Uma preocupação cada vez maior que temos em nossos dias é com o consumo racional de energia e o aproveitamento máximo das estruturas que fazem sua distribuição. A ideia do Smart Grid que visa maior eficiência operacional para o sistema de distribuição de energia elétrica deve afetar todos que utilizam esta forma de energia. Assim, visando dar uma ideia de como isso funciona, mostraremos como novas tecnologias devem aproveitar a rede de energia não só de uma maneira racional, com uso mais racional da energia, como também para transmissão de dados e gerenciamento de funções (PLC).

A rede de energia elétrica não tem unicamente a finalidade de distribuir energia. A tendência atual é de uma convergência onde muitos meios que transmitam energia e informações possam ter uma interoperabilidade que nos leva ao que se denomina desperdício zero. A meta de se reduzir ao máximo todo o desperdício de energia já toma conta praticamente de tudo que envolva tecnologia. Do telefone celular às lâmpadas, dos veículos automotores aos eletrodomésticos de todos os tipos.

Assim, uma ideia de gerenciamento do consumo de energia, aproveitando a própria rede de energia, é algo que já está sendo estudado de forma intensa e aplicado de uma forma que deve ser ampliada rapidamente.

As Smart-Cities ou cidades inteligentes já são uma realidade com a integração de diversos recursos tecnológicos como WiFi, monitoramento de trânsito, monitoramento de energia elétrica e de consumo de água num sistema único.

Os sistemas que enviam informações sobre o consumo de aparelhos alimentados por uma rede de energia usando a própria fiação dessa rede são um exemplo do que já está ocorrendo. Medidores de consumo que informam a uma central quanto uma residência consome de energia ou o semáforo de uma via, quanto um sistema de iluminação ou até mesmo um eletrodoméstico consome num determinado período, já são uma realidade.

No entanto usar a rede de energia para transmitir dados, no que seria denominado PLC ou Power Line Communications, é algo que apresenta grandes obstáculos para a tecnologia.

Como o reógio de luz de sua casa pode enviar dados pela própria rede elétrica sobre a energia que está sendo consumida, ou ainda um sistema de segurança e iluminação de um condomínio pode monitorar seu próprio consumo é algo que merece uma análise.

 

PLC – Power Line Communication

Transmitir dados através de uma linha telefônica não apresenta muitas dificuldades, pois os dados compartilham esse ambiente com um tipo de sinal de baixa intensidade, que não apresenta muitos problemas diante de eventuais interferências.

No entanto, compartilhar um meio em que correntes de altas intensidades, sujeitas a variações bruscas de grande intensidade, não é algo simples. Quando um contator ou um relé que aciona o motor de uma geladeira ou de um elevador fecha seus contatos, são produzidos transientes de altíssima intensidade, cujas frequências harmônicas se espalham por todo o espectro de sinais que poderia ser usado para comunicações de dados.

Da mesma forma, inversores de frequência, controles de potência, lâmpadas fluorescentes e muitos outros dispositivos alimentados por uma rede elétrica comum, geram uma quantidade enorme de distúrbios que a tornam um meio altamente poluído, onde a dificuldade de se transmitir dados é enorme.

Isso significa uma limitação à velocidade com que podemos transmitir dados nesta rede, um obstáculo até hoje que não foi superado para que se use de forma eficiente a rede de energia para acessar a internet. A velocidade, por esses motivos, ainda é muito limitada.

No entanto, para se controlar um motor, chamar um elevador, abrir um portão, acender uma luz, ou mesmo controlar um eletrodoméstico, não precisamos de uma banda de muitos megahertz, como para transmitir um filme ou acessar a internet. Uma taxa de transmissão de dados baixa é suficiente o que permite pensar na rede de energia como meio de transmissão.

Assim, podemos perfeitamente, sem muitos problemas usar a rede de energia para transmitir dados em pequenas quantidades, o suficiente, entretanto, para termos opções de controle e monitoramento de funções importantes quando se pensa num aproveitamento melhor da energia, como sugerido pelo Smart Grid.

Dentre as possibilidades que a PLC oferece destacamos o controle de lâmpadas (dimmers) feito a partir de qualquer local de uma instalação elétrica ou de uma central inteligente de controle que gerencie a energia consumida no local. O mesmo sistema pode acionar ou desligar lâmpadas em determinados horários segundo programação usando os comandos feitos através da própria rede de energia que as alimenta. Também podemos implementar sistemas de segurança com sensores inteligentes que se comunicam com uma central utilizando a fiação do próprio prédio que deve ser protegido.

O acendimento de lâmpadas de saguão pode ser comandado pela própria fiação quando o elevador chega ao local, sem a necessidade de um detector de presença.

O monitoramento do consumo de energia, aparelho por aparelho registrado numa central inteligente que também o gerencie, é outra possibilidade importante que a PLC apresenta.

Na figura 1 temos exemplos de eletro-eletrônicos que podem ser comunicar via rede de energia.

 

Figura 1 – Usando a rede de energia para interação entre equipamentos.
Figura 1 – Usando a rede de energia para interação entre equipamentos.

 

Um gerenciamento dos inversores utilizados com os painéis solares a partir de centrais inteligentes pode ser criado com facilidade de modo a se obter o melhor aproveitamento da energia gerada. Na figura 2 um Smart Meter da Ericsson que possibilita aos consumidores gerenciar o consumo de energia de seus eletro-eletrônicos.

 

Figura 2 – O Smart Meter da Ericsson.
Figura 2 – O Smart Meter da Ericsson.

 

 

Como Funciona

Pela rede de energia trafega um sinal de 60 Hz que é a corrente alternada fornecida. Sobreposto a este sinal é aplicado um de maior frequência que transporta a informação. Isso é feito através de um modem que, dependendo da aplicação não precisa receber o sinal, mas apenas transmitir, ou seja, é apenas um modulador (sem demodulador – de onde vem o nome modem – modulador-demodulador).

Para receber o sinal basta ter um filtro que separe o sinal da tensão da rede de energia (alternada). O receptor tanto pode ser um demodulador, como um modem completo, se a aplicação exigir uma comunicação bilateral.

Dada a possibilidade de uma aplicação cada vez maior dos dispositivos que usam a PLC, padrões foram criados no mundo inteiro de modo a utilizar os recursos da rede de energia de forma apropriada, sem conflitos de produtos ou ainda causando problemas de interferências em outros equipamentos e sem sofrer de forma acentuada as interferências que podem ocorrer nesse meio ruidoso.

Na figura 3 temos um exemplo de modem PLC que permite extrair da rede de energia sinais para um computador ou outro equipamento, ou ainda enviar estes sinais.

 

Figura 3 - Modem PLC
Figura 3 - Modem PLC

 

 

Os Padrões

O modo como dados podem ser enviados através da rede de energia são estabelecidos por diversos padrões. Os padrões existentes levam em conta os diversos ambientes de operação e também as aplicações possíveis.

Os mais conhecidos são os G3 e PRIME. Pode-se dizer que o G3 é “primo” do IEEE P19012 visando aplicações que exigem mais robustez. Dada sua capacidade de trabalhar melhor em ambientes com elevado nível de ruído, atualmente o G3 tem sido o escolhido para a maioria das aplicações. Na tabela abaixo, obtida de uma documentação da Texas Instruments, damos as principais características destes padrões.

Parâmetro

IEC1334 S-FSK

PRIME (OFDM)

G3 (OFDM)

P1901.2/G3-FCC (OFMDM)

Tamanho da Modulação

Spread frequency shift keying

DBPSK/DQPSK/D8PSK

D8PSK/DQPSK/

(D8PSK)

D8PSK/DQPSK/D8PSK/modulação coerente

Correção de erro direta

N/A

½ taxa do código convolucional

RS Externo + taxa interna ½ código convolucional

RS Externo + taxa interna ½ código convolucional

Taxa de dados

2,4 kbps

21, 42, 64, 84, 64 kpbs (com codificação)

20, 36/34, 76 (46)kpbs (com codificação)

Escalável até 250 kbps

Plano de banda

CENELEC-A

Continuo 42-89 kHz (definido pelo cenário LV)

36-91 kHz com mascaramento de tom para SFSK

CENELEC-A, Banda FCC

Modo ROBO

Não

Não

Sim

Sim

Máscara de tom

Não

Não

Sim

Sim

Mapa de tom adaptativo

Não

Sim

Sim

Sim

MAC

IEC61334 MAC

PRIME MAC

Perfil 802.15 4/63

Baseado no 802.15.4

Camada de convergência

IEC61334-4-32

IEC61334-4-32/PVC

6LoWPAN/PV6

6LoWPAN/PV6

Aplicação para medida

COSEM/DLMS

COSEM/DLMS,IP

COSEM/DLMS,IP

COSEM/DLMS,IP

 

A G3 Alliance é a responsável pela evolução do padrão G3 que opera na banda CENELEC-A usada na Europa de 3-95 kHz e que pode se estendida por toda banda do FCC de modo a possibilitar uma taxa maior de transmissão de dados em outros países.

O padrão G3 permite a comunicação bi-direcional com uma taxa efetiva de 20 a 40 kbps na banda CENELEC-A e até 200-400 kbps na banda do FCC (G3-FCC). Ele coexiste com a S-FSK e outras tecnologias PLC legalizadas.

Para proporcionar uma imunidade maior às inferências e atenuação o padrão G3 adota a modulação OFDM (Orthogonal Frequency-Division Multiplexing). Como resultado, podem ser conseguidos alcances de até 6 milhas em trechos entre transformadores de médias tensões. No caso em que existam transformadores de média e baixa tensão no percurso do sinal, o alcance ficará na faixa de 2 a 3 milhas, dependendo de diversos fatores adicionais.

É muito importante ressaltar a capacidade dos sinais de passar através de transformadores principalmente em áreas rurais onde a densidade de população é baixa.

O que ocorre é que os transformadores consistem num obstáculo para os sinais, exigindo eventualmente o emprego de um concentrador, cuja finalidade é “passar” os sinais através dele, aplicando-os a um trecho seguinte da linha.

A utilização de um concentrador com estes transformadores numa localidade de baixa densidade de população não compensa seu custo. Como o G3 permite a passagem dos sinais através dos transformadores, os concentradores podem ser colocados apenas nos locais em que eles podem reunir dados de diversos locais e em que se observe que eles são necessários.

O G3 também forma o as partes Annex-A e Annex-D (G3-FCC) do ITU G.9955 (G.9956 pra G3 MAC). O IEEE está desenvolvendo uma versão mundial do G3 com o nome de P1901.2 que deverá estar disponível no final de 2012.

Para conseguir maior taxa de dados o G3-FCC utiliza modulação coerente e diversas demodulações para o modo robô, BPSK, QPSK, 8PSK e 16QAM com um ganho até 5 dB.

 

Além do G3

Na busca da melhor solução para implementação da PLC, diversos países estão fazendo testes no sentido de verificar seu desempenho sob condições ruidosas de operação. Podemos citar o caso da Coréia que faz testes com cabos subterrâneos.

Mas não são todos os países que estão adotando o G3. Países como a Espanha e França escolheram outras tecnologias.

 

Conclusão

A adoção de recursos que permitam utilizar a própria rede de energia para transmitir dados é algo que em breve vai possibilitar uma redução muito grande da fiação de sistemas que hoje são complexos justamente devido a sua presença. O controle de elevadores, monitoramento de seu funcionamento e interação com outros equipamentos elétricos de um prédio ou condomínio é algo que pode se tornar muito simples se usarmos a própria rede de energia.

Para o profissional da área será importante conhecer o princípio de funcionamento dos dispositivos que serão utilizados com esta finalidade e ter os equipamentos de teste para instalar, fazer diagnósticos de defeitos ou simplesmente conferir seu desempenho.