Como produzir altas tensões? Para que servem as altas tensões? Estas questões são o assunto deste artigo, que procura dar algumas orientações para a montagem de dispositivos como bobinas Tesla, centelhadores e outros.

Faíscas saltando entre esferas ou fios pontiagudos são sempre espetáculos muito interessantes, mas também perigosos.

Mesmo partindo de tensões baixas, como as que obtemos de pilhas, fontes ou, ainda, da própria rede de alimentação, através de dispositivos especiais, podemos obter tensões muito altas (MAT Muito Alta Tensão), da ordem de milhares de volts, capazes de produzir faíscas.

 

O PERIGO

A alta tensão em si não é perigosa, pois o que causa o dano físico e o choque é a corrente elétrica.

Assim, quando elevamos a tensão de uma fonte qualquer, a tendência é haver uma redução proporcional da corrente que podemos obter.

Este é o princípio da conservação da energia, segundo o qual, não podemos criar nem destruir energia, mas simplesmente transformá-la.

Assim, se temos uma fonte que nos fornece 12 V sob corrente máxima de 1A, se conseguirmos elevar a tensão para 12 000 V, podemos ter certeza que a corrente não passará de 0,001A, ficando reduzida em 1000 vezes também.

A fórmula abaixo nos ajuda a determinar as alterações que ocorrem numa transformação de tensão, levando em conta que o circuito seja 100% eficiente (o que não acontece na prática).

 

V1 x I1 = V2 x I2

 

Onde:

V1 e I1 são tensão e corrente antes da transformação.

V2 e I2 são tensão e corrente depois da transformação.

 

Em geral, elevando-se a tensão para 20 ou 30 mil volts, num circuito pequeno, o que obtemos é: uma corrente tão baixa que dificilmente pode ser perigosa, a não ser que ela nos atinja por muito tempo ou em pontos críticos ou vitais do nosso organismo, por exemplo, o coração (figura 1).

 

   Figura 1 – Condição perigosa de uma descarga
Figura 1 – Condição perigosa de uma descarga

 

É claro que, brincar com alta tensão é perigoso.

As advertências que encontramos no interior de televisores analógicos antigos, onde existem tensões de 15 000 a 30 000V, são sérias e devem ser levadas em conta.

O fato é que podemos produzir altas tensões para experiências, mas sempre tendo em mente que elas são perigosas e que nunca devemos desrespeitar as regras mínimas: não tocar nos elementos vivos, não trabalhar descalço com nenhum equipamento de alta tensão ou próximo a objetos metálicos em contato com o solo.

 

A FAÍSCA

O ar é um bom isolante, não permitindo a passagem de correntes elétricas. No entanto, se entre dois condutores isolados por uma camada de ar manifestar-se uma tensão muito alta, pode ocorrer um rompimento do isolante.

Nestas condições, o ar deixa de ser isolante, permitindo a passagem da corrente, normalmente de forma violenta.

Esta corrente produz forte aquecimento do ar com a emissão de luz e som.

Temos então uma faísca, conforme mostra a figura 2.

 

   Figura 2 – A faísca ou centelha
Figura 2 – A faísca ou centelha

 

 

O ponto em que o ar “se rompe", deixando passar a eletricidade, é dado por um fator bem definido, denominado “rigidez dielétrica".

Toda substância tem sua rigidez dielétrica, ou seja, a tensão em que ocorre o seu rompimento e, conseqüentemente a passagem da corrente.

E claro que isso é válido somente para os isolantes.

No caso do- ar seco, nas condições normais de temperatura e pressão (CNTP), a rigidez dielétrica do ar é da ordem de 10 000 V/cm.

O que significa isso? Significa que, se tivermos dois condutores esféricos separados a uma distância de 1 cm, para que salte uma faísca entre eles é preciso uma tensão de pelo menos 10 kV.

Se estiverem separados 30 cm, precisaremos de 300 000 V.

Se os eletrodos forem dotados de pontas, a rigidez diminui, ou seja, a faísca salta com mais facilidade (figura 3).

 

   Figura 3- A influência das pontas
Figura 3- A influência das pontas

 

 

Um procedimento simples para se saber quantos volts tem uma fonte de MAT (Muito Alta Tensão) consiste em se verificar até que distância entre duas

esferas ela consegue fazer saltar uma faísca.

Mede-se esta distância em centímetros e multiplica-se por 10 000.

Se conseguirmos 2,5cm, por exemplo, sabemos que a tensão é da ordem de 25 000 V.

Veja que, para que a faísca se manifeste, temos que utilizar dois corpos com polaridades opostas.

O que se faz normalmente é ligar um deles à terra, conforme mostra a figura 4.

 

   Figura 4 – O aterramento
Figura 4 – O aterramento

 

 

Este procedimento não só ajuda na obtenção das faíscas, como também serve de proteção.

Ligado à terra, pela proximidade, a preferência para a descarga

será justamente este corpo.

 

COMO PRODUZIR FAÍSCAS

Antes do advento dos «dispositivos eletrônicos, as faíscas eram obtidas exclusivamente por meios estáticos.

Máquinas eletrostáticas produziam eletricidade, que se acumulava na esfera, até o ponto de se obter uma tensão suficientemente alta que provocasse a faísca.

A eletricidade era gerada porque o disco forrado de pele de coelho, ou mesmo borracha, se atritava fortemente em barras de vidro.

Um outro tipo de aparelho capaz de gerar tensões entre 20 000 e 500 000 V (e dependendo do tamanho até mais) é o Gerador Van Der Graaf, que recebeu este nome em homenagem ao seu criador, um holandês.

Ele consiste numa esfera metálica apoiada em um suporte isolante através da qual passa uma esteira de material isolante (borracha, plástico, seda ou outro material), como mostra a figura 5.

 

   Figura 5 – O gerador Van Der Graaf
Figura 5 – O gerador Van Der Graaf

 

 

Esta esteira é movimentada por uma manivela ou motor e passa pelo interior da esfera, onde existe uma espécie de pente condutor.

Com o atrito, o pente transfere cargas para a esteira e a esfera vai ficando cada vez mais carregada de eletricidade.

As cargas que são retiradas do pente (e da esfera) são levadas pela esteira a um segundo pente, ligado à terra, para onde escoam estas cargas.

Num dia seco, uma esfera destas pode ser carregada com tensões de milhares de volts.

Aproximando-se um corpo com conexão à terra, podem saltar faíscas visíveis de alguns centímetros.

Nos lugares ou dias úmidos, a carga é problemática, pois as cargas “escapam" da esfera, não permitindo que ela chegue a uma tensão suficientemente elevada para produzir boas faíscas.

Um dos problemas destes geradores eletrostáticos é que, uma vez produzida a faísca, precisamos esperar algum tempo para que as cargas sejam-repostas e uma nova faísca seja obtida.

Em suma, não podemos obter um arco contínuo, mas sim faíscas de curta duração.

Um processo que apareceu posteriormente fazia uso da eletricidade dinâmica, ou seja, correntes elétricas passando por uma espécie de transformador.

Este transformador possuía um enrolamento primário com poucas espiras, passando por um vibrador, e um secundário com milhares de espiras.

Fazendo circular uma forte corrente pelo primário, criava-se um campo magnético que atuava sobre o vibrador, interrompendo a corrente rapidamente e, com isso, obtinha-se as variações para indução da alta tensão no secundário.

Esta 'bobina de centelha (nome dado à faísca que se produzia) era a base dos primitivos transmissores de rádio.

A centelha era responsável pela produção de sinais elétricos que, então eram levados a uma antena.

Um dos primeiros transmissores usados por Marconi, assim como Landel de Moura, no Brasil utilizava esta técnica (figura 6).

 

Figura 6 – A bobina de centelha
Figura 6 – A bobina de centelha

 

 

A própria bobina de ignição dos automóveis, que chega a produzir mais de 60 000V, opera segundo este princípio.

No caso, o vibrador é o platinado e a alta tensão é aplicada às velas para produzir a faísca no interior do motor.

Um pesquisador norte-americano chamado Tesla desenvolveu técnicas interessantes para produzir tensões muito altas e, com isso, enormes faíscas.

Um dos processos mais conhecidos de se produzir tensões altíssímas é a chamada Bobina de Tesla ou simplesmente Bobina Tesla, como vemos na figura 7

 

Figura 7 – A bobina de Tesla
Figura 7 – A bobina de Tesla

 

 

Ela consiste num primeiro transformador, ou num oscilador, que produz uma tensão da ordem de 1000 a 5000 V.

Esta tensão é aplicada a um sistema faiscador com capacitor e bobina, que são calculados para ressoar numa certa freqüência.

A faísca produz então cargas e descargas do capacitor através da bobina, induzindo uma tensão elevadíssima numa segunda bobina.

Se a primeira bobina tiver 20 espiras e a segunda 400, a tensão aplicada ficará multiplicada por 20.

Assim, aplicando 20 000 V no primeiro enrolamento, obteremos no final do processo uma tensão de 400 000 V e para 5 000 V, a tensão obtida chegará a

100 000 V (figura 8).

 

Figura 8 – Aspecto da bobina de Tesla
Figura 8 – Aspecto da bobina de Tesla

 

 

Com tensões tão altas e produzidas de forma a serem mantidas constantes, pois as cargas perdidas são imediatamente repostas, podemos obter faíscas

potentes e constantes.

Os efeitos que tais faíscas produzem, embora perigosos, são bonitos, pois a ionização do ar faz com que seja emitida luz branco-azulada e, em alguns casos, tonalidades verdes e vermelhas.

Para a produção de faíscas de um corpo a outro, esses devem ter a forma esférica.

Neste caso, a aproximação, a uma distância que depende da tensão, fará com que a faísca salte, conforme mostra a figura 9.

 

   Figura 9 – Produzindo faíscas
Figura 9 – Produzindo faíscas

 

 

Se a esfera ou o ponto em que se obtém a alta a tensão tiver uma ponta, teremos a manifestação do “efeito das pontas". Se um corpo carregado 'tiver regiões pontiagudas, as cargas tendem a se acumularem nestas regiões e a escaparem para o ar ambiente.

No caso de tensões muito altas (MAT), este escape se faz na forma de fluxo luminoso, um jorro de ar ionizado que se afasta do gerador.

Este é o princípio de funcionamento dos chamados "Motores iônicos", onde o fluxo pode chegar a 80 000 km/ s propulsionando naves no espaço.

Se aplicarmos tensões muito altas, da ordem de I0 000 V ou mais, em lâmpadas incandescentes comuns, de modo que apenas um pólo seja conectado, teremos um efeito muito bonito.

O gás no interior da lâmpada (figura 10), que é o argônio, se ioniza e

formam-se eflúvios de cor azulada ou mesmo alaranjada em direção ao vidro (veja que no interior das lâmpadas comuns não se usa mais o vácuo, pois isso causaria o perigo de uma implosão em caso de batida ou quebra, por isso o vácuo é substituído por um gás nobre, normalmente o argônio).

 

Figura10 – Produzindo raios numa lâmpada incandescente
Figura10 – Produzindo raios numa lâmpada incandescente

 

 

Lâmpadas especiais, onde o eletrodo interno é uma esfera, são usadas em decoração. São as chamadas "lâmpadas de plasma", já que o estado ionizado do gás no seu interior corresponde ao que se denomina plasma.

Temos ainda um efeito bastante explorado em filmes onde haja laboratórios científicos ou filmes de ficção: dois arames ou fios são colocados em forma de V fechado, com a aplicação de uma tensão muito alta (MAT), conforme a figura 11.

 

   Figura 11 – A escada de Jacó
Figura 11 – A escada de Jacó

 

 

A faísca se forma no ponto em que a distância entre os fios é menor, ou seja, na base.

No entanto, o aquecimento do ar, pela produção da faísca, o leva a formar uma corrente ascendente que "carrega" a faísca para cima.

A faísca corre pelos fios, subindo, até desaparecer num arco na parte superior do V.

Outro fenômeno interessante obtido com tensões muito altas é o acendimento de uma lâmpada fluorescente pela simples aproximação do aparelho.

A elevada tensão nas proximidades da fonte de MAT faz com que se tenha a ionização do gás no interior da lâmpada pela simples aproximação.

Com uma tensão de 40 000 V, podemos fazê-la acender à distância, que varia entre 10 e 30 cm (figura 12).

 

   Figura 12 – Acendendo uma lâmpada fluorescente
Figura 12 – Acendendo uma lâmpada fluorescente

 

 

Existem aparelhos dispondo de circuitos mais modernos capazes de produzir tensões muito altas pa-ra experiências e com poucos componentes.

No site o leitor encontrar alguns desses circuitos.