisar momentaneamente a rede de iluminação do Havaí, a 1000 km de distância.

No entanto, foi somente depois de 1962 que estudos mais sérios começaram a ser desenvolvidos em relação ao fenômeno.

Não obstante todas as explosões nucleares produzam um pulso eletromagnético, sua intensidade varia de acordo com a maneira como a explosão se realiza.

Isso nos leva a imaginar o dia em que as potências militares se preocuparão com o EMP como recurso tático, produzindo-o de modo controlado com a finalidade de danificar apenas os meios de comunicação dos inimigos.

O que sabemos hoje é que uma explosão nuclear a baixa altitude, até 100 metros do solo, não produz um pulso de grande intensidade.

O que acontece nesse caso é que, provavelmente, a presença de um sólido com o desvio dos detritos numa trajetória cônica atuaria como uma espécie de antena dirigindo as ondas eletromagnéticas para cima, conforme ilustra a figura 3.

 

Figura 3 – Explosão em baixa altitude
Figura 3 – Explosão em baixa altitude

 

 

Se a explosão ocorrer em altitude maior, entre 100 metros e 10 quilômetros, os efeitos do pulso já serão maiores.

O aquecimento violento no local da explosão ioniza o ar e com isso excita elétrons que, movimentando-se em alta velocidade, criam as correntes que geram o pulso eletromagnético.

O caso mais grave seria quando a explosão acontecesse acima da atmosfera, em altitudes entre 10 e 100 quilômetros.

E uma explosão acima da atmosfera, a uma altura de mais de 500 quilômetros, que já alcançaria a ionosfera, teria conseqüências gravíssimas em termos de intensidade o pulso gerado.

Nessa altura não existe um meio material suficientemente denso para absorver a energia produzida.

O resultado é que, a partir do local da explosão, a energia liberada se propaga principalmente na forma de raios X e raios gama que então, podem atingir a camada superior da atmosfera numa frente relativamente ampla, veja a figura 4.

 

 

Figura 4 – Explosão na ionosfera
Figura 4 – Explosão na ionosfera

 

 Ao atingir a camada superior da atmosfera ocorre uma ionização que “curto-circuita" o ar, tornando-o condutor e provocando gigantescas movimentações de cargas elétricas.

Além de se gerar o forte pulso eletromagnético que se propaga em todas as direções a partir desse ponto, também inutiliza-se as camadas ionizadas que são responsáveis pela comunicações na faixa de ondas curtas.

Na figura 5 apresentamos um gráfico onde colocamos as intensidades de campo produzidas por uma explosão de 20 megatons ( 1megaton equivale ao poder detonante de 1 milhão de toneladas de TNT), em relação a diversas distâncias.

  

Figura 5 – Os efeitos destrutivos
Figura 5 – Os efeitos destrutivos

 

 

Veja que, a 9 quilômetros do local do evento, a intensidade do campo chega a 10 000 volts por metro!

Objetos metálicos de grandes dimensões funcionariam como verdadeiras "antenas" recolhendo a energia desse pulso e podendo causar descargas elevadíssimas.

Aparelhos eletrônicos com antenas externas ou dependentes de linhas de transmissão física de energia seriam extremamente vulneráveis ao pulso, pois ficariam sujeitos a tensões elevadíssimas devidas à indução pelo pulso, capazes de causar a destruição de componentes sensíveis.

Dentre os equipamentos que podemos destacar como muito sensíveis estão os receptores de rádio com semicondutores e que possuam antenas externas (mesmo as telescópicas de pequenas dimensões), as linhas telefônicas e todos os dispositivos que a ela estiverem ligados, os computadores de um modo geral ligados à rede de energia local e não dotados de recursos para eliminar transientes muito rápidos, instalações com lâmpadas fluorescentes, etc.

Tensões de milhares de volts induzidas nesses equipamentos podem causar

Imediatamente sua destruição

 

PRECAUÇÕES

É interessante observar que dispositivos elétricos e eletrônicos, tais como as lâmpadas incandescentes (de filamento), as válvulas eletrônicas (termiônicas) e mesmo os rádios portáteis que usam apenas antenas de ferrite interna (sem antena externa) são relativamente imunes ao pulso eletromagnético.

Num equipamento a válvulas, por exemplo, na presença de um pulso de tensão muito elevada, surge simplesmente um arco de curtíssima duração entre os elementos internos das válvulas de entrada, com a absorção da energia sem maiores consequências para o aparelho.

Entretanto, no caso de dispositivos semicondutores o arco que ocorre tem efeitos destrutivos.

As junções semicondutoras de transistores e diodos, assim como as finas camadas de óxido de circuitos integrados e transistores CMOS ou JFET, seriam imediatamente destruídas.

Todos sabem o que acontece com equipamentos sensíveis, tais como: CD players, secretárias eletrônicas, quando um transiente, muito menor em intensidade do que o produzido por um EMP, consegue chegar aos seus

circuitos, daí todas as precauções na forma de filtros de linha, aterramentos

e muitos outros recursos que normalmente, são previstos pelos instaladores.

Talvez seja importante lembrar as autoridades militares, tão preocupadas com problemas estratégicos, que as forças de alguns países só usam em seus equipamentos de comunicação "antiquados" (?) válvulas, e não transistores e circuitos integrados.

Não seria isso um produto de uma inteligente estratégia de que se pretende usar o EMP, e não uma demonstração de atraso tecnológico?

Diversos são os cuidados que podem ser tomados para se evitar os efeitos destrutivos em equipamentos elétricos e eletrônicos, no caso de um conflito nuclear.

Como os cabos condutores e os elementos metálicos de grande porte são ótimos captadores do pulso, será conveniente desconectar qualquer equipamento eletrônico da rede de alimentação ou de antenas, mesmo que internas, na iminência de um conflito nuclear.

Receptores comuns de rádio e TV podem ser protegidos com a ligação de protetores como, por exemplo, diodos rápidos ligados em paralelo e com polaridade invertida.

Equipamentos sensíveis como computadores, receptores com transistores ou circuitos integrados, entre outros, devem ser instalados dentro de gabinetes metálicos ligados à terra.

Finalmente, é conveniente deixar de reserva e em bom estado de funcionamento aquele velho rádio de válvulas do tempo do vovô.

Ele pode ser muito útil quando toda a moderna tecnologia deixar de funcionar devido a um EMP.