Na primeira parte deste artigo (ART1171) mostramos como as matrizes de contactos podem ser usadas para se fazer montagens experimentais com um exemplo muito simples de aplicação. Terminando com a série vamos dar algumas montagens práticas que o próprio leitor pode fazer usando componentes comuns. Novamente salientamos que, depois de aprender a usar as matrizes de contactos o leitor não vai querer empregar qualquer outra forma de desenvolver seus circuitos.

 

Veja também Como usar matriz de contatos - parte 1

A realização de montagens numa matriz de contactos exige cuidados especiais, os quais variam tanto em função da complexidade dos circuitos como de sua eventual sensibilidade a fatores como capacitâncias parasitas, indutâncias, etc.

Explicamos melhor: fios longos, fios próximos, curvas acentuadas funcionam como elementos que afetam o funcionamento dos circuitos mais críticos, principalmente os que operam em freqüências elevadas.

Assim, um fio que faça uma curva acentuada funciona como um indutor, um fio longo representa também um indutor e dois fios paralelos muito próximos representam um capacitor. Esses componentes “fantasmas” podem afetar a estabilidade de um circuito montado numa matriz de contactos. A figura 1 mostra o que ocorre nestes casos.

 

Fios comportando-se como “componentes fantasmas”.
Fios comportando-se como “componentes fantasmas”.

 

 Assim, se estamos trabalhando com um circuito de baixas freqüências ou corrente contínua como uma fonte, um controle de um motor ou um circuito acionado por um sensor, ligações mais compridas não têm muita importância. No entanto, se estamos trabalhando com um transmissor de controle remoto ou outro circuito de alta freqüências, as coisas mudam.

Dois exemplos dados na figura 2 mostram como podemos otimizar nossas montagens, principalmente as mais críticas usando fios curtos nas interligações.

 

Otimizando as montagens
Otimizando as montagens

 

 

 Numa as conexões (fios) são curtas e rentes à placa. Esta montagem tem poucas indutâncias e capacitâncias parasitas, dificilmente apresentado problemas de instabilidades.

Na outra temos fios maiores formando uma “teia”. Nela, temos indutâncias e capacitâncias parasitas que podem afetar um circuito se ele for de alta freqüência ou mais crítico.

Se bem que as duas montagens possam funcionar normalmente, dependendo do circuito, a primeira, além de ter uma aparência melhor pode estar livre de pequenos problemas de desempenho que aparecem na segunda.

Lembre-se que ligações longas implicam em capacitâncias e indutâncias parasitas, capazes de afetar o funcionamento dos circuitos mais críticos como por exemplo os que operam com sinais de áudio fracos, com sinais digitais CMOS, ou ainda em freqüências elevadas.

 

Circuitos para praticar

Para os leitores que desejarem praticar um pouco mais, damos na figura 3 um circuito de baixa freqüência, pouco crítico e portanto ideal para quem está começando agora a mexer com as matrizes de contactos.

 

Sirene modulada usando transistores
Sirene modulada usando transistores

 

 

Trata-se de uma sirene modulada usando transistores. Quando apertarmos S1 o tom da sirene vai se tornando cada vez mais agudo até o ponto em que soltamos S1. Nesse momento o som “decai” tornando-se cada vez mais grave até parar.

Depois de montada, experimente trocar o capacitor C1 e os resistores R1 e R2 para mudar o som, assim como o capacitor C2. C1 determina o tempo de “subida” e “descida” do som, enquanto que C2 determina o tom (mais grave ou mais agudo).

Ao fazer os testes com outros valores de componentes. tenha apenas cuidado para não usar resistores menores que 10 k Ω para não haver perigo de problemas com os transistores.

Na figura 4 temos a disposição dos componentes na matriz de contactos para a realização desta montagem.

 

Foto da montagem da sirene
Foto da montagem da sirene

 

 

Q1 – BC548 ou equivalente – transistor NPN de uso geral

Q2 – BC558 ou equivalente – transistor PNP de uso geral

R1 – 22 k Ω x 1/8 W – resistor – vermelho, vermelho, laranja

R2 – 10 k Ω x 1/8 W – resistor – marrom, preto, laranja

R3 – 1 k Ω x 1/8 W – resistor – marrom, preto, vermelho

C1 – 100 µF x 12 V – capacitor eletrolítico

C2 – 47 nF – capacitor cerâmico ou poliéster

C3 – 470 µF x 12 V – capacitor eletrolítico

S1 – Interruptor de pressão NA (botão de campainha)

B1 – 6 V – 4 pilhas pequenas

FTE – alto-falante pequeno de 4 ou 8 Ω – 5 a 10 cm

Diversos:

Matriz de contactos, suporte para 4 pilhas pequenas, fios, etc.

 

Indo um Pouco Adiante

Se o leitor possui uma matriz de contactos, todos os componentes para um projeto e, além do diagrama, a disposição destes componentes numa matriz, conforme vimos neste artigo, não existe qualquer problema para sua realização: basta copiar a disposição dos componentes e suas interligações.

No entanto, em muitos casos (a maioria, na verdade) o leitor terá à sua disposição apenas um diagrama esquemático. Como fazer para obter a disposição dos componentes na matriz, ou ir diretamente à montagem (quando adquirir mais prática)?

Evidentemente, todo praticante de eletrônica deve conhecer os símbolos dos componentes e saber como interpretar um diagrama. A série de artigos nesta revista em que abordamos os principais tipos de componentes eletrônicos como resistores, capacitores, diodos, transistores, etc. serviu também para mostrar aos leitores como eles são representados através de símbolos nos diagramas.

Na figura 5 damos uma relação de componentes comuns com seus símbolos. Todo praticante de eletrônica e mecatrônica precisa conhecer esses símbolos.

 

Alguns componentes básicos
Alguns componentes básicos

 

 O princípio de funcionamento dos componentes nos circuitos, de uma forma um pouco mais profunda, também pode ser aprendido no nosso Curso Básico de Eletrônica que é um bom ponto de partida para quem deseja adquirir mais conhecimentos.

 Vamos tomar agora um exemplo de montagem que desejamos realizar e que temos apenas um circuito disponível, com os valores dos componentes, é claro. Trata-se de uma sirene bi-tonal com dois circuitos integrados 555, capaz de excitar diretamente um alto-falante com boa potência. Os leitores que estão desenvolvendo um robô autônomo ou ainda um automatismo que precise de um sistema de aviso tipo sirene, podem perfeitamente aproveitar este interessante circuito que é mostrado na figura 6.

 

Sirene bi-tonal com dois circuitos integrados 555.
Sirene bi-tonal com dois circuitos integrados 555.

 

 

Qual seria o procedimento para se montar de forma experimental esse circuito numa matriz de contactos? (É importante observar que a montagem em matriz é bem mais rápida que o processo de se projetar e fazer uma placa de circuito impresso para o mesmo circuito – na verdade, muitos projetistas antes fazem a montagem numa matriz, para otimizarem (*) o projeto, e somente depois passam para o projeto e montagem numa placa definitiva).

 

(*) Otimizando um projeto

Nem sempre os valores dos componentes dados num projeto ou circuito levam ao melhor desempenho. Os valores dados levam em conta as tolerâncias dos componentes que, em alguns casos são elevadas (chegam a 50% para os capacitores!). Isso significa que, depois de montado, o funcionamento pode ser um pouco diferente do esperado. O montador deve então alterar alguns componentes de modo a chegar no melhor desempenho. Por exemplo, numa sirene, pode ser necessário mudar capacitores ou resistores de temporização para se chegar ao tom desejado ou à modulação. A matriz de contactos facilita bastante isso, pois basta desencaixar o componente velho e encaixar o novo que se deseja experimentar.

 

Inicialmente, devemos nos preocupar com as linhas de alimentação, ou seja, com os pontos do circuito que devem ser ligados ao 0 V e ao positivo da alimentação, que no caso é formada por 4 pilhas ou 6V.

Veja então que temos os resistores R1 e R3, os pinos 8 e 4 de CI-1 e 8 de CI-2 além do coletor do transistor indo a esta linha.

Podemos então fixar os circuitos integrados na matriz, o transistor e em seguida os resistores, observando que o outro terminal de cada resistor vai ao pino 7 de cada integrado. Passamos agora aos componentes que estão ligados à linha de 0V da alimentação.

Vemos que os pinos 1 dos circuitos integrados, os capacitores de C1 a C4 e o alto-falante, estão todos ligados nestes pontos. Começamos com as ligações dos pinos 1 de CI-1 e CI-1 que exigem apenas fios.

Depois passamos à colocação dos capacitores, observando que no caso de C1 a polaridade deve ser seguida. O pólo positivo (barra branca do capacitor) vai aos pinos 2 ou 6 de CI-1 (procure o que estiver mais próximo pois eles estarão interligados).

O próximo passo consiste em observarmos se existem pinos interligados nos circuitos integrados e se existem interligações entre eles. Temos então a interligação entre os pinos 6 e 2 de cada integrado e, além disso, do pino 3 de CI-1 ao pino 4 de CI-2. Estas ligações podem ser feitas por pedaços de fios de comprimentos apropriados.

Finalmente, temos a ligação do resistor R5 do pino 3 de CI-2 à base do transistor. Para o transistor damos duas opções: TIP31 ou BD135. No entanto, neste caso o montador deve tomar cuidado, pois os dois transistores em questão têm terminais diferentes, conforme mostra a figura 7.

 

Pinagem do TIP31  do BD135
Pinagem do TIP31 do BD135

 

 

Eletricamente eles são semelhantes nessa aplicação e funcionam bem neste circuito. No entanto, por terem invólucros diferentes, e serem de fabricantes diferentes, sua pinagem também não é a mesma.

Muitos "equivalentes" que às vezes são vendidos nas lojas podem ter o mesmo problema, para o qual o todo montador de protótipos deve estar atento. É por esse motivo que manuais de componentes ou informações sobre pinagens devem fazer parte da literatura de consulta de todos os desenvolvedores de projeto. A série de livros Circuitos & Soluções da Editora Saber é interessante para os desenvolvedores de projetos pois, além de trazer enorme quantidade de circuitos que podem ser usados na criação de projeto, traz muitas informações sobre características e pinagens dos componentes mais usados.

Também é importante observar que alguns transistores de potência possuem terminais mais grossos que não entram nos furos de uma matriz de contactos. Isso não impede que eles sejam usados em protótipos na matriz de contactos. Pode-se trabalhar com esses componentes soldando-se nos seus terminais pequenas “extensões de fios comuns, conforme mostra a figura 8.

 

 

Extensões dos terminais
Extensões dos terminais

 

 

 

Complete a montagem com a conexão do alto-falante e da fonte de alimentação. Veja que o alto-falante leva dois pedaços de fios soldados aos seus terminais. Se o leitor não quiser fazer essa soldagem, preservando o alto-falante, pode usar um fio com uma garra jacaré numa ponta (para o alto-falante) e a outra ponta nua, para encaixar na matriz.

Na figura 9 temos a montagem completa do circuito que tomamos como exemplo.

 

Foto da montagem.
Foto da montagem.

 

 

Experimente o circuito e se quiser mudar o som, como a intermitência, troque os resistores de R1 a R4 e os capacitores C1 e C2.

Somente tenha cuidado para não usar resistores menores que 2,2 k Ω para não forçar os circuitos integrados.

 

CI-1, CI-2 – 555 – circuitos integrados

Q1 – TIP31 – Transistor NPN de potência

R1, R2 – 4,7 k Ω x 1/8 W – resistores – amarelo, violeta, vermelho

R3, R4 – 10 k Ω x 1/8 W – resistores – marrom, preto, laranja

R5 – 1 k Ω x 1/8 W – marrom, preto, vermelho

P1, P2 – trimpots ou potenciômetros de 470 k Ω ou 1 M Ω

C1 – 10 µF - capacitor eletrolítico (6 V ou mais)

C2 – 22 nF – capacitor cerâmico

B1 – 6 V – 4 pilhas pequenas

FTE – 8 Ω – 5 a 10 cm

 

Diversos:

Matriz de contactos, suporte de pilhas, fios, etc.

 

 

Um Projeto Mecatrônico para Treinar

Completamos este artigo com um interessante projeto mecatrônico para o leitor montar. Trata-se de um controle PWM com sensor óptico, mostrado na figura 10.

 

Controle PWM com sensor óptico
Controle PWM com sensor óptico

 

 

Este circuito faz com que o motor seja acionado com uma velocidade que depende da intensidade da luz que incide no sensor.

A disposição dos componentes na matriz de contactos é mostrada na figura 11.

 

Foto da montagem.
Foto da montagem.

 

 

O LDR deve ser instalado num pequeno tubo opaco de modo que possamos dirigir o foco de luz que ele deve detectar. Para utilizar o aparelho aplique diferentes intensidades de luz no LDR observando como elas controlam a sua velocidade.

Afastando-se do LDR com uma pequena lâmpada acesa o leitor verá que a velocidade do motor diminui. Dois circuitos sensores como esses podem ser usados para fazer um robô seguir um foco de luz.

 

CI-1 – 555 – circuito integrado

Q1 – BD136 – transistor PNP de média potência

D1 – 1N4148 – diodo de uso geral

R1, R2 – 1 k Ω x 1/8 W – resistores – marrom, preto, vermelho

LDR – LDR redondo comum

C1 – 220 nF – capacitor cerâmico ou poliéster

C2 – 1 000 µF – capacitor eletrolítico (6 V ou mais)

B1 – 6 V – 4 pilhas pequenas

M1 – Motor pequeno de 6 V

 

Diversos:

Matriz de contactos, suporte para 4 pilhas, fios, solda, etc.

 

 

Treinando

O importante para o leitor usar a matriz de contacto é treinar. Procure projetos simples, que não tenham pontos críticos e que haja disponibilidade de todos os componentes no comércio local ou através de lojas que anunciam na Internet e vendem pelo correio.

Na verdade, o bom desenvolvedor de circuitos eletrônicos para uso em mecatrônica, robótica, automação e muito mais, deve ter um estoque com os transistores mais comuns, circuitos integrados mais comuns, diodos de uso geral, resistores dos valores mais usados assim como capacitores.

Procure projetos circuitos interessantes simples neste site. Monte várias vezes, faça experiências, troque valores de componentes e em pouco tempo o leitor não estará apenas montando, mas também criando, inventando novos circuitos muito interessantes talvez descobrindo algo que possa até industrializar e lhe trazer lucros.

Se for professor do curso fundamental, médio ou técnico, essa prática é ótima para medir as dificuldades que os alunos terão nas aulas.

Logo o leitor perceberá que uma matriz somente não atende suas necessidades de fazer projetos mais avançados e poderá ter muitas delas.

Pequenas matrizes isoladas, matrizes duplas, triplas ou quádruplas em uma base comum, fontes, caixas amplificadas, componentes especiais separados, tudo enfim para se tornar um montador, experimentador e criador de novos projetos.