É claro que o princípio da conservação da energia não pode ser violado, mas quando explicarmos o que ocorre com essa tecnologia inovadora descoberta por pesquisadores da Universidade de Alto, Estados Unidos, o leitor vai entender que, de certo modo, é o que ocorre.

Para entender como é possível obter uma célula solar com mais de 100% de rendimento, vamos recordar o princípio de funcionamento desses dispositivos, conhecido desde o século XIX.

Partimos então do efeito fotoelétrico. Era bem conhecido da época o fato de que um pedaço de metal com dois eletrodos, quando iluminado produzia uma pequena corrente elétrica. A luz incidente gerava eletricidade.

 

Figura 1 – A luz arranca elétrons do material
Figura 1 – A luz arranca elétrons do material

 

Foi somente nos anos 30 que Albert Einstein explicou o fenômeno, o que inclusive lhe valeu o Prêmio Nobel da época.

Einstein explicou que a luz era formada por partículas denominadas fótons que carregavam porções definidas de energia conforme sua frequência. Maior frequência significa maior quantidade de energia.

Assim, essas partículas poderiam incidir num material com energias que dependeriam da sua frequência. Se a frequência e a quantidade de energia for suficientemente alta, ela pode vencer a força que prende um elétron ao átomo e arrancá-lo.

Com isso, o elétron pode se deslocar através do material e com outros que sejam liberados por outros fótons, formar uma corrente elétrica. Se a energia não for suficiente, o elétron não pode ser librado.

Ficava então claro pela explicação de Einstein que a quantidade de elétrons liberada não dependia da intensidade da frequência da luz, ou seja, se fosse uma luz de frequência maior ou menor, mas sim da quantidade de fótons.

Uma luz violeta de determinada intensidade liberaria a mesma quantidade de elétrons que luz laranja de mesma intensidade. Eventualmente, dependendo do material, a mesma intensidade de luz vermelha não liberaria nenhum fóton.

Este é um aspecto interessante da luz que apresenta o que denominamos propriedades quânticas.

Mas, com o desenvolvimento da tecnologia, materiais semicondutores como o silício começaram a ser utilizados na elaboração de células solares ou células fotovoltaicas, utilizando o mesmo efeito.

É claro que havia inicialmente muitos problemas para a elaboração de boas fotocélulas. Havia, por exemplo, o fenômeno da recombinação. Dos muitos elétrons liberados quando incidia luz, apenas uma pequena parte era aproveitada na corrente gerada. Isso ocorria que muitos elétrons liberados, ao se movimentarem através do material, encontravam átomos que já haviam perdido elétrons e, havendo um buraco (lacuna) a ocupavam, neutralizando o átomo.

Assim, além de custarem caro, as células fotovoltaicas de então apresentavam rendimentos muito baixos. Apenas uma pequena parcela da energia luminosa incidente era aproveitada.

Sonhava-se com uma célula que pudesse ter um rendimento de 100%, ou seja, todos os fótons incidentes liberariam elétrons que poderiam ser usados para criar uma corrente elétrica num circuito externo.

 

Figura 2 – O experimento para demonstrar o efeito fotoelétrico
Figura 2 – O experimento para demonstrar o efeito fotoelétrico

 

O rendimento vem crescendo dia a dia e chegou um momento inesperado, um momento em que se anuncia em que podemos ter um rendimento maior do que 100%.

Essa notícia vem da descoberta de um material, o silício negro, que formando nanoestruturas pode fazer algo que teoricamente, se interpretarmos literalmente a conservação da energia e o efeito fotoelétrico explicado por Einstein é impossível.

Mas, se analisarmos a descoberta, vemos que é possível.

Segundo sabemos, o fóton que incide no material precisa ter uma energia mínima, dada pela sua frequência, para arrancar um elétron que então vai formar a corrente elétrica. O excedente da energia desse fóton não é aproveitado. Temos então, um elétron para cada fóton.

No entanto, os fótons que estão na parte de maior frequência do espectro, na região do violeta e mesmo ultravioleta, possuem mais do que o dobro da energia para arrancar um elétron do material da célula.

Assim, conforme mostra a figura 3, existe uma grande probabilidade desses fótons arrancarem dois elétrons dos átomos em que incidem, e não apenas um.

 

Figura 3 – Fótons de maior energia podem liberar dois elérrons
Figura 3 – Fótons de maior energia podem liberar dois elérrons

 

Como se constatou, com o material empregado a probabilidade de que isso ocorra com a luz normal de que dispomos é de que um em cada 3 fótons tenha energia para isso, teremos 1/3 a mais de 100% de rendimento, ou seja, 4 elétrons para cada 3 fótons o que resulta em aproximadamente 32% de rendimento a mais, ou 132%.

Evidentemente, não estamos criando energia, mas conseguindo um aproveitamento maior do que os 100% teóricos que não representa toda a energia disponível no espectro solar.

Esta possibilidade é interessante para a obtenção de novas células de alto rendimento que, além disso, tem a redução do fenômeno da recombinação, que é a perda de elétrons que, encontrando em seu caminho átomos com lacunas ou “buracos” de onde já tenham sido retirados elétrons, os ocupe sendo assim neutralizados.

Sem dúvida alguma, o aproveitamento prático dessa tecnologia nos levará a novos painéis solares de altíssimo rendimento e o material usado, se processado adequadamente possibilitará sua disponibilidade e um custo bastante acessível.

Novos tempos para as “fazendas solares” que aproveitarão ao máximo a luz que chega até nós, convertendo-a em eletricidade limpa e barata.